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Autores de impeachment dizem que vetar fundo eleitoral não é crime de responsabilidade

Bolsonaro tem sinalizado que deve aprovar verba pública de R$ 2 bilhões para campanhas políticas para não contrariar lei orçamentária

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Por Alessandra Monnerat
Atualização:

Os autores do pedido de impeachment contra Dilma Rousseff (PT) disseram nesta sexta-feira, 3, que o presidente Jair Bolsonaro não incorreria em crime de responsabilidade se vetasse o fundo eleitoral de R$ 2 bilhões. Bolsonaro tem argumentado, em entrevistas à imprensa e em publicações nas redes sociais, que um veto à verba para financiar campanhas políticas poderia resultar em um processo de impeachment. Não é a opinião do jurista Miguel Reale Jr. “Isso é desculpa esfarrapada”, disse ele ao Estado. “Gostaria de conhecer alguém que conseguisse montar um pedido de impeachment com base nisso”.

De acordo com Reale Jr., é uma prerrogativa do presidente da República vetar ou sancionar leis aprovadas pelo Congresso Nacional. “Não vejo nenhum crime de responsabilidade. (Bolsonaro) já vetou tantas coisas antes. O veto é um exercício legítimo da Presidência da República", comentou o jurista. "Ele está encontrando uma desculpa junto ao seu eleitorado para não vetar. Ele não quer vetar, se ele quisesse ele vetava".

O presidente Jair Bolsonaro, em frente ao Palácio da Alvorada, em Brasília Foto: Eraldo Peres/AP

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A deputada estadual Janaína Paschoal (PSL), coautora do pedido de impeachment, publicou nesta sexta em seu Twitter argumentos parecidos com os de Reale Jr. Segundo ela, não há como encaixar o veto ao fundão na lei 1.079/50, que tipifica crimes de responsabilidade. 

“Se eu entendi bem, disseram para o Presidente que o crime estaria em atentar contra o orçamento”, escreveu ela. “No entanto, eu não penso que o Presidente tenha inventado essa desculpa. (...) Creio que alguém (em quem ele confia) disse isso para ele. O Presidente funciona muito assim. Ele adota oráculos”. 

Na quinta-feira, 2, Bolsonaro sinalizou à imprensa que sancionaria o fundo eleitoral de R$ 2 bilhões. "O fundo eleitoral é uma lei. O que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) fez? Oficiou a receita no valor, o montante, de 2 bilhões de reais. Então veto ou sanção é uma obediência à lei. Se você for ler o artigo 85 da Constituição, se eu não respeitar a lei, eu estou em curso do crime de responsabilidade", disse.

Nas redes sociais, o presidente perguntou a seus seguidores se deveria vetar o fundo eleitoral e passar por impeachment ou sancionar a medida. Ele voltou a citar o artigo 85 da Constituição para dizer que vetar o fundo seria atentar contra o Orçamento, o que configura crime de responsabilidade.

Outros especialistas em direito público consultados pelo Estado ecoaram as opiniões de Reale Jr. e Janaína. “Se fosse uma matéria sobre a qual ele não tem a possibilidade de veto, a lei sequer seria encaminhada pra ele”, apontou o professor de Direito Penal da FGV-SP e da Uerj Davi Tangerino.

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O advogado Saulo Stefanone Alle, da Peixoto & Cury Advogados, lembrou que o presidente pode vetar leis que contrariam o interesse público ou a Constituição. “O veto pode ser derrubado pelo Congresso. É tecnicamente muito discutível a hipótese de impeachment”, analisou. 

Esse ponto de vista não é um consenso. O presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Eduardo Damian, disse na quinta-feira que o veto a um projeto que complementa a lei já existente “não seria razoável e prudente” e poderia “ensejar futura responsabilização”.

O jurista Adib Kassouf Sad, especialista em direito administrativo e professor da CEU - Law School em São Paulo, também entende que o argumento exposto por Bolsonaro é válido. De acordo com ele, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) definiu um valor mínimo para o fundo com parâmetros fixados em lei. Esse número foi enviado para o governo federal, que incluiu a verba no Orçamento — e seguiu para aprovação no Congresso. O presidente só poderia vetar o fundo se os parlamentares tivessem aumentado o valor do fundo.

“Nesse caso, ele poderia vetar, porque seria um aumento de despesa sem iniciativa do Executivo, teria um vício de iniciativa. Ele teria soluções para o veto”, disse. “O fato é que, respeitando o limite do TSE e respeitando a lei orçamentária, o presidente tem que sim cumprir essa lei”.