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'Parceiro, conversei com o cara do buffet, ele quer fechar em 550'

Analista da Receita Federal Marcial Pereira de Souza, alvo da Operação Armadeira, pediu mais de meio milhão de euros a réu da Lava Jato para não sofrer fiscalização tributária e levar multa do Fisco

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Por Paulo Roberto Netto
Atualização:

O analista tributário da Receita Federal Marcial Pereira de Souza, alvo da Operação Armadeira deflagrada nesta quarta, 2, teria negociado propina de meio milhão de euros para barrar fiscalização e multas tributárias contra Ricardo Siqueira Rodrigues, réu da Operação Rizoma, desdobramento da Lava Jato que investiga desvio de verbas dos fundos de pensão dos Correios, o Postalis, e do Serpros.

Agentes da Polícia Federal e da Receita durante a Operação Armadeira da força tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro (RJ), nesta quarta-feira, 02. Foto: José Lucena / Futurapress

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O depoimento de Rodrigues e as ações de Marcial Pereira levaram a Polícia Federal a aprofundarem as investigações contra organização criminosa formada por servidores do Fisco que cobravam propinas de investigados da Lava Jato em troca de suspensão de processos e em multas por sonegação.

As informações constam em pedido de prisão encaminhado por procuradores do Ministério Público Federal ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro.

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Segundo Rodrigues, o analista teria se aproximado em agosto do ano passado por meio de seu contador, Rildo Alves, e alertado, no dia 06 daquele mês, que sofreria em breve uma fiscalização da Receita relativa a movimentações financeiras realizadas entre 2009 e 2016 e que isso "geraria uma multa elevada", mas que ele poderia "resolver o problema".

 

Em encontro em restaurante no Rio de Janeiro no dia 12 de setembro, o analista exigiu pagamento de 750 mil euros para que Rodrigues "não tivesse nenhum auto de infração de valor elevado", mas o réu alegou não ter condições de arcar com a despesa. Marcial Pereira ficou de "falar com sua equipe a respeito de uma contraproposta" -- às 12h48, o analista enviou a mensagem para o contador do delator, Rildo Alves, que encaminhou o texto para Rodrigues.

"Parceiro, conversei com o cara do Buffet. Ele quer fechar em 550 [mil euros]. Dividindo assim: 150 agora, 100 em outubro, 100 em novembro, 150 em dezembro e 50 em janeiro".

 

A proposta, no entanto, encontrou entraves nas políticas de compliance dos bancos, que poderiam suspeitar de movimentações de grandes quantias. Em outubro, o réu da Lava Jato e o analista acordaram em fazer depósitos mensais de 50 mil euros em conta bancária de banco português.

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O próprio Marcial Pereira viajou a Portugal em agosto possivelmente com o objetivo de abrir tal conta, acusam os procuradores. O analista esteve no país europeu entre os dias 11 de julho a 02 de agosto do ano passado.

 

Furna da Onça. As negociações da propina encontraram empecilhos com a deflagração da Operação Furna da Onça, em novembro do ano passado. Sem receber o dinheiro, Marcial passou a cobrar de Rodrigues o pagamento de 50 mil euros para quitar as investigações contra si na Receita.

"Parceiro, boa tarde. A reforma foi iniciada em agosto e precisamos da liberação de verbas para o pagamento dos operários. Aguardamos depósitos. Um abraço", disse Marcial em mensagem obtida pelos investigadores.

 

Enquanto agentes da Polícia Federal vasculhavam a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) em ação contra corrupção, lavagem de dinheiro e loteamento de cargos, o analista desmarcava reunião com Rodrigues no aeroporto Santos Dumont por "temores em encontrar alguma autoridade". O encontro foi adiado para o dia seguinte e, durante o mês de novembro, o analista acertou os detalhes finais do pagamento da propina.

Ação controlada. Após fechar negociação com o analista, Rodrigues foi ao Ministério Público denunciar que estava sendo "achacado" por servidores da Receita e entregou mensagens, vídeos e áudios de conversas firmadas com Marcial. Os procuradores optaram por permitir ao delator que pagasse 50 mil ao analista em uma ação controlada.

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Captura de tela de filmagem de câmera de segurança de restaurante onde delator da Lava Jato se encontrou com analista da Receita.  

Ações controladas são técnicas de investigação na qual a ação policial é postergada para obtenção de mais provas de envolvimento de terceiros no crime investigado. Neste cenário, os procuradores visavam descobrir quem estaria em conluio com Marcial na Receita, visto que o mesmo não tinha, à época, competência para atuar sobre o procedimento fiscal contra o delator da Lava Jato.

Vídeos obtidos pelo Ministério Público Federal mostram o delator se encontrando com Marcial. As gravações foram divulgadas pela procuradoria nesta quarta, 2, após a deflagração da Operação Armadeira.

DELATOR ENCONTRA COM ANALISTA

Marcial Pereira e sua esposa tiveram a prisão preventiva decretada pelo juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro. O magistrado também determinou a prisão de Marco Aurélio Canal, supervisor de programação da Receita Federal e suspeito de ser um dos principais articuladores da organização criminosa.

COM A PALAVRA, O ANALISTA MARCIAL PEREIRA DE OLIVEIRAA reportagem busca contato com a defesa de Marcial Pereira de Oliveira. O espaço está aberto para manifestações

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