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Procuradoria abre investigação e cobra justificativas do Ministério da Saúde sobre atraso e omissão de dados da covid-19

Ministério Público Federal instaurou notícia de fato e cobrou atos administrativos do Ministério da Saúde que levaram ao sumiço de informações sobre o avanço da doença no País

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Por Paulo Roberto Netto
Atualização:

O Ministério Público Federal abriu procedimento extrajudicial para apurar o atraso e a omissão na divulgação de dados sobre o novo coronavírus no País. A Procuradoria enviou pedido de cópia dos atos administrativos do Ministério da Saúde que resultaram nas mudanças promovidas pelo governo e cobrou esclarecimentos sobre os fundamentos técnicos sobre o caso.

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Desde o boletim de sexta, 6, o governo federal deixou de apresentar o número acumulado de mortes por covid-19 desde o início da pandemia, informação que sumiu do site oficial sobre a doença. Os balanços também passaram a ser publicados às 22h.

O Ministério Público Federal também quer saber 'qual foi a urgência' que motivou a retirada imediata do número de mortos do painel de vítimas do Covid-19 e por qual motivo técnico se faz necessária a revisão dos óbitos pela doença.

Os pedidos foram encaminhados ao ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, com prazo de resposta em até 72 horas.

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A notícia de fato é assinada pelos procuradores Célia Regina Souza Delgado e Edilson Vitorelli Diniz Lima, da Câmara de Direitos Sociais e Fiscalização de Atos Administrativos. Nesta etapa, a Procuradoria realiza apurações após notar indícios de atos ilícitos. Ao abrir o procedimento, os procuradores destacaram trechos da Lei de Acesso à Informação (LAI) sobre a obrigação de transparência sobre dados públicos e as punições a omissão, e a lei sobre improbidade administrativa.

A investigação da Procuradoria ocorre paralela a pedido da Defensoria Pública da União, que foi à Justiça Federal de São Paulo para obrigar o governo a apresentar os dados. Em outra frente, parlamentares da oposição ouvidos pela reportagem do Estadão planejam entrar com ações no Supremo Tribunal Federal para garantir a transparência das informações da pandemia.

A omissão dos dados sobre mortos no novo coronavírus se deve, segundo o governo, porque eles 'não retratam o momento do País'. A estratégia do Planalto é divulgar somente os números do dia, ignorando o acumulado desde o início da pandemia. "A divulgação dos dados de 24 horas permite acompanhar a realidade do país neste momento e definir estratégias adequadas para o atendimento a população. A curva de casos mostram as situações como as cenários mais críticos, as reversões de quadros e a necessidade para preparação", disse o presidente Jair Bolsonaro no sábado, 6.

O ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello. Foto: Alan Santos/PR Por três vezes nessa semana o Ministério da Saúde retardou a apresentação de balanços diários da pandemia, que costumavam sair por volta das 16h. O informe de sexta foi divulgado às 22h e omitiu o número total de mortos no País desde fevereiro, quando foram registrados os primeiros casos da doença. A ação foi admitida pelo próprio presidente, que disse na porta do Alvorada que 'acabou a matéria no Jornal Nacional'. No sábado, o Ministério da Saúde passou a restringir as informações disponíveis na página online que mantém para incluir informações sobre a Covid. Depois de ficar fora do ar por um dia, o site https://covid.saude.gov.br/ exibe agora apenas as números de casos de pessoas recuperadas, novas contaminações e os óbitos. Todas as demais informações sobre o histórico da doença e dados acumulados foram omitidas. Na manhã de ontem, Bolsonaro tentou justificar a ausência dos números alegando que eles 'não retratam o momento do País'. "A divulgação dos dados de 24 horas permite acompanhar a realidade do país neste momento e definir estratégias adequadas para o atendimento a população. A curva de casos mostram as situações como as cenários mais críticos, as reversões de quadros e a necessidade para preparação", disse. Em um cenário de sub-notificação reconhecido pelo próprio Ministério da Saúde, que identifica ao menos 4 mil mortes suspeitas por Covid-19, Carlos Wizard, indicado para a secretária de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, disse ao jornal O Globo que a pasta irá recontar o número de mortos porque os dados seriam 'fantasiosos ou manipulados'. Ao Estadão, Wizard afirmou que o governo não planeja 'desenterrar mortos', e sim 'rever critérios' dessas mortes. Segundo ele, Estados e municípios estariam inflando o número de óbitos para obter benefícios federais. A informação teria sido repassada por uma 'equipe de inteligência militar' do Ministério da Saúde. A tentativa de minimizar os dados de óbitos por covid nas divulgações oficiais do governo tem sido recorrente desde que o País passou a registrar recordes negativos da doença. Em 29 de abril, quando o Brasil atingiu a marca de 5 mil mortos pela doença, o governo criou o 'Placar da Vida'. A iniciativa da Secom enaltecia os brasileiros 'recuperados' e 'salvos', classificando aqueles que foram diagnósticos como 'em tratamento'. O último 'Placar da Vida' foi publicado no dia 3 de junho e apontava 584 mil casos confirmados da doença no País. No dia, o Brasil confirmava 1.349 mortes por coronavírus em 24 horas, levando o total para mais de 32 mil óbitos. Esses números não foram noticiados no placar do governo.

Além do boletim, o site com os números de covid-19 no Brasil ficou fora do ar durante a noite de sexta até o final da tarde deste sábado, 6. Procurado, o Ministério da Saúde não informou a razão até o fechamento deste texto. A página exibiu apenas que estava em manutenção. Agora, o site não exibe mais os dados acumulados, divisões por Estado e até a possibilidade de download das informações.

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O indicado para a secretária de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Carlos Wizard, afirmou que Estados e municípios estariam inflando o número de óbitos para obter benefícios fiscais, mas não apresentou nenhum embasamento sobre isso. Segundo ele, a informação teria sido repassada por uma 'equipe de inteligência militar' do Ministério da Saúde. Ao Estadão, Wizard negou que o Planalto esteja querendo 'desenterrar mortos' ao revisar critérios sobre óbitos por covid-19.

A iniciativa foi criticada pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde, que enxergou uma tentativa 'autoritária, insensível, desumana e anti-ética' de dar inviabilidade aos mortos pelo coronavírus'. "Não prosperará. Nós e a sociedade brasileira não os esqueceremos e tampouco a tragédia que se abate sobre a nação", disse o presidente da entidade, Alberto Beltrame.

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