O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) aprovou nesta sexta-feira, dia 5, uma punição atenuada para o deputado Fernando Cury (Cidadania) no caso de importunação sexual à colega parlamentar Isa Penna (PSOL). Saiu vitorioso, por 5 votos a 4, o relatório entregue nesta sexta pelo deputado Wellington Moura (Republicanos), que elaborou um parecer sugerindo a suspensão do mandato de Cury por 119 dias.
Logo após a votação, os deputados que votaram a favor da pena atenuada saíram da videoconferência para derrubar o quorum da reunião, impedindo as manifestações finais. A postura foi classificada pela presidente do Conselho, Maria Lúcia Amary (PSDB), como uma falta de respeito. "Eu ouvi todos até o fim durante meses. Faltaram com respeito comigo. É uma falta de respeito eles se retirarem para que eu não tenha o direito de manifestar", afirmou a presidente. O resultado ainda precisa passar pelo plenário da Alesp, onde requer maioria simples em votação aberta.
Em seu voto, Moura admitiu que sua intenção é preservar os funcionários do gabinete de Cury da possibilidade de serem exonerados no período em que o parlamentar está suspenso, já que Alesp permite que os deputados estaduais tirem licença para tratamentos médicos por até 120 sem convocar o suplente. Na sessão anterior, o relator do caso, Emidio de Souza (PT), havia proposto a suspensão de seis meses.
Votaram com Moura os deputados Delegado Olim (PP), Alex de Madureira (PSD), Adalberto Freitas (PSL) e Estevam Galvão (DEM), o membro corregedor. Votaram com Emidio os deputados Maria Lúcia Amary, Barros Munhoz (PSDB) e Erica Malunguinho (PSOL). O último membro do Conselho, Campos Machado (Avante), está de licença dos trabalhos formais da Alesp, se recuperando de uma cirurgia.
Na transmissão, Emido falou que Estevam Galvão havia mudado o seu voto na véspera. Após o proferimento do resultado, o relator original do processo alegou que a intenção dos aliados de Cury era deixar o gabinete funcionando para que possibilitar que o deputado continuasse despachando como se não estivesse suspenso.
O Estadão apurou que a Procuradoria da Assembleia terá que se debruçar justamente sobre aquilo que é a expectativa dos aliados de Cury – a manutenção dos funcionários do gabinete –, já que a previsão de manter as nomeações no caso de ausências de até 120 dias é em caso de licenças, não de suspensão. Procurada, a Mesa Diretora se limitou a informar, no início da tarde, que ainda não havia sido oficiada da decisão do Conselho e que nunca houve um caso de suspensão do mandato, gerando incerteza sobre o rito que deverá ser seguido para enviar a decisão ao plenário. Apesar de o Código de Ética da Alesp prever votação secreta, essa modalidade foi abolida pela Casa em uma emenda constitucional aprovada em 2001, fazendo com que a votação do caso Cury seja aberta.
Cury não receberá remuneração, mas ainda não se sabe se ele terá direito a verba de gabinete ou quais funções ele poderá desempenhar durante a suspensão. Atualmente, Cury têm 16 servidores comissionados e um efetivo em seu gabinete. Em janeiro – último mês a ter a folha de pagamento divulgada –, 14 deles receberam o total de R$ 211.810,56 em remuneração bruta. Os outros dois só foram nomeados em fevereiro.
"Eles vão coninuar trabalhando para um deputado que cometeu uma falta grave e ele vai ficar descansando e aproveitando para fazer visitas políticas ou até despachando. Então qual é a punição?", indagou Amary ao Estadão algumas horas após o resultado. Sobre a indefinição, ela comentou: "Estamos o tempo todo tendo que interpetar (as regras) por falta de uso. Não tem falta de candidato (a receber punições), mas por falta de uso". A parlamentar informou que até o início de seu mandato como presidente no Conselho, a Alesp não aplicava, desde 1999, nenhum tipo de punição aos deputados, arquivando liminarmente as queixas sem abrir processos.
A discussão anterior à votação foi acalorada. Emidio chamou de "pequenez" a intenção de só punir Cury por 119 dias e afirmou que só não defendeu em seu parecer a cassação do mandato de Cury porque avaliou que o plenário da Alesp não iria acolher uma proposta de cassação. A suspensão de seis meses era, segundo ele, um meio-termo construído no gabinete de Estevam Galvão, que depois teria dado para trás.
"Desculpem, é uma pequenez", afirmou Emidio sobre a intenção do colega. "A quem esses funcionários vão assessorar durante o pedido de suspensão? O problema é a gente avaliar o fato (o assédio)", argumentou.
"Se dependesse da minha única e exclusiva vontade, teria sido pedido de cassação do mandato e não de suspensão por seis meses. Mas eu o fiz na tentativa de construir um entendimento que gerasse uma punição para que esse caso não manchasse da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e, principalmente, que restituísse à deputada Isa Penna a dignidade que lhe foi roubada naquele ato – não vou chamar de ato descuidado, vou chamar de ato de covardia", afirmou.
Para argumentar a favor dos 119 dias de punição, Moura disse que cabia aplicar o princípio da intransmissibilidade da pena, segundo o qual apenas a pessoa sentenciada poderá responder pelo crime que praticou. Fez uma analogia na qual afirmou que seria um absurdo se a polícia – ao prender um homem que roubou, por necessidade, comida em um supermercado – prendesse também a família do sujeito.
Moura ergueu várias fotos de Cury com a sua família e, no fim de sua fala, se dirigiu a Isa Penna e disse: "Existe o amor de Deus dentro de você, para você, nesse momento, aprender a perdoar".
Álcool
O deputado Barros Munhoz (PSDB) criticou duramente a alternativa de 119 dias de punição e salientou que Cury mentiu em seu depoimento ao Conselho quando falou que não havia ingerido álcool no dia em que assediou Penna.
"Deputado Fernando Cury, meu irmão, você não falou a verdade quando disse que não bebeu naquele dia. E mais: o teu gabinete, ficou aberto, ao que consta, até 4 horas da manhã naquela noite. A verdade é esta: você cometeu uma falha grave porque você estava muito alegre", afirmou. Cury não estava participando da transmissão.
"Você sabe disso, eu sei disso, o Alex da Madureira sabe disso. Ele sabe o que você falou para ele e o que ele falou para você. Ele sabe por que ele tentou te segurar te segurar pelo braço, era para você não fazer a besteira que você fez", acrescentou Munhoz.
No dia do assédio, Cury conversava com Madureira e disse algo ao colega logo antes de caminhar em direção a Penna. Madureira tentou segurar o colega, mas não conseguiu. Em seguida, se desenrolou o episódio em que o parlamentar acusado de importunação sexual se aproximou da deputada por trás, tocando-lhe os seios. A cena foi filmada pelas câmeras da Assembleia.
Madureira, que é vice-presidente do Conselho de Ética, faltou à sessão em falaria, a convite de Penna, para esclarecer o episódio. No início do processo, foi negado um pedido de Penna para que Madureira fosse apenas testemunha mas não pudesse deliberar com o colegiado sobre o caso, dada sua participação no incidente.