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Servidores demitidos por Salles após ação contra garimpo relatam pressão do governo: 'ficou insustentável'

Renê Oliveira e Hugo Loss prestaram depoimento ao Ministério Público Federal e afirmam que operações de fiscalização contra crimes ambientais provocaram reação do governo e exoneração de diretor do Ibama

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Por Rayssa Motta e Paulo Roberto Netto
Atualização:

Dois servidores demitidos pelo ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles após ação contra garimpeiros na Amazônia relataram ao Ministério Público Federal ter sofrido pressões do governo Bolsonaro em operações contra crimes ambientais. As oitivas foram prestadas e embasaram a ação que pede o afastamento de Salles da pasta por 'desestruturação dolosa' da proteção ambiental.

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Renê Oliveira e Hugo Loss participaram de ação que estourou garimpo ilegal em terras indígenas em Altamira (PA), em março deste ano. A ação ganhou notoriedade devido à queima de máquinas usadas por garimpeiros - ação prevista em lei. As imagens foram divulgadas no Fantástico, da TV Globo, no início de abril. Segundo eles, o diretor de Proteção Ambiental do Ibama, Olivaldi Azevedo, foi chamado pelo Ministério do Meio Ambiente para uma reunião em Brasília no dia seguinte à reportagem.

A destruição de máquinas de garimpeiros é uma operação que desagrada o presidente Jair Bolsonaro, que já se manifestou contra a queima dos equipamentos apreendidos. Uma mensagem divulgada sem querer por Bolsonaro mostra que o Planalto cobrou satisfações sobre a queima das máquinas de garimpeiros, incluindo do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. O presidente queria saber se a Força Nacional estava envolvida na história.

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O presidente Jair Bolsonaro e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles durante cerimônia no Palácio do Planalto. Foto: Adriano Machado / Reuters

"O Olivaldi entrou em contato comigo para avisar que tinha sido chamado no Ministério e que, dependendo da situação, depois gostaria de falar comigo. Respondi que estava à disposição. Aí ele me ligou, por volta das 17h30 - 18h e pediu para nos encontrarmos", relatou Oliveira. "Fomos lá no Ibama e recebi a informação dele assim, sem muitos detalhes: 'a coisa ficou insustentável, estou saindo, fui exonerado, tive uma reunião agora no Ministério'".

Oliveira afirmou que preferia ser demitido a continuar 'numa situação dessas'. "Depois fiquei sabendo informalmente que independentemente do meu interesse me ficar, eu e o Hugo seríamos exonerados. Por isso que eu escrevi a mensagem pro Hugo que 'o gato tinha subido no telhado'.

A exoneração dos servidores é apontada pela Procuradoria como um dos 'atos, discursos e omissões' de Salles à frente do Meio Ambiente.

 

Pressão. Os servidores relatam que perceberam 'uma movimentação muito grande' dos envolvidos nos ilícitos que estavam sendo apurados em operações de fiscalização 'junto ao Ministério do Meio Ambiente e à Presidência da República'. "A gente não sabia se essa movimentação era pela nossa saída, pela paralisação das operações. Não sabíamos. Mas isso atrapalhou bastante. Começamos a ficar receosos e tivemos que blindar as operações" afirma Oliveira.

As ações de fiscalização, contam, passaram a receber questionamentos. "A Força Nacional, que atuava com a gente, começou a receber questionamentos, e falavam para a ente 'ó, o cara está perguntando o que que está acontecendo, qual que é o plano, o que vocês estão fazendo aqui?'", afirmam. "A gente que tá no campo não sabe muito bem o que está acontecendo fora, mas a gente sabe que eles estão se mexendo, eles estão agindo politicamente".

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De acordo com Loss e Oliveira, em 22 de abril, vários chefes e superintendentes do Ibama enviaram uma carta à Presidência questionando sobre a destruição do maquinário de garimpeiros. O ofício foi elaborado após Bolsonaro participar de um vídeo com o senador Marcos Rogério, no qual o presidente afirma que a orientação do governo é para os fiscais não colocarem fogo em equipamento de garimpeiros.

 

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"A gente sabia desses boatos de que queriam paralisar as operações pela imprensa. Dentro do Ibama, a gente questionava se isso procedia mas não obtínhamos nenhuma informação", relatou Loss.

O MPF acusa Salles de cometer improbidade administrativa em série de atos, omissões e discursos que caracterizariam conduta intencional 'com o objetivo de fragilizar a atuação estatal na proteção do meio ambiente' e favorecer 'interesses que não têm qualquer relação com a finalidade da pasta'. À Justiça, doze procuradores pedem que o ministro seja afastado do cargo imediatamente.

Em nota, Salles classificou como 'tentativa de interferir em políticas públicas' o pedido de afastamento. "A ação de um grupo de procuradores traz posições com evidente viés político-ideológico em clara tentativa de interferir em políticas públicas do Governo Federal", afirmou. "As alegações são um apanhado de diversos outros processos já apreciados e negados pelo Poder Judiciário, uma vez que seus argumentos são improcedentes".

COM A PALAVRA, O MINISTRO RICARDO SALLES "A ação de um grupo de procuradores traz posições com evidente viés político-ideológico em clara tentativa de interferir em políticas públicas do Governo Federal. As alegações são um apanhado de diversos outros processos já apreciados e negados pelo Poder Judiciário, uma vez que seus argumentos são improcedentes.

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