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Vídeo enganoso espalha compilado de alegações já desmentidas sobre fraude nas urnas eletrônicas

Postagem que viralizou no Facebook traz gravações editadas e fora de contexto para acusar fraude no sistema eleitoral

Por Victor Pinheiro
Atualização:

Viralizou nas redes sociais um vídeo enganoso que mostra um compilado de acusações de fraude nas urnas eletrônicas, já rebatidas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A postagem no Facebook traz trechos de outras gravações fora de contexto para sugerir que as urnas registraram voto nulo quando eleitores digitavam o número do presidente Jair Bolsonaro, o que não é verdade. Na realidade, nas eleições 2018, diversos eleitores erraram ao inserir o número do candidato no campo de votação para o cargo de governador. 

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O vídeo enganoso ainda apela para uma edição grosseira de um discurso do presidente da corte eleitoral, o ministro Luís Roberto Barroso, para sugerir a insegurança do sistema eletrônico. No clipe editado, o magistrado parece dizer que "há risco de fraude no sistema eleitoral brasileiro" -- mas a gravação foi cortada para retirar o "não" do início da frase.

Outra acusação sem fundamento contida no vídeo é a de que documentos eleitorais foram descartados em Goiânia nas eleições de 2014. Contudo, segundo autoridades eleitorais, o incidente não prejudicou a apuração dos resultados.

É importante ressaltar que em 25 anos de uso do voto eletrônico, nunca foi comprovada fraude ou invasão às urnas eletrônicas. Ainda assim, o conteúdo, cuja legenda afirma que as urnas são "fraudadas", ultrapassou a marca de 45 mil compartilhamentos no Facebook e acumula mais de 195 mil visualizações. Confira abaixo a checagem das principais alegações expostas no vídeo.

 Foto: Estadão

Discurso de Barroso foi editado

O conteúdo enganoso apela para uma edição grosseira de um discurso de Barroso durante as eleições municipais 2020. A edição omite a palavra "não" na fala do magistrado com o intuito de sugerir que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) teria admitido que há risco de fraude no sistema eleitoral brasileiro.

A gravação original, publicada no canal no YouTube da CNN Brasil, deixa clara a manipulação no minuto 3:24 da reportagem. Barroso comentava o atraso da divulgação dos resultados do 1º turno. O problema foi atribuído a mudanças e entraves técnicos no sistema de totalização da corte, como informou o Estadão na época. O ministro, na verdade, ressalta que o episódio não afetou a integridade das eleições. 

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"Os resultados tiveram absoluta integridade e fidedignidade. Tudo auditável. Não há riscos de fraude no sistema eleitoral brasileiro", pontuou Barroso. 

Eleitor digitou 17 em votação para outro cargo

A denúncia seguinte mostra o trecho de um vídeo em que um eleitor acusa uma suposta falha na urna ao tentar votar no presidente Jair Bolsonaro. Ele diz à mesária ter inserido o número 17, mas, em vez de mostrar a foto do candidato, a urna indicou voto nulo. Ao contrário do que sugere o vídeo enganoso, o episódio não passa de uma confusão do próprio eleitor com a ordem de votação. 

O Estadão Verifica identificou, no YouTube, um vídeo com mais de 2 minutos que retrata a votação do mesmo senhor, com mais detalhes. É possível perceber que, antes do homem apontar as supostas irregularidades na urna, o vídeo registra o sinal sonoro de confirmação de apenas quatro votos (0:39) (0:49) (0:55) (1:00). 

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Naquelas eleições, eleitores deveriam registrar o total de seis votos, na seguinte ordem: deputado estadual, deputado federal, senador, senador, governador e presidente. Isso indica que o homem inseriu o código 17 ainda no campo de opção para governador. O vídeo mostra, no minuto 2:00, um fiscal da seção eleitoral com um colete do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ), o que indica o Estado em que ocorreu o episódio. 

O número 17 não correspondia a nenhum dos candidatos a governador do Estado do Rio de Janeiro nas eleições 2018, como mostra o site do TSE. Quando eleitores inserem um número inexistente para um cargo, a urna retorna um voto nulo. Ao final do vídeo, o homem completa os dois votos restantes e admite que inseriu o código na votação para outro cargo.

Como mostrou o Comprova, nos dias das eleições circularam boatos de fraude semelhantes decorrentes do erro de eleitores. Ainda assim, o presidente Jair Bolsonaro citou esses episódios para espalhar acusações infundadas contra o sistema eletrônico durante uma transmissão ao vivo realizada em julho. 

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TSE desmentiu autopreenchimento de urnas com número de Haddad

O conteúdo enganoso analisado ainda mostra relatos de uma falha em que eleitores digitavam somente o número um e as urnas eletrônicas supostamente autocompletavam o voto com o código do candidato à Presidência Fernando Haddad (PT). O boato se espalhou nas redes sociais a partir de um vídeo editado que foi alvo de perícia de técnicos da Justiça Eleitoral. 

A perícia do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) apontou que duas pessoas pressionaram as teclas um e três simultaneamente. Em vídeo divulgado pela corte, um técnico da instituição ressalta que a gravação omite o botão de número três das filmagens no momento do voto e indica que um software identificou dois sons de cliques distintos pouco antes da urna apresentar a foto de Haddad.  

Documentos eleitorais extraviados em Goiânia não prejudicaram eleição

O boato ainda apresenta dois trechos de um outro vídeo em que moradores de Goiânia encontraram documentos eleitorais em um terreno após o primeiro turno das eleições de 2014. Em nota divulgada na época, o TRE de Goiás esclareceu que um malote da seção eleitoral nº 468 foi extraviado durante transporte, mas negou que o incidente tenha causado algum prejuízo à apuração dos votos ou à integridade das eleições. 

O episódio foi tema de reportagens dos portais de notícias G1 e R7. As matérias jornalísticas relatam que entre os documentos extraviados constavam cadernos de mesários, boletins de urna e até um pendrive com cópias dos dados registrados na urna. Segundo a corte, o ocorrido não causou danos à apuração dos votos, "uma vez que os dados da votação da respectiva seção foram recuperados diretamente da urna eletrônica, que sempre esteve sob a guarda do Tribunal.". 

Uma verificação da Agência Lupa mostra que os resultados daquela seção estão disponíveis no repositório de dados eleitorais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

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Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

 

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