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Alckmin sai com promessas em atraso

Pré-candidato, tucano deixa o Bandeirantes após 7 anos e 3 meses consecutivos no cargo; propostas de 2010 não tiveram metas atingidas

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Por Adriana Ferraz
Atualização:

Pré-candidato à Presidência da República pelo PSDB, Geraldo Alckmin renunciou ao governo de São Paulo após sete anos e três meses consecutivos no cargo – no total foram mais de 13 –, sem cumprir promessas feitas ainda na campanha de 2010. Os cronogramas anunciados de obras revelam atrasos mesmo nos projetos considerados vitrines e que a partir de agora vão virar bandeira eleitoral, como a expansão do metrô na capital, a produção de vacinas para combater a dengue em todo o Brasil e a conclusão do Rodoanel.

Governador Geraldo Alckmin inaugurou neste sábado, 31, linha de trem até o aeroporto de Guarulhos. Obra havia sido prometida para a Copa do Mundo de 2014 Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO

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Nos últimas semanas, o governo Alckmin passou a veicular anúncios publicitários que sinalizam a estratégia de usar programas desenvolvidos em São Paulo como soluções para demais Estados brasileiros, especialmente nas áreas de mobilidade, segurança pública, educação, saúde e geração de empregos a partir de projetos com a iniciativa privada.

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Porém, a demora na conclusão de linhas de metrô e do Rodoanel, por exemplo, deixou as obras mais caras e postergou o acesso da população a serviços que já deveriam estar sendo prestados. Prometido ainda pelo ex-governador Mário Covas, o Rodoanel é o projeto mais antigo do PSDB em São Paulo. No comando do Estado há quase 24 anos (com só uma interrupção de nove meses em 2006), o partido sai do Palácio dos Bandeirantes sem concluir a obra, que ao longo dos anos ficou 168% mais cara.

Os números do metrô também crescem a passos lentos. Na campanha de 2010, Alckmin havia prometido construir 30 km em 4 anos, extensão que ele não vai conseguir entregar em quase dois mandatos inteiros. Quando assumiu em 2011, a rede tinha 68,3 km e agora, cerca de 89,8 km. A previsão é que ao final de 2018, chegue a 102,4 km, ou seja, uma ampliação de 34,1 km, mas em oito anos. 

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Segurança hídrica. Na área de saneamento, o tucano foi mais bem sucedido no que diz respeito ao abastecimento de água. Após ter enfrentado uma grave crise de abastecimento na Grande São Paulo entre 2014 e 2015, com racionamento velado, Alckmin entregou, mesmo com atraso, duas grandes obras que aumentam a segurança hídrica na Região Metropolitana: o Sistema São Lourenço e a transposição de água do Paraíba do Sul para o Sistema Cantareira. 

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O tema ‘água’ é prioritário para o tucano no Nordeste, que historicamente enfrenta seca e racionamento. Para atrair voto na região, Alckmin já se declarou favorável à realização, pelo governo federal, de outra transposição, a do Rio Tocantins. E, com o intuito de se projetar para fora dos limites paulistas, emprestou, via Sabesp, bombas para captar água em reservatórios com nível baixo, o chamado volume morto. A ação contemplou Paraíba, Pernambuco, Ceará e Distrito Federal. 

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Mas quando o balanço é sobre coleta e tratamento de esgoto, os dados não revelam significativa evolução. Em 2011, o índice de coleta de esgoto da Sabesp era de 81% e o tratamento de 75%. Após oito anos, a coleta subiu ligeiramente para 83% e o tratamento ficou estagnado.

Ajuste. Se o balanço fiscal de seus últimos dois mandatos colocam o Estado numa posição privilegiada em relação ao resto do País, com registro anual de superávit e manutenção dos investimentos mesmo no período de crise (com oscilações), a política de reajuste ao funcionalismo público é um dos gargalos da gestão. Mesmo fechando todos os anos com dinheiro em caixa, o tucano segue pagando a um policial que ingressa na PM um salário base de R$ 3 mil.

