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A disputa eleitoral nas redes sociais

YouTube remove só 4,4% dos vídeos com desinformação contra urna eletrônica

Nova regra de moderação tem alcance limitado, aponta estudo; plataforma diz que não permite ‘informações falsas sobre fraude generalizada’ na eleição de 2018 e cita parceria com TSE

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Por Samuel Lima
Atualização:

Desde que anunciou uma nova política para a redução da disseminação de informações enganosas sobre as eleições no Brasil, em março de 2022, o YouTube vem removendo vídeos com alegações infundadas sobre fraudes nas urnas eletrônicas. Estudos mostram, no entanto, que essa prática não é feita de forma contínua e transparente, além de apresentar alcance limitado em comparação com a quantidade de desinformação que circula na plataforma de vídeos.

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Em 18 de março, dias antes do anúncio do YouTube, levantamento do professor Marcelo Alves, do Departamento de Comunicação da PUC-Rio, mostrou que ao menos 1.701 vídeos com questionamentos sobre a lisura das eleições no Brasil e com conteúdo golpista estavam disponíveis. Uma nova rodada da pesquisa constatou que até o final de maio apenas 75 deles haviam sido removidos pela empresa ou pelos próprios usuários que compartilharam o material. Ou seja, em cerca de dois meses e meio, as novas regras de moderação atingiram apenas 4,4% dos conteúdos analisados.

Foram derrubados, por exemplo, vídeos que repercutiam o discurso do ex-deputado estadual Fernando Francischini (União Brasil-PR) sobre supostas fraudes contra Jair Bolsonaro nas eleições de 2018. Francischini foi cassado, na primeira semana de junho, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por propagar informações falsas.

Jair Bolsonaro durante live, em julho de 2021, em que citou supostas falhas de segurança das urnas eletrônicas - presidente, na verdade, reproduziu boatos e fez alegações falsas. Foto: Reprodução

Ao todo, as remoções atingiram conteúdos que somavam 4,7 milhões de visualizações e 23 mil comentários no YouTube. O canal Nação Patriota foi o que mais teve materiais excluídos (12), enquanto o Folha Política é o que mais obteve visualizações com esse tipo de conteúdo (2,8 milhões). Outros exemplos de desinformação, entretanto, permanecem no ar, como a live em que o presidente Bolsonaro resgatou boatos antigos para questionar a segurança das urnas eletrônicas. Os 1.626 conteúdos ativos acumulam 63 milhões de visualizações e 345 mil comentários.

Para o autor da pesquisa, ainda que nem todos os vídeos possam ser classificados como desinformação, o número de penalizações para essa infração é baixo e mostra que ainda falta comprometimento da plataforma em conter a propagação de informações falsas. "O YouTube deu um passo na direção de reconhecer o problema, mas é bastante evidente que essa moderação é insuficiente para dar conta da instrumentalização e da apropriação da plataforma para fins de ataques antidemocráticos", disse.

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Alves também entende que é preciso investir em rótulos para fontes confiáveis de informação e aumentar a transparência sobre o motivo da exclusão dos conteúdos. Dos 75 vídeos removidos, apenas 16 informavam que se tratava de uma violação das diretrizes.

Outra questão que preocupa quem monitora redes sociais é se a política de moderação do YouTube será permanente ao longo do ano eleitoral. Guilherme Felitti, pesquisador da Novelo Data, observa que houve um empenho inicial em conter a propagação de vídeos enganosos que defendiam tratamentos sem eficácia contra a covid-19 em abril do ano passado, mas a política arrefeceu nos meses seguintes.

O YouTube, fundado em 2005, pertence ao Google desde 2006. Imagem: Dado Ruvic/Reuters 

O levantamento da Novelo nos principais canais de extrema direita contabiliza 45 materiais excluídos por mentiras sobre fraudes eleitorais desde a data do anúncio das novas regras, em 22 de março. Chama a atenção o espaçamento entre as penalizações: foram 10 remoções na primeira semana, mas a 11ª só ocorreu duas semanas depois, em 13 de abril.

As medidas se intensificaram a partir do dia 23 de maio - mais da metade do total de conteúdos removidos (27) se deram nas duas semanas mais recentes. O alcance limitado e a falta de regularidade faz com que Felitti questione se o YouTube está realmente interessado em fazer uma "limpeza" na plataforma de forma eficiente.

"De maneira geral, os indícios que temos sugerem que o YouTube não está interessado em efetividade. Acho que existe um esforço em livrar a própria responsabilidade, de mostrar para as pessoas que está interessado quando elas estão olhando, mas depois é algo que volta ao padrão", afirmou o pesquisador.

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Ele também critica o fato de a live de Bolsonaro contra as urnas continuar disponível na plataforma, assim como uma transmissão do pastor Silas Malafaia defendendo o "tratamento precoce". Os conteúdos foram postados em junho e julho de 2021.

O pastor Silas Malafaia durante culto no Rio, em dezembro de 2021. Foto: Wilton Junior/Estadão

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O que diz o YouTube

Em nota, o YouTube afirmou que elaborou um "sólido conjunto de políticas e sistemas" e que suas diretrizes não permitem "informações falsas sobre fraude generalizada, erros ou problemas técnicos que supostamente tenham alterado o resultado" das eleições de 2018. O texto ressalta que a plataforma mantém uma parceria com o TSE desde 2014, que é a "espinha dorsal" do trabalho no período eleitoral.

A plataforma de vídeos afirma que 3,8 milhões de vídeos foram removidos de janeiro a março deste ano. A maior parte se refere a conteúdo violentos, nudez e que atentam contra a segurança infantil - não é especificada a quantidade relativa à integridade das eleições. O Brasil teve 211.580 vídeos derrubados no primeiro trimestre deste ano.

O Estadão entrou em contato com os canais citados nesta reportagem pelos endereços de e-mail fornecidos ao YouTube. Os responsáveis pelas páginas Nação Patriota e Folha Política não responderam até o momento desta publicação. / COLABOROU LEVY TELES

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