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O elo das fraudes no porto de Santos com a 'rachadinha' na Assembleia de São Paulo

André Pinto Nogueira, alvo da Operação Círculo Vicioso, exerce tamanha influência no Palácio 9 de Julho, sede do Legislativo paulista, que é afamado como o '95.º deputado' da Casa; ele também é investigado por operar esquemas de desvios de salários no Legislativo

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Por Luiz Vassallo
Atualização:

Assembleia Legislativa de São Paulo. Foto: Paulo Liebert/AE

Há um elo da Operação Círculo Vicioso, que mira fraudes de R$ 100 milhões no Porto de Santos, e as investigações sobre desvios na Assembleia Legislativa de São Paulo. Alvo de mandado de prisão temporária na Círculo Vicioso, deflagrada nesta quinta, 22, pela Polícia Federal, André Pinto Nogueira, foi servidor da Assembleia por 14 anos, até março de 2019.

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No Legislativo paulista, ele chegou ao alto escalão e dirigiu órgãos pelos quais passa o dinheiro da Casa, como o Departamento-Geral de Administração. Ligado ao DEM, sempre foi bancado na Casa pelo deputado Edmir Chedid (DEM) e pelo ex-parlamentar Aldo Demarchi (DEM) - eles não são alvo da Círculo Vicioso. Na Casa, que possui 94 parlamentares, tamanha influência rendeu a ele o apelido de '95.º deputado'.

O deputado Edmir Chedid afirma que 'tomou conhecimento do caso pela imprensa na manhã desta quinta-feira e desconhece a investigação'. "Ele ressalta que, conforme informações da própria imprensa, não é investigado".

Nogueira é visto pela PF como um suposto operador de fraudes no porto de Santos que envolveram uma outra ex-funcionária do DEM na Assembleia -exonerada em março de 2019. Segundo apurou o Estado, André Nogueira escapou das autoridades na manhã desta quinta, 22, usando uma mochila e um carro que não era dele. Assim, deixou seu apartamento, no bairro do Itaim, em São Paulo. O Estado obteve acesso a imagens da fuga de Nogueira.

Ele já é conhecido do Ministério Público Estadual desde 2015, alvo de investigação por supostamente operar esquemas de 'rachadinha' a deputados do partido.

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Trecho de ação civil pública contra André Nogueira  

Em sua atuação como empresário, ele é condenado por ter recebido de forma antecipada, R$ 858 mil pelo fornecimento de capacetes e escudos à 11.ª Brigada de Infantaria Leve, em Campinas, e não entregar os equipamentos, em 2004. Segundo consta na ação civil pública, que é de 2008, ele 'reconheceu estar presente' ao lado de outros empresários, 'no momento do saque dos R$ 858 mil depositados pelo Exército, tendo sido esse valor levado, inicialmente, para a sua residência'.

Trecho de relatório do Coaf na investigação sobre 'rachadinha' na Alesp. Meca é a empresa de André Pinto Nogueira  

O ex-servidor é citado na delação chave da Operação Círculo Vicioso. O empresário Mário Jorge Paladino, dono da MC3, empresa que teria firmado contratos fraudulentos com a Companhia de Docas do Estado de São Paulo.

Ele admitiu propinas ao ex-deputado federal Marcelo Squassoni (PRB) e ao ex-diretor da Codesp, José Francisco Adriano. Um episódio envolveu assessores da Assembleia de São Paulo.

Segundo relatório da Polícia Federal, que representou à Justiça pela prisão dos investigados, 'já iniciada a execução do contrato da MC3 com a CODESP, os pagamentos à Francisco José Adriano começaram a ser mensais e em espécie, até que Adriano solicitou a Paladino que simulasse a contratação de três empregadas, para compensar a contratação da filha dele, Amanda Fernandes Adriano Gomes, como assessora parlamentar lotada no Gabinete da Liderança do DEM da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo - Alesp'.

"Para tanto, houve a participação de André Pinto Nogueira, que também era assessor naquele mesmo gabinete e contra quem há inúmeras reportagens citando suspeitas de ocorrências de fraudes e corrupção", afirma a PF, referindo-se a reportagens do Estado, que mostraram transações em dinheiro vivo do ex-funcionário quando estava na Casa, e suas supostas ligações com desvios de salários na Casa.

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Trecho de relatório do Coaf na investigação sobre 'rachadinha' na Alesp  

Uma testemunha disse à Promotoria de São Paulo ter devolvido seus vencimentos a André, que teria repassado aos deputados Edmir Chedid e Aldo Demarchi. Ele chegou a comprar um veículo por R$ 115 mil em dinheiro vivo, segundo relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras.

