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De 'sugestão de fonte' contra filho de Lula a pedidos de movimentação em processos: leia todas as mensagens entre Moro e Deltan obtidas pelo ex-presidente

Ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, que garantiu à defesa do petista a íntegra do material, levantou o sigilo das conversas

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Foto do author Pepita Ortega
Por Rayssa Motta , Pepita Ortega , Fausto Macedo/SÃO PAULO e Rafael Moraes Moura/BRASÍLIA
Atualização:

A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), condenado no âmbito da Operação Lava Jato, teve acesso às mensagens obtidas na Operação Spoofing - investigação que mirou o grupo de hackers que invadiu celulares de autoridades, atingindo o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro e procuradores da força-tarefa em Curitiba.

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Parte das conversas havia sido revelada na semana passada, mas o restante do conteúdo ficou em sigilo por determinação do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), responsável por determinar o compartilhamento. Nesta segunda-feira, 1º, o relator tornou o material público. Trata-se de uma perícia de 50 páginas feita nas mensagens atribuídas ao ex-juiz da Lava Jato e ao ex-coordenador da força-tarefa no Paraná, Deltan Dallagnol.

 

Os advogados de Lula pretendem usar as novas mensagens para reforçar as acusações de que Moro agiu com parcialidade e encarou o petista como 'inimigo' ao condená-lo a nove anos e meio de prisão no caso do triplex do Guarujá. Antes isso, em março de 2016, quando foi alvo da Operação Aletheia, 24ª fase da Lava Jato, o ex-presidente chegou a ser conduzido coercitivamente para interrogatório em uma sala no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo.

Nas conversas, o então juiz chega a cobrar manifestações em processos e a sugerir uma fonte para os procuradores conversarem sobre investigações envolvendo o filho do ex-presidente. Também comunica sobre despachos que serão lançados por ele.

 

Veja algumas conversas:

Gebran

Em um dos diálogos, juiz e procurador conversam sobre o acordo de colaboração premiada do ex-presidente do Conselho de Administração da empreiteira Camargo Corrêa, João Ricardo Auler. Na conversa, em 5 de fevereiro de 2016, Deltan diz a Moro que o desembargador João Pedro Gebran Neto, relator da Operação Lava Jato no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), entendeu que 'não seria o caso' de homologar o acordo no tribunal por não haver investigados com direito ao foro por prerrogativa de função.

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"Tecnicamente, vejo vantagens pragmáticas de homologar por aqui, mas não quisemos avançar sem sua concordância quanto à análise dessa questão por aqui... Podemos prosseguir? Se preferir, vou à JF conversar pessoalmente", escreve Deltan a Moro.

 

'Por mim podem ficar mais tempo'

Em 10 de dezembro de 2015, Moro questiona o então coordenador da Lava Jato sobre o acordo de colaboração com executivos da empreiteira Andrade Gutierrez e o prazo para soltura dos delatores.

"Até onde sei, aguarda assinatura pelo PGR. Se precisar que confirme com absoluta segurança, vou atrás, mas até alguns dias era isso", responde Deltan.

"Não tem necessidade. Achei que acordo envolvia soltura antes do recesso. Não que eu esteja preocupado. Por mim podem ficar mais tempo", escreve o então juiz da operação.

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Cobranças

Uma semana depois, em 17 de dezembro de 2015, Moro procura novamente Deltan. Na mensagem, cobra do então coordenador da Lava Jato em Curitiba manifestação contra a revogação da prisão preventiva do pecuarista José Carlos Bumlai. "Preciso manifestação MPF no pedido de revogação da preventiva do bmlai ate amanhã meio dia", escreve.

Esta não foi a única vez que o juiz pediu que a força-tarefa formalizasse pedidos em processos da Lava Jato. Nos documentos reunidos pela perícia, em outras duas ocasiões Moro faz cobranças parecidas.

"Preciso manifestação do MP nº 504615954. Simples", escreve o ex-juiz em setembro de 2016.

"Providenciaremos", responde Deltan, que minutos depois informa: "Sendo protocolado".

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E, novamente, em 19 maio de 2017: "Preciso de manifestação do MPF quanto a testemunhas no 501560857 com certa urgência".

"Vai hoje nossa manifestação", garante Deltan.

Fonte contra filho do ex-presidente 

Em 7 de dezembro de 2015, Sérgio Moro procura Deltan Dallagnol para passar ao procurador a dica de duas testemunhas que teriam informações relevantes sobre negócios um dos filhos do ex-presidente Lula.

"Então. Seguinte. Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodado por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex-Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou entao repassando. A fonte é seria", escreveu Moro.

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Seguindo a orientação do juiz, Dallagnol diz ter procurado uma das fontes, que teria se recusado a colaborar. Em resposta a Moro, o procurador chega a sugerir forjar uma denúncia anônima para justificar a intimação.

"Liguei e ele arriou. Disse que não tem nada a falar etc... quando dei uma pressionada, desligou na minha cara... Estou pensando em fazer uma intimação oficial até, com base em notícia apócrifa", respondeu.

 

Nomeação de Lula 

Em março de 2016, a pedido do procurador Deltan Dallagnol, Moro levanta o sigilo de relatórios da Polícia Federal envolvendo bens do ex-presidente Lula. Na época, a então presidente Dilma Rousseff (PT) combinava a nomeação do correligionário e antecessor como ministro chefe da Casa Civil.

"Temos receio da nomeação de Lula sair na segunda e não podermos mais levantar o sigilo", escreve Deltan.

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"Bem já despachei para levantar. Mas não vou liberar chave por aqui para não me expor. Fica a responsabilidade de vocês. Meu receio são novas polemicas agora e que isto também reverta negativamente. Mas pode ser que não", responde Moro.

 

COM A PALAVRA, SERGIO MORO

Sobre supostas mensagens eletrônicas divulgadas por decisão do Ministro Ricardo Lewandoswki, do STF:

I - As referidas mensagens, se verdadeiras, teriam sido obtidas por meios criminosos, por hackers, de celulares de Procuradores da República, sendo, portanto, de se lamentar a sua utilização para qualquer propósito, ignorando a origem ilícita;

II - Não reconheço a autenticidade das referidas mensagens, pois como já afirmei anteriormente não guardo mensagens de anos atrás;

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III - Todos os processos julgados na Lava Jato foram decididos com correção e imparcialidade, tendo havido inclusive indeferimentos de vários pedidos da PF e do MPF e diversas absolvições (21% dos acusados foram absolvidos), com a grande maioria das condenações, inclusive do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mantidas pelas Cortes de Apelação e Tribunais Superiores;

IV - Nenhuma das supostas mensagens retrata fraude processual, incriminação indevida de algum inocente, antecipação de julgamento, qualquer ato ilegal ou reprovável ou mesmo conluio para incriminar alguém ou para qualquer finalidade ilegal;

V - Interações entre juízes, procuradores e advogados são comuns em nossa praxe jurídica, não havendo nada de ilícito, por exemplo, em perguntar sobre conteúdo de denúncia, na solicitação para manifestação com urgência em processos, inclusive para decidir sobre pedidos de liberdade provisória, ou no encaminhamento de notícia de crime ao MPF;

VI - O Ministro Edson Fachin, Relator da Lava Jato no STF, já submeteu ao Plenário a questão da admissão ou não das mensagens obtidas por meios criminosos nos processos (HC 174.398).

Curitiba, 01 de fevereiro de 2021.

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Sergio Fernando Moro

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