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Após o Estado ter conseguido reduzir a taxa de homicídios à menor do Brasil, a segurança pública talvez seja hoje a principal bandeira de Alckmin. Atualmente são 7,4 casos para cada grupo de 100 mil habitantes. No Sergipe, esse índice é de 64 e em Miami, de 12. A violência no Estado, no entanto, ainda preocupa, segundo o pesquisador Bruno Paes Manso, do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP). “É inegável que existem questões positivas, já que raras vezes foram vistas quedas de homicídio como a que aconteceu em São Paulo. Mas não podemos fechar os olhos para alguns efeitos colaterais: São Paulo tem a maior facção da história brasileira e que hoje transcende fronteiras”, afirmou, referindo-se ao PCC. 

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Também foi sob Alckmin que o Estado atingiu recorde no nível de roubos: em 2016, 323,2 mil foram registrados, o equivalente a 884 por dia. Apesar da queda em 2017, o patamar desse tipo de crime ainda se mostra mais elevado do que na década passada, e é em parte puxado pelas ocorrências envolvendo celulares. 

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Educação e saúde. Após 13 anos não consecutivos no comando do Estado, dados do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) apontam que, embora a rede tenha avançado nos anos iniciais do ensino fundamental, há uma estagnação no ensino médio registrada na gestão Alckmin, além de dificuldades orçamentárias para custear as universidades públicas paulistas, como a USP.

"Talvez as políticas educacionais não se constituam no elemento central dos debates que teremos com vistas às eleições presidenciais. Contudo, um dos postulantes ao cargo, o atual governador de São Paulo, poderia ser indagado: como uma política educacional que se tornou o carro-chefe do tucanato não apresentou em seu estado nada do que se prometeu há praticamente dez anos?", questiona o professor da Faculdade de Educação da USP Ocimar Alavarse. Ele ressaltava que houve uma oportunidade histórica de alavancar os índices educacionais no Estado, com a diminuição em torno de 20% do total de alunos nos ensinos fundamental e médio nos últimos anos, garantindo mais recursos.

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Na saúde, a gestão Alckmin conseguiu aumentar o acesso à assistência por meio da entrega de 48 novos serviços nos últimos sete anos e da criação de programas como o Mulheres de Peito, que oferece mamografias sem a necessidade de encaminhamento médico.  A promessa na área que mais interessava a Alckmin para usar como bandeira, porém, a produção de uma vacina contra a dengue, está atrasada. Todo o processo deveria ficar pronto neste ano, mas os estudos do Instituto Butantã ainda não foram finalizados.

De acordo com o secretário da Saúde de Alckmin, David Uip, as pesquisas prosseguem, mas atrasaram porque, nos últimos anos, o número de casos da doença caiu drasticamente. Sem a circulação maciça do vírus, fica mais difícil testar a imunidade dos participantes da pesquisa, observou Uip.

Crise econômica. Alckmin ressaltou nos últimos dias de seu governo que os atrasos citados na conclusão de obras se devem à crise econômica enfrentada no Brasil desde 2014. Segundo o governador, apesar da queda registrada na receita – mais de R$ 30 bilhões de lá pra cá –, São Paulo foi um dos poucos Estados a manter investimentos e alcançar superávit primário anual. 

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Na comparação com o restante do País, o tucano costuma dizer que os resultados de São Paulo indicam que seu governo tem o que mostrar e como resolver boa parte das demandas nacionais.

Em seu discurso de despedida, na sexta-feira, Alckmin afirmou ter a convicção de ter realizado muito mais do que prometeu e que se não fez ainda mais não foi por falta de esforço pessoal, dedicação e empenho. “Ainda mais porque atravessamos a maior crise que o Brasil enfrentou nas últimas décadas. Governamos com realismo, serenidade e de maneira austera, o que é motivo de orgulho.” Austeridade passará a ser uma das palavras de ordem para Alckmin, que quer mostrar ao País que sabe lidar com a crise sem atrasar salários, sem deixar as contas no vermelho e ainda investindo em novas obras. “Agora, vou me apresentar ao eleitorado brasileiro”, disse antes de deixar o posto de governador. / COLABORARAM FABIANA CAMBRICOLI, FABIO LEITE, LUIZ FERNANDO TOLEDO e MARCO ANTONIO CARVALHO

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