Atualizada às 11h05 de 29.01 com correção*
A Corregedoria do Tribunal de Justiça de Minas sugeriu nesta segunda, 25, ao Órgão Especial da corte, a abertura de processo administrativo disciplinar contra a juíza Ludmila Lins Grilo, da Vara Criminal e da Infância e da Juventude de Unaí, no noroeste do Estado, em razão de a magistrada ter usado as redes sociais para defender aglomeração de pessoas na pandemia do novo coronavírus. O corregedor-geral de Justiça mineiro, desembargador Agostinho Gomes de Azevedo, considerou que que houve violação aos deveres funcionais previstos na Lei Orgânica da Magistratura e no Código de Ética da Magistratura.
Segundo Azevedo, a conduta da juíza 'ultrapassa a esfera particular e atinge o interesse público na medida em que a magistrada orienta a como descumprir determinações impostas pelo poder público'. "A magistrada, em algumas de suas postagens nas redes sociais, incitou seus seguidores a descumprirem medidas de segurança de combate ao novo coronavírus emanadas do Poder Público, destinadas a impedir a propagação do covid-19, notadamente o uso de máscara de proteção individual e o distanciamento social, infringindo normas mundiais, nacionais, estaduais e municipais", diz um trecho do documento.
Em ofício enviado ao Conselho Nacional de Justiça no dia seguinte à decisão, a corregedoria da corte mineira informou sobre o procedimento para 'evitar possível litispendência administrativa'. Além disso, apontou que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça mineiro deve decidir, em sessão prevista para o próximo dia 10, sobre o envio do caso ao Ministério Público do Estado, por indícios de crime contra a saúde pública e incitação a crime.
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LEIA A ÍNTEGRA DO OFÍCIOO caso chegou ao CNJ depois que um advogado formalizou uma representação contra a juíza. Na época, ela disse ao Estadão que considera a ofensiva uma 'previsível reação histérica do establishment contra a livre circulação do pensamento divergente, com a finalidade de manter juízes confinados no curral do politicamente correto'.
"Passo a passo para andar sem máscara no shopping de forma legítima, sem ser admoestado e ainda posar de bondoso: 1- compre um sorvete; 2- pendure a máscara no pescoço ou na orelha, para afetar elevação moral; 3- caminhe naturalmente", diz a mensagem que acompanha a gravação.
Ludmila também usou o perfil no Twitter para publicar registros de uma viagem a Búzios, no litoral fluminense, durante das comemorações de Ano Novo. Nas postagens, afirma que a 'cidade que não se entregou docilmente ao medo, histeria ou depressão' e inclui a hashtag #AglomeraBrasil.
Em janeiro, o CNJ chegou a pedir que a juíza prestasse informações sobre as publicações. No entanto, Ludmila afirmou que abre mão da defesa no caso.
"Considerando que a necessidade de explicação de uma crítica irônica ao indiscriminado uso de máscaras, feita a partir de uma fiel descrição da realidade (restaurantes e shoppings abertos para consumo de alimentos no local), avilta e rebaixa a inteligência nacional - estado histérico de coisas com a qual esta magistrada não pretende contribuir - deixo de oferecer defesa no procedimento em questão, ratificando todas as publicações contidas em minhas redes pessoais", disse.
A magistrada disse ainda que, enquanto não for decretado estado de defesa ou de sítio no País, continuará 'sustentando a inviabilidade jurídica do lockdown e das restrições de liberdades via decretos municipais'. Na pandemia, o Supremo Tribunal Federal chancelou a autonomia de Estados e municípios para, levando em conta o contexto local, determinarem medidas de isolamento social e enfrentamento ao novo coronavírus mesmo sem aval do governo federal.
"Enquanto não decretado estado de defesa ou estado de sítio (arts. 136 e 137 da Constituição Federal) - únicas hipóteses possíveis para restrição do direito de reunião (vulgo "aglomeração", palavra-gatilho utilizada com sucesso para a interdição do debate) - continuarei sustentando a inviabilidade jurídica do lockdown e das restrições de liberdades via decretos municipais", acrescentou.
*O texto foi corrigido para indicar que a corregedoria do Tribunal de Justiça de Minas propôs a abertura de PAD contra a juíza Ludmila Lins Grilo ao Órgão Especial da corte e não ao órgão Especial do Conselho Nacional de Justiça. O CNJ foi informado sobre o procedimento.