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Segundo a Polícia federal, 'ficou evidente um conluio entre ele, Marcelo Squassoni, José Francisco Adriano e Carlos Antonio de Sousa para fraudar o processo licitatório visando a contratação de digitalização de documentos com a MC3 Tecnologia, tendo como contraprestação o recebimento de propina, que foi paga, dentre outras formas, com a participação de André Pinto Nogueira, Juliana de Paula Louro Storti, Fabiana Gilho Alves de Almeida e Ângela Poletini da Fonseca'.

Ângela é mulher do vereador e ex-presidente da Câmara de Vereadores de Serra Negra, Felipe Amadeu (DEM). Ele e Squassoni são aliados políticos de Edmir Chedid. Juliana Storti já se candidatou diversas vezes a vice e prefeita de Ilhabela, além de deputada federal pelo PTB. Fabiana é dentista e mora em Bragança.

Em delação, Mário Jorge Paladino, da MC3, afirmou que 'a partir do recebimento dos pagamentos mensais o declarante passou a pagar os 15% combinado a Adriano, o que dava cerca de R$ 60.000,00 mensais e que 'esses pagamentos sempre se deram em espécie em cafés, restaurantes dentre os quais a Cantina Di Lucca e o Empório São José ambos em Santos/SP, e na casa de Adriano, a qual esclarece que não é o endereço que consta nos Autos o qual é na verdade de sua filha Amanda'.

Segundo ele, 'nessas oportunidades de entrega de dinheiro sempre estavam desacompanhados'.

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Afirma ainda que 'há diálogos no whatsapp do declarante mantido com Adriano onde não há referência explicita de pagamentos de valores mas o pedido de encontro desse segundo sempre em dias próximos ao dia 5 de cada mês que era o dia que a MC3 recebia o pagamento da Codesp; e que 'esses pagamentos foram realizados aproximadamente de julho de 2017 a janeiro de 2018 quando então foi reduzido o valor em espécie para R$ 45.000,00, pois Adriano pediu ao declarante que simulasse a contratação de três mulheres com valor de R$ 5.000,00 cada uma, para compensar a contratação da filha de Adriano, de nome Amanda como assessora parlamentar lotada no Gabinete da Liderança do DEM da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo'.

O delator afirma que 'na época, Adriano e Marcelo Squassoni estavam mantendo contato com Andre Pinto Nogueira da Alesp, para tratar alguma coisa referente a uma indenização trabalhista de engenheiros da Codesp a qual achavam que poderia ser paga imediatamente se recebessem alguma contra prestação ilícita; Que Adriano disse ao declarante que André iria lhe indicar o nome das mulheres, o que de fato foi feito, tratando-se de Juliana Storti, Fabiana Gilho Alves de Almeida e Angela Polentini da Fonseca'.

O empresário afirma que André 'lhe enviou as carteiras de trabalho, porém em razão dos encargos trabalhistas o declarantes resolveu não registrá-las, mas sim apenas transferir para suas contas pessoais o valor mensal de R$ 4.375,00, que seria o valor relativo a um salário de R$ 5.000,00 com alguns descontos que o declarante imaginou, pois esclarece que não comunicou a André ou Adriano que elas de fato não haviam sido registradas e que 'as CTPS das citadas encontram-se na posse do declarante serão apresentadas nesta Superintendência Regional'

Relatou ainda que 'o pagamento a elas perdurou de janeiro de 2018 até a data da prisão do declarante na Operação Tritão, no dia 31.10.2018 e que 'neste período as citadas não prestaram qualquer tipo de serviço ao declarante, à MC3 ou a qualquer outra empresa sua'.

O empresário afirmou que 'sequer as conhece, sendo que nunca foram na sede da empresa' e que esses fatos narrados são a razão das mensagens trocadas entre André e o declarante conforme indicado no Relatório de Análise de Material de Mídia - Celular SP04';

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Diz ainda que 'não sabe qual o acordo existente entre André e Adriano e que os pagamentos em espécie para Adriano continuaram até aproximadamente junho de 2018'.

