Bastidores: Por que Bolsonaro ainda não escolheu o PGR?

Presidente tem dito a aliados que não há prazo para decisão; o subprocurador-geral Alcides Martins assumirá o cargo interinamente

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Por Breno Pires
Atualização:

BRASÍLIA - Vista no Palácio do Planalto como a indicação mais importante para o governo em todo o mandato presidencial, a sucessão na Procuradoria-Geral da República se arrasta como uma novela com reviravoltas, muitas dúvidas e poucas certezas. O presidente Jair Bolsonaro planejava anunciar o nome até 17 de agosto, um mês antes do fim do mandato da procuradora-geral, Raquel Dodge, mas ainda não tomou a decisão. A aliados tem dito que não há prazo para a escolha. O principal motivo: nenhum candidato mostrou até agora que se encaixa no perfil pretendido. Leia aqui especial do Estadão sobre o futuro da Procuradoria no governo Bolsonaro.

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O PGR ideal, para o presidente, é um nome que traga estabilidade para a atuação do governo e ao mesmo tempo não perca tempo com questões vistas por Bolsonaro como “menores” - a defesa de direitos humanos, minorias e meio ambiente. Na busca por “alinhamento”, o presidente relegou ao segundo plano a lista tríplice com os nomes mais votados pela carreira do Ministério Público Federal ­- Mário Bonsaglia, Luiza Frischeisen, e Blau Dalloul.

Com a caneta na mão e o apoio dos presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Câmara dos Deputados, Raquel Dodge seria naturalmente a favorita à indicação para mais um mandato. No entanto, ela é vista com desconfiança no entorno do presidente por seu histórico de atuação em defesa de causas ambientais e de minorias - temas colocados como prioridade de sua gestão há dois anos, quando apontada ao cargo pelo então presidente Michel Temer.

Um dos interlocutores mais próximos do presidente diz que a atual procuradora-geral representa um dilema para o Palácio do Planalto. Seu perfil apaziguador é considerado trunfo para um presidente que “só quer paz para governar e mais nada”, afirma, em caráter reservado. “Se não for ela, tem que ser um perfil como a Raquel Dodge”, disse.

Por outro lado, as pautas que ela defende geram dúvidas no entorno de Bolsonaro. Há um temor sobre como seria a condução dela na parte ambiental - um dos pontos fracos do governo pela pressão que tem sofrido em relação ao tema, principalmente internacional.  Esse aliado leal ao presidente diz que esses temas precisam ser conversados e frisa que Bolsonaro já esteve algumas vezes com Raquel Dodge, que não é carta fora do baralho. Mesmo as denúncias apresentadas pela procuradora-geral em relação ao então deputado Bolsonaro são tratadas pelo presidente como “águas passadas”.

O presidente Jair Bolsonaro ainda não definiu o sucessor de Raquel Dodge no comando do Ministério Público Federal Foto: Dida Sampaio/Estadão

O mesmo argumento de não olhar para trás é o que mantém as esperanças do agora ex-favorito Augusto Aras. Apresentando-se como conservador, favorável a destravar a área da infraestrutura e a pauta ambiental, o subprocurador-geral saiu na frente no processo de sucessão ao reputar como corporativista a lista tríplice organizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), que teve votação de 82% dos integrantes do Ministério Público Federal. Decidiu não se candidatar e defendeu a prerrogativa do presidente de escolher livremente o procurador-geral na categoria. Ganhou pontos.

No entanto, Aras foi “alvejado” com notícias sobre declarações do passado e sua relação com políticos de esquerda, mas o que pesa mesmo para que não seja o escolhido é a falta de apoio dentro da categoria e da cúpula dos Três Poderes, que destaca, em conversas reservadas, o fato de ele não ter sido testado.

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As dúvidas de Bolsonaro foram resumidas em um jantar com ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) e do governo, na semana passada. “Não adianta ser nota 10 em uma coisa e nota 4 na outra. Tem que ser nota 7 em tudo”, disse, segundo pessoas presentes. No encontro voltou a dizer que não nomeará um "xiita ambiental".

Diferentemente do discurso de que está aberto a receber e conversar com todos os candidatos, Bolsonaro não se reuniu com a subprocuradora-geral Luiza Frischeisen, segundo lugar na lista tríplice, apesar de uma solicitação ter sido feita pela candidata. A postulante é vista no entorno presidencial como esquerdista.

Um parlamentar do PSL bastante próximo a Bolsonaro afirma, reservadamente, que é “hipocrisia” afirmar que o presidente deve indicar um PGR independente. “Tem que ter um mínimo entendimento em comum”.

Para um candidato que já se considera com poucas chances de ser indicado, Bolsonaro pensou que poderia fazer uma escolha com critérios pessoais, a partir de sua prerrogativa constitucional. Mas, com o tempo, percebeu que era preciso articulação política e com a própria categoria. Defensores da lista tríplice afirmam que o presidente trouxe mais dificuldade para si no processo de escolha, porque abriu espaço para nomes que, no fim, não seriam os melhores representantes para a categoria.

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Um aliado do presidente comenta que, quando surge um nome especulado como cotado, a imprensa termina fazendo um papel “útil”, ao levantar informações de longa data. Um candidato que sofreu com isso é o subprocurador-geral Antônio Carlos Soares, que já foi alvo de um processo por delitos contra a fé pública -falsificação de documento - na década de 1990.

Bolsonaro já disse que não fará o anúncio do PGR até 7 de setembro, mas não há um prazo definido. Como é necessário aprovação do Senado após sabatina, o atual vice-presidente do Conselho Superior do Ministério Público Federal, o subprocurador-geral Alcides Martins, assumirá o cargo interinamente.

O nome não é considerado um líder dentro da PGR, e foi eleito para o posto por critério de antiguidade, após empate em votação com o subprocurador-geral Nicolau Dino, aliado de Rodrigo Janot. Uma das primeiras análises feitas por gente próxima a Bolsonaro é que Alcides é um nome apaziguador e que sua interinidade deve servir como teste. Se ele tem chances de ser nomeado, é outra incógnita.

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