Vídeo viral mostra fibras de tecido em máscara, não vermes nem nanorrobôs

Ao colocar máscara sobre vapor de água fervendo, é possível ver fios pretos se movimentando; são fibras têxteis que se movem pelo processo de transmissão de calor ou pela eletricidade estática

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Por Rocío Sánchez , Tomás Rudich e Newtral.Es
Atualização:

Esta checagem foi publicada originalmente pelo site Newtral.Es, da Espanha, e traduzida por meio da Aliança CoronavirusFacts, coordenada pela Rede Internacional de Checadores de Fatos (IFCN). Leia mais sobre a parceria aqui e veja a verificação original aqui.


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Vídeos viralizaram nas redes sociais com pessoas denunciando o suposto aparecimento de larvas, vermes, parasitas ou bactérias em máscaras cirúrgicas. No entanto, isso é falso.

Esses vídeos questionando o uso de máscaras cirúrgicas têm circulado em diferentes idiomas e foram verificados, por exemplo, pelos checadores ucranianos do Stop Fake, integrantes da International Fact-Checking Network (IFCN). As mensagens tornaram-se uma tendência na Espanha em abril, depois que foram compartilhadas por um rapper e uma influenciadora digital. No Brasil, leitores do Estadão Verifica pediram a checagem desse conteúdo agora em outubro, por WhatsApp -- (11) 97683-7490.

 

Nos vídeos, pessoas colocam máscaras sobre vapor de água quente e é possível ver uma espécie de fio preto, que dizem ser uma larva ou um verme, movendo-se sob a superfície interna do equipamento de proteção. Estas imagens são gravadas com o zoom da câmera do celular.

Entretanto, não há evidências científicas de que as filmagens mostrem larvas, parasitas, vermes, bactérias ou qualquer outro organismo vivo. De acordo com os diferentes especialistas consultados pelo Newtral.es, as imagens mostram vestígios de fibra têxtil preta, do próprio tecido da máscara. E o movimento observado pode ser devido à convecção (processo de transmissão de calor) ou eletricidade estática.

O que você vê nos vídeos: fibras de máscara movendo-se por convecção ou eletricidade estática

O diretor do Instituto de Pesquisa Têxtil de Terassa, na Espanha, Enric Carrera Gallissà, disse ao Newtral.es que "não são larvas, vermes ou parasitas, mas sim uma fibra preta que foi parar no tecido devido à contaminação têxtil cruzada". O especialista do instituto da Universidade Politécnica da Catalunha explica que "o movimento da fibra preta pode ser por convecção ou por eletricidade estática".

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O pesquisador José María Lagarón, do Instituto de Agroquímica e Tecnologia de Alimentos (IATA), também na Espanha, concorda que estes são "resíduos de fibras pretas que acabaram no tecido".

"Tenho analisado o vídeo com meus colegas microbiologistas e não é uma bactéria, não parece um organismo vivo por causa do tipo de movimento. A coisa mais próxima seria um nematódeo parasita, mas seria necessário mais ampliação para poder vê-los", explica Lagarón, que desenvolveu as máscaras adotadas pelo Conselho Nacional de Pesquisa da Espanha (CSIC).

"Acreditamos que são simplesmente resíduos de fibras pretas que acabaram no tecido, devido à contaminação têxtil cruzada, e um deles se move um pouco por convecção", acrescenta ele. Em outras palavras, "(a fibra) pode ser movida por uma corrente de ar (o ar quente sobe e o frio desce) e essa convecção pode causar o movimento que pode ser visto no fio, se ele estiver solto de um lado".

Lagarón emite a mesma opinião nesta verificação do Verifica RTVE e acrescenta que o movimento também pode ser devido à eletricidade estática.

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"Todas as máscaras prendem partículas finas por cargas eletrostáticas, elas têm um filtro eletrostático. Todas, exceto as máscaras de nanofibras que desenvolvemos, que atuam por filtragem mecânica", disse ele à checagem do Newtral.es. "É possível que as cargas também possam atrair pedaços de fio solto, por eletricidade estática do atrito da superfície do tecido ou da embalagem plástica".

Lagarón comenta ainda a possibilidade de contaminação têxtil. "Também é possível que as máscaras tenham se impregnado com os fios pretos ao passar pelas linhas de laminação ou fabricação. Muitas empresas fabricam tecidos e máscaras multicoloridos".

Não há evidências científicas de que existam larvas ou outros organismos vivos nas máscaras

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O entomologista do Centro Nacional de Microbiologia (CNM) da Espanha Ricardo Molina considera que esta é "uma das muitas fake news pseudocientíficas que infelizmente estão se proliferando cada vez mais em todos os cantos do planeta".

"Neste caso específico, não há informações confiáveis que nos tenham chegado por meio canais científicos, portanto não podemos acrescentar nada", explicou ao Newtral.es.

Álvaro Blanco, vice-diretor do Instituto de Ciência de Materiais de Madri (ICMM), que pertence ao CSIC, se expressa na mesma linha. "Para mim, parecem de fato fibras têxteis da própria máscara. Para descobrir se são larvas ou qualquer outro ser vivo -- o que eu duvido -- seria trivial com um estudo rudimentar", disse Blanco ao Newtral.es.

O cientista acrescenta que considera o vídeo "uma farsa total". Entretanto, ele esclarece que essa não é "uma opinião profissional ou científica" e sim uma consideração pessoal, pois Blanco não sabe como as pessoas nos vídeos utilizaram as máscaras.

A professora Esther Gómez Cordero, enfermeira do Hospital Universitário da Paz, fez um experimento semelhante e utilizou um microscópio digital para mostrar que não há larvas ou vermes nas máscaras, e sim fibras.

Em resumo, não há evidência científica de que os vídeos viralizados mostrem larvas, vermes, parasitas ou qualquer organismo vivo nas máscaras cirúrgicas. Os diferentes especialistas que consultamos explicam que os fios mostrados nos vídeos são fibras que acabaram no tecido das máscaras e que os movimentos são produzidos por convecção ou eletricidade estática.

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