A Polícia Federal analisou as mensagens de WhatsApp de celular do delator e do diretor da Codesp, que corroboram com a versão do empresário. A PF resumiu a análise dos aparelhos:

"a) Em 22/09/2017 André envia uma mensagem a Paladino mencionando que Adriano (Francisco José Adriano) 'pediu para alinhar um 'trabalho' com vc...'. Durante a conversa André também pergunta sobre valor de salário e benefícios. Em 25/09 André retoma a conversa e questiona Paladino sobre alguma posição. Podemos observar que Paladino prefere não continuar a conversa através das trocas de mensagens, momento em que os interlocutores decidem se encontrar pessoalmente. Ao longo dos dias os interlocutores continuam as tratativas para envio de documentos e dados de uma terceira pessoa que, ao que tudo indica, estaria sendo contratada pela empresa de Paladino, sob orientação de André Nogueira. a) Em 17/11/17 Paladino confirma o registro de uma pessoa identificada como Juliana. Observamos que André constantemente mostra interesse na suposta contratação da pessoa, cobrando Paladino sobre uma 'posição', inclusive falando sobre o salário a ser pago. Posteriormente foi confirmada a identidade da pessoa a ser contratada por Paladino como sendo Juliana de Paula Louro Storti, CPF 257.728.428-46, a qual foi candidata a vice-prefeita de Ilhabela em 2012, pelo PTB (http://www.eleicoes2012.info/enfermeira-juliana/), em 2014 candidata a deputada federal, também pelo PTB (https://www.eleicoes2014.com.br/juliana-storti/)e em 2016 foi candidata a prefeita, novamente pelo PTB (https://www.eleicoes2016.com.br/julianaptb-sp-250000060925/). b) Após sucessivas tentativas de encontro, em 07/02/18 André diz a Paladino que precisam se encontrar e Paladino diz que irá passar na 'Assembleia' (Assembleia Legislativa de São Paulo - Alesp, onde André Nogueira ocupa cargo em comissão) e após mais uma cobrança Paladino diz que 'estava aguardando as outras 2', dando a entender que outras duas pessoas seriam contratadas da mesma forma, o que se confirmou, de acordo com as mensagens que veremos adiante. Ao final Paladino confirma que fez o 'terceiro mês' (de pagamento). (...) c) Em 16/02 ainda André questiona se 'deu certo aqueles registros e pgto?' e Paladino confirma que seria feito naquele dia. No dia 19/02, André menciona que precisa da confirmação do depósito e alinhar a diferença da planilha. Cumpre destacar que durante a análise do aparelho celular que estava em posse do investigado Francisco José Adriano foi identificada uma planilha enviada por André Nogueira na qual constam valores, datas de referência e marcações (de pagamentos), quando André fazia tratativas com Adriano e o questionava a respeito dos pagamentos que deveriam ser feitos, conforme trecho que reproduzimos abaixo. O referido documento está identificado como RAMídia - SP09. No mesmo dia Paladino confirma que tem 'agenda com Caio' (vide mensagem de troca de cartões de visita acima) e logo após questiona André se ele conseguiu (?). André responde com o número '2' e na sequência envia uma sequência de números, identificada posteriormente como o número de referência do CPF de Fabiana Gilho Alves de Almeida, conforme vemos: Como podemos perceber, ao final da conversa André Nogueira envia uma mensagem a Paladino com os seguintes dizeres: 'Me avisa tão logo seja feito...'. Mario Jorge Paladino responde afirmativamente dizendo que enviará o comprovante. No dia seguinte Paladino envia a mensagem com o anexo que reproduzimos abaixo: O conteúdo do anexo é um 'print' da tela de celular com o comprovante de transferência bancária realizada da conta da pessoa física Mário Jorge Paladino para Fabiana Almeida, no valor de R$ 4.375,00. d) No dia 07/03/18 André Nogueira envia mensagem a Paladino perguntando sobre 'novidade'. Paladino responde com três mensagens com anexos, conforme vemos: Ao analisar os anexos, identificamos que todos eles fazem referência a transferências eletrônicas de valores realizados em favor de 3 pessoas, duas delas já identificadas acima, a primeira como sendo Juliana de Paula Louro Storti, a segunda Fabiana Gilho Alves de Almeida e a terceira favorecida é Angela Poletini da Fonseca, CPF 347.742.638-00, como vemos abaixo. Todas as transferências foram realizadas no dia 08/03/2018 e tem o mesmo valor de R$ 4.375,00, o que corresponde exatamente aos valores descritos na 'planilha' enviada por André Nogueira a José Francisco Adriano, citada acima. e) Em 22/03 ANDRÉ envia uma mensagem questionando Paladino a respeito das "pendências". Vemos que André também cita Marcelo, possivelmente Marcelo Squassoni e em seguida CAIO, a mesma pessoa citada acima, a qual enviou o cartão de visitas. f) Em 13/4 Paladino envia novamente os comprovantes de transferências bancárias realizadas em favor das mesmas pessoas, fato que aparentemente ocorreu todos os meses. Os referidos documentos constam do arquivo original como anexo. g) Em 11/05 André cobra novamente Paladino sobre o pagamento, argumentando que seria importante até o quinto dia. h) A seguir vemos outros trechos da conversa entre Paladinio e André Nogueira, onde este último continua a cobrar os documentos

