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'Tenha dignidade para se demitir', disse Bolsonaro a Moro em mensagem obtida pela PF

Relatório encaminhado pela Polícia Federal ao Supremo Tribunal Federal revela mensagem inédita do presidente pressionando o então ministro da Justiça e Segurança Pública, que opinou sobre atuação de forças policiais no cumprimento de medidas de isolamento social

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Por Fausto Macedo e Paulo Roberto Netto
Atualização:

Relatório da Polícia Federal encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) revelou troca de mensagem inédita entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro. A conversa, por telefone, revela que o presidente pressionou o ex-juiz da Lava Jato após se sentir contrariado com uma declaração de Moro à imprensa.

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O RELATÓRIO DA PF

O relatório da PF analisou conversas trocadas entre Bolsonaro e Moro durante o período de 12 a 23 de abril - um dia antes de o ex-ministro anunciar sua demissão e acusar o presidente de interferir politicamente no comando da corporação para obter informações sigilosas.

A conversa inédita ocorreu no dia 12 de abril, quando Bolsonaro encaminhou notícia publicada no jornal Valor Econômico na qual Moro opinava que a polícia poderia prender quem descumprisse o distanciamento social e quarentena - ambas medidas eram criticadas pelo presidente à época.

"Se esta matéria for verdadeira: Todos os ministros, caso queira contrariar o PR, pode fazê-lo, mas tenha dignidade para se demitir. Aberto para a imprensa", escreveu Bolsonaro a Moro.

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O então ministro respondeu: "O que existe é o artigo 268 do Código Penal. Não falei com imprensa".

O artigo 268 considera crime punível com detenção de um mês a um ano a quem infringir determinação do poder público que se destina a impedir propagação de doença contagiosa.

O presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro. Foto: Dida Sampaio / Estadão

O relatório da PF também transcreve duas conversas já divulgadas entre Bolsonaro e Moro - uma sobre o avanço de inquérito dos atos antidemocráticos a aliados do Planalto e outra sobre a exoneração de Maurício Valeixo.

Nas 'recomendações finais' do relatório, o agente responsável pelo relatório aponta que não teve acesso a conversas trocadas entre Moro e Valeixo, ou a outras provas. Apesar disso, ele conclui que Bolsonaro 'já estaria decidido a realizar a mudança no comando da PF, independente da formalidade aplicada no caso concreto, de 'ex-oficio' ou 'a pedido'.

A PF indica no mesmo relatório que a totalidade das conversas entre o presidente e o ex-ministro 'se restringe a assuntos afetos à gestão pública'. Um exemplo citado é o ato de prorrogar ou não o decreto de fechamento de fronteira com o Uruguai durante a pandemia do novo coronavírus. "Não há registros de conversas afetas à vida pessoal", apontou a PF.

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As trocas de mensagens entre Moro e a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) também foram registradas no relatório. Após o então ministro anunciar que sairia do governo por causa da demissão de Valeixo, Zambelli teria solicitado a Moro que aceitasse Alexandre no comando da PF. Em troca, ela se comprometia a 'ajudar' Moro, a 'fazer o JB prometer'. "Vá em setembro para o STF", escreveu Zambelli.

Segundo a PF, 'em nenhum momento as mensagens permitem entender que houve interesse ou promessa de tal cargo (no STF), tanto por parte do ex-ministro quanto da parte do Presidente da República'.

"A única condição imposta pelo então ministro para permanecer no comando da pasta foi a de manter inalterada a direção-geral da Polícia Federal", apontou a PF, que também diz que não foram identificadas nas mensagens 'menções a relatórios de inteligência'.

As mensagens foram obtidas pela PF após o depoimento de Moro, no dia 2 de maio, na sede da Superintendência Regional da corporação em Curitiba.

O ex-juiz e o presidente são investigados em inquérito aberto em abril para apurar as acusações de Moro sobre suposta interferência de Bolsonaro no comando da PF, após a demissão de Maurício Valeixo da chefia da corporação. As trocas visariam a obtenção de informações sigilosas e estratégicas para blindar familiares e aliados em investigações. O Planalto nega as acusações.

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Nesta quarta, 2, a PF pediu a prorrogação do inquérito por mais 30 dias. O caso está sendo conduzido pelo ministro Celso de Mello, do STF, que está de licença médica. Uma das diligências que devem ser realizadas na investigação é o depoimento de Bolsonaro, ainda sem data e forma para ocorrer. O pedido para ouvir o presidente partiu da delegada Christiane Correa Machado, que lidera o caso.

Em ofício ao Supremo, ela afirmou que as investigações 'se encontram em estágio avançado, razão pela qual nos próximos dias torna-se necessária a oitiva' do presidente.

Em junho, o procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu que Bolsonaro possa escolher a forma como prefere depor.

Até o momento, o próprio Sérgio Moro, ministros palacianos, delegados e superintendentes da Polícia Federal e a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) foram ouvidos no processo.

A investigação pode levar à apresentação de uma denúncia contra o presidente da República e, consequentemente, seu potencial afastamento do cargo caso o Congresso dê aval ao prosseguimento da acusação.

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