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AGU muda de opinião após alegar ao STF que juristas evangélicos não tinham legitimidade para entrar com ação sobre cultos

A Advocacia Geral da União considerou inicialmente que a Associação Nacional de Juristas Evangélicos não tinha legitimidade para apresentar ação. Após decisão de Nunes Marques, ministro André Mendonça alterou o entendimento do órgão

Por Rafael Moraes Moura/BRASÍLIA e Rayssa Motta/SÃO PAULO
Atualização:

Na ação em que o ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), liberou celebrações religiosas presenciais em meio ao pior momento da pandemia do novo coronavírus, a Advocacia Geral da União (AGU) se manifestou inicialmente contra o reconhecimento do pedido. Responsável por defender judicialmente os interesses do Planalto, que se opõe publicamente às medidas restritivas impostas por Estados e municípios, a AGU entendeu que a Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure) não tinha legitimidade para ingressar com a ação. Depois da publicação desta reportagem, o advogado-geral da União, André Mendonça, enviou uma nova manifestação, revendo o entendimento, e se posicionando, agora, a favor da legitimidade da Anajure.

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"Além de heterogênea, a autora não comprovou que sua atuação ocorre em âmbito nacional. Nos termos da jurisprudência dessa Suprema Corte, reputa-se de caráter nacional somente a entidade que demonstre reunir membros ou associados em pelo menos 09 (nove) Estados da Federação", argumentou a AGU em sua primeira manifestação, que não foi assinada por Mendonça.

Templo da Assembleia de Deus, no Rio, sem fieis na pandemia. Foto: Wilson Junior/Estadão

Ao Supremo, a Anajure alegou que a suspensão dos cultos e missas viola o direito fundamental à liberdade religiosa e o princípio da laicidade estatal. A associação questionou decretos de Estados e prefeituras de todo o País que suspenderam a realização de eventos religiosos. Outra crítica feita pela Advocacia Geral da União foi justamente a abrangência do pedido.

"O pedido formulado pela requerente carece de precisão, pois dirige-se, genericamente, a todos os decretos estaduais e municipais que suspendam de forma irrestrita atividades religiosas como medida de contenção da pandemia", escreve a pasta. "A petição inicial da arguição de descumprimento de preceito fundamental deverá indicar o ato questionado. Tal indicação deve ser realizada de forma precisa, a fim de que se possa oportunizar a manifestação dos órgãos responsáveis pela sua edição e, além disso, adstringir os termos da discussão constitucional realizada no processo objetivo", prosseguiu a AGU.

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Após a decisão de Kassio Nunes Marques, Mendonça enviou uma segunda manifestação à Corte. "Considerando o direito fundamental à liberdade de crença, a justificar a excepcionalidade do caso, registro o entendimento deste Advogado-Geral da União pela atribuição de legitimidade ativa à Requerente, na linha do distinguishing deduzido pelo Sr. Ministro Relator em decisão proferida nesta data", escreveu o advogado-geral da União.

Evangélico, Mendonça é considerado um dos favoritos para a vaga que será aberta no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria de Marco Aurélio Mello. O ministro conta com o apoio de juristas evangélicos para chegar ao tribunal.

Liberdade de religião.

Embora tenha levantado questões de ordem técnica para se opor o conhecimento do pedido, a AGU deixou claro que defende a derrubada de todos os decretos ou atos administrativos baixados por governadores e prefeitos para proibir celebrações religiosas na pandemia.

"A restrição total de atividades religiosas, inclusive de transmissões virtuais e sem aglomeração de pessoas, nos moldes impugnados na petição inicial, não atende aos requisitos da proporcionalidade, na medida em que impacta de forma excessiva o direito à liberdade de religião, sem que demonstrada a correlação com os fins buscados e com desprezo de alternativas menos gravosas. Essa circunstância torna-se ainda mais evidente quando se trata de medidas sem delimitação temporal", afirma o órgão.

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Sede da Advocacia-Geral da União (AGU), em Brasília Foto: Leogump Carvalho / Ascom AGU

A pasta já havia se manifestado a favor da liberação das celebrações e da abertura dos templos ao público em outra ação, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, em que o PSD contesta decreto do governo de São Paulo que vetou atividades religiosas coletivas presenciais durante as fases mais restritivas do plano de combate ao coronavírus. Na prática, Kassio se antecipou a Gilmar, que havia indicado que não tomaria uma decisão antes da Páscoa, apesar das manifestações em regime de urgência enviadas pela Procuradoria Geral da República e pela própria AGU.

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Celebrações liberadas

Nunes Marques autorizou as celebrações religiosas em todo o País, desde que sejam adotados protocolos sanitários em igrejas e templos, limitando a presença em cultos e missas a 25% da capacidade do público.

"Reconheço que o momento é de cautela, ante o contexto pandêmico que vivenciamos. Ainda assim, e justamente por vivermos em momentos tão difíceis, mais se faz necessário reconhecer a essencialidade da atividade religiosa, responsável, entre outras funções, por conferir acolhimento e conforto espiritual", escreveu o ministro, que lembrou a importância das celebrações da Páscoa para os cristãos.

Em uma decisão de 16 páginas, o magistrado ainda apontou que diversas atividades essenciais continuam liberadas durante a pandemia. "É importante reconhecer que o transporte coletivo tem sido considerado essencial, a exemplo de mercados e farmácias - que, de fato, o são. Tais atividades podem efetivamente gerar reuniões de pessoas em ambientes ainda menores e sujeitos a um menor grau de controle do que nas igrejas", observou.

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A decisão do ministro está alinhada aos interesses do governo federal, que está em guerra com governadores e prefeitos de todo o País contra toque de recolher, lockdown e outras medidas de distanciamento social. "Nunes Marques concede medida cautelar para o fim de determinar que: estados, DF e municípios se abstenham de editar ou exigir o cumprimento de decretos ou atos administrativos locais que proíbam a realização de celebrações religiosas presenciais", escreveu o presidente Jair Bolsonaro em suas redes sociais.

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