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Criminalistas dizem que bolsonaristas estão errados e que STF pode abrir investigação 'de ofício'

Advogados ironizam o fato de que, agora que aliados do presidente viraram alvo de operação da PF, passaram a citar direitos de defesa e criticar práticas do modelo inquisitório

Por Paula Reverbel
Atualização:

Diante dos argumentos – vindos da família Bolsonaro – de que a operação da Polícia Federal contra o "gabinete do ódio" é inconstitucional porque a iniciativa da investigação partiu do Supremo Tribunal Federal (STF) e não da Procuradoria-Geral da República (PGR), criminalistas ouvidos pelo Estadão nesta quarta-feira, dia 27, ironizaram o fato de que bolsonaristas passaram a citar protocolos do direitos da defesa – ou seja, dos direitos dos acusados – em suas manifestações.

Eduardo e Carlos Bolsonaro, filhos do presidente Jair Bolsonaro Foto: Dida Sampaio/Estadão

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"De uma hora para a outra, eles – que acusam todo mundo de bandidos, de corruptos e outras tantas coisas – lembraram que existe direito de defesa", afirmou o advogado criminalista Alberto Zacharias Toron. "O fato é que essa instauração (do inquérito) é muito oportuna porque ela quebra a espinha dorsal de gente que não só espalha fake news, mas de gente que está atentando contra instituições do Estado, incluindo o STF e o Poder Legislativo. Esse inquérito é importantíssimo para a saúde da nossa democracia e eu aplaudo a decisão do ministro Alexandre de Moraes", acrescentou.

O também criminalista Antonio Cláudio Mariz de Oliveira argumentou o mesmo: "É estranho que só agora os bolsonaristas estejam levantando essa questão (de procedimentos) agora que eles são alvo da operação, visto que essa investigação foi aberta há um ano". Mariz explica que o Supremo pode sim determinar a abertura de uma investigação. "Tem o direito e – sabendo da prática de crime – o dever de fazer isso, se não comete crime de prevaricação. Se um ministro do Supremo fica sabendo que eu comtei um assassinato, ele não pode fazer nada porque não é da procuradoria?", exemplificou.

Fábio Tofic Simantob explicou que existe uma discussão sobre se o processo penal deveria seguir um sistema chamado de "acusatório" – em que o juiz só age em resposta à acusação ou à defesa – ou "inquisitório", em que o juiz pode ter uma postura mais proativa. "Embora nós (advogados criminalistas) defendemos que a Justiça brasileira deva ser cada vez mais acusatória, a lei ainda prevê alguns momentos em que o juiz possa agir por iniciativa própria", explicou. 

Tanto Tofic Simantob quanto Toron citam o artigo 242 do Código de Processo Penal, que determina que a busca pode ser determinada "de ofício" pelo juiz – ou seja, independentemente de qualquer pedido – ou atendendo a solicitação de uma das partes. Tofic ainda destaca que os membros da família Bolsonaro sempre foram muito favoráveis ao processo do tipo inquisitório, em que o juiz pode ter iniciativa. 

"Quer um exemplo? Nas audiências da Operação Lava Jato, quem aparecia mais fazendo perguntas? O membro do Ministério Público ou o juiz Sérgio Moro, que fazia perguntas com o claro intuito de produzir provas?", exemplificou. "A pessoa que o presidente Jair Bolsonaro escolheu para ser ministro da Justiça era o típico juiz de ataque, que a gente sempre criticou. Mas a lei permite", concluiu. 

Toron fez a ressalva de que uma das coisas discutíveis no inquérito que está sob os cuidados de Alexandre de Moraes é se ele fere ou não um preceito jurídico importante que separa o juiz que vai julgar da acusação. "O ministro Toffoli entendeu que o regimento interno autoriza a instauração de inquérito nos casos em que o próprio Supremo seja vítima. Essa é a questão que a Procuradoria coloca em debate", afirmou.

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Uma operação da Polícia Federal deflagrada nesta quarta, 27, no âmbito da investigação aberta pelo STF, aprendeu celulares e computadores de apoiadores bolsonaristas. O inquérito sigiloso havia sido aberto em março do ano passado para apurar ameaças, ofensas e fake news disparadas contra os integrantes do Supremo e seus familiares.

No início da investigação, a iniciativa sofreu oposição do Ministério Público Federal por ter ter sido iniciada por iniciativa do presidente do STF, ministro Dias Toffoli. Quando o atual procurador-geral da República, Augusto Aras, sucedeu Raquel Dodge, ele mudou a postura do órgão sobre as investigações, manifestando-se favoravelmente. Agora que a operação atingiu bolsonaristas, porém, Aras mudou de ideia e pediu o arquivamento do inquérito. 

Na solicitação desta quarta-feira, Aras se posicionou no âmbito de uma ação da Rede Sustentabilidade, enviada em março de 2019 ao ministro Edson Fachin. Nela, o partido pedia que a portaria de instauração do inquérito fosse avaliada pelo plenário da corte.

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