(possivelmente documentos necessários às contratações das pessoas indicadas por ANDRÉ) e a pendência (valores anteriores que não foram pagos), além do pagamento que ocorre mensalmente, a pretexto da MC3 ter contratado três pessoas(Juliana Louro, Fabiana Almeida e Angela Polentini). Cumpre destacar que André ameaça falar, em duas datas distintas, a primeira em 22/05 e a segunda em 22/06, no caso de descumprimento da obrigação por parte de Mario Jorge Paladino, com uma pessoa que ele chama de "AMIGO", supostamente Mario Squassoni. i) Após inúmeras mensagens de cobranças, no dia 12/07 PALADINO envia uma mensagem confirmando o registro de duas, das três pessoas indicadas por André Nogueira. Na sequência também envia os comprovantes de transferência no valor de R$ 4.375,00 para cada umas das mulheres indicadas. Ao final Paladino confirma que está indo buscar a carteira no Adriano (Francisco Jose Adriano). Vemos a seguir, ainda no dia 12/07, que André envia um "print" de uma tela contendo um extrato bancário, alegando "Não caiu em nenhuma das 3!?!?". Como vemos, André exerce total controle sobre os valores enviados por Paladino a pretexto de contratação de funcionários. Abaixo o print enviado por André (o saldo é referente à conta corrente pertencente à Juliana Louro, conforme os próprios comprovantes de transferência bancárias enviados). E na sequencia Mario Paladino responde com outro print de tela alegando que os créditos foram realizados. j) No dia 16/07 André solicita que Paladino informe as datas que cada pessoa passou a receber, o que é informado no dia seguinte por Mario Jorge Paladino. Podemos notar que para as 3 pessoas supostamente contratadas constam pelo um pagamento com o nome de Adriano(simbolizado por "+ 1 Adriano"), o que não seria comum se as pessoas realmente estivessem trabalhando e recebendo regularmente em suas contas bancárias. Devemos destacar que nos dias que sucedem, André continua a cobrar, muitas vezes vigorosamente, Paladino pela entrega dos documentos (carteiras de trabalho possivelmente) que este deveria fazer.

k) No dia 22/09 continuam as cobranças por parte de André , que alega que era importante o compromisso com essas pessoas, demonstrando interesse demasiado nos pagamentos. Vemos que mesmo após diversas cobranças, com uso de palavras de baixo calão, Paladino diz que conseguiu uma "situação muito favorável para ele" (Marcelo Squassoni), como forma de querer compensar os atrasos nos pagamentos. E as cobranças seguem nas mensagens seguintes, conforme cópia integral da conversa anexada. l) Estranhamente em 26/09, diante das sucessivas cobranças, Paladino informa que falta o pagamento da Angela e para tanto solicita os dados bancários, que prontamente é informado por Andre Nogueira. Vemos pelo teor da conversa que Andre Nogueira tem total controle sobre o saldo e valores que eventualmente sejam movimentados nas contas das três pessoas indicadas por ele, o que seria anormal, se essas pessoas realmente fossem trabalhadoras e prestassem serviço regular para a empresa MC3 TECNOLOGIA. E após a transferência dos valores, Paladino envia um comprovante em anexo de transferência de valores da conta dele a Angela Polentini da Fonseca. Podemos notar que a finalidade que consta no documento é "PAGTO MENSALIDADE ESCOLAR". m) Para constar e reafirmar a ligação entre André Nogueira e os candidatos a deputado federal e estadual Marcelo Squassoni e Edmir Chedid, fazemos constar a mensagem enviada em 06/10 pedindo votos para eles (...)"

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COM A PALAVRA, A DEFESA DE MARCELO SQUASSONI

Os advogados do ex-deputado Marcelo Squassoni informaram que vão ingressar ainda nesta quinta, 22, na Justiça Federal em Santos, com pedido de revogação da prisão. Squassoni é representado pelos advogados Marcelo Knoepfelmacher, Mariana Figueiredo Paduan e Felipe Locke Cavalcanti.

"Nós entendemos que a prisão do deputado Squassoni é desnecessária e descabida. Ele colaborou desde o início com as investigações e com a Justiça", disse Marcelo Knoepfelmacher.

O advogado destacou que 'inclusive quando detinha prerrogativa de foro, ainda em dezembro de 2018, (Squassoni) prestou dpeoimento voluntariamente'.

"Ele não tinha nem obrigação de depor, já que tinha a prerrogativa", observa Marcelo Knoepfelmacher. "Pelos elementos coligidos nos autos não há nada de novo que justifique a prisão temporária. Ela é descabida e desnecessária."

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