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Ao mandar suspender ação do E$quema S, Gilmar aponta 'dúvida razoável' sobre envolvimento de ministros do STJ e TCU

Decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal travou processos abertos na esteira das investigações da Lava Jato sobre desvios no Sistema S do Rio até que a Corte determine qual instância será responsável por julgar o caso; mais de 20 advogados foram denunciados, incluindo Frederick Wassef, ligado à família Bolsonaro, e Cristiano Martins Zanin, defensor do ex-presidente Lula

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Por Rayssa Motta
Atualização:

Na decisão em que mandou suspender as ações penais contra todos os 30 denunciados pela Lava Jato na Operação E$quema S, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), colocou sob suspeita autoridades citadas no caso.

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"Vislumbra-se uma situação de dúvida razoável sobre a real condição dessas autoridades, Ministros do STJ e do TCU", escreveu Gilmar.

A hipótese de participação das autoridades judiciárias, com direito ao foro por prerrogativa de função, no suposto esquema que teria desviado mais de R$150 milhões do Sistema S fluminense (Sesc-RJ, Senac-RJ e Fecomércio-RJ) acende a discussão sobre qual instância deve julgar e processar o caso.

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O ministro do STF, Gilmar Mendes. Foto: Nelson Jr / SCO-STF

A operação foi deflagrada por ordem do juiz Marcelo Bretas, 7ª Vara Federal Criminal do Rio, que acolheu a primeira denúncia apresentada pela Lava Jato Rio e abriu ação penal contra 26 investigados. Dias depois, a força-tarefa denunciou outras quatro pessoas no caso e a juíza substituta Caroline Vieira Figueiredo, também da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, os colocou no banco dos réus. Ao todo, 26 advogados são alvos dos processos, incluindo Frederick Wassef, ligado à família Bolsonaro, Cristiano Martins Zanin, defensor do ex-presidente Lula, e Ana Tereza Basilio, que representa o governador afastado do Rio Wilson Witzel.

Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) foi a primeira a acusar o Ministério Público Federal no Rio de empreender um 'malabarismo jurídico' na tentativa de manter o caso correndo na primeira instância - a despeito da suspeita de envolvimento das autoridades.

"A investida contra o exercício da advocacia e suas prerrogativas tornou-se o caminho mais apropriado, inclusive porque, para além de permitir a manipulação dos fatos para atrair a invocação de tipos penais em tese perpetrados apenas por agentes privados (exploração de prestígio e tráfico de influência), possibilitou aos investigadores/acusadores a adoção de medidas constritivas voltadas a afastar de forma ilegal e abusiva a inviolabilidade dos escritórios de advocacia", sustenta a entidade.

Tráfico de influência, estelionato, lavagem, peculato, corrupção e exploração de prestígio: entenda as acusações da Lava Jato a advogados por desvios de R$ 151 mi do Sistema S Rio

O ponto de partida das apurações foi a delação premiada do ex-presidente da Federação do Comércio do Rio, Orlando Diniz, firmada depois que ele foi preso na Operação Jabuti. Em depoimento, o empresário contou que buscava 'comprar uma solução política' e se 'blindar das consequências dos desvios de recursos que vinham sendo praticados' por ele. Para isso, firmava contratos de fachada escritórios de advocacia como estratégia para justificar pagamentos de vantagens indevidas disfarçadas de serviços que, na verdade, não eram advocatícios, mas envolveriam lobby junto a tribunais superiores.

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A suspeita é que os advogados teriam atuado junto ao atual presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, ao ex-dirigente da Corte, ministro Francisco César Asfor Rocha, e ao ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas da União, para garantir a não punição e a permanência de Orlando Diniz no cargo. Nos três casos, os filhos dos ministros, todos advogados e denunciados, teriam sido beneficiados em contratações pela Federação de Comércio do Rio. Os contratos com o escritório de Eduardo Martins envolveriam R$ 83 milhões, enquanto Caio Rocha teria recebido R$2,6 milhões e Tiago Cedraz obtido pagamentos na ordem de R$13 milhões.

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Diante da hipótese de envolvimento de autoridades, o Ministério Público Federal no Rio chegou a encaminhar o acordo de colaboração de Orlando Diniz para análise da Procuradoria-Geral da República (PGR), que declinou o caso para primeira instância para prosseguimento das investigações contra os suspeitos que não possuem foro por prerrogativa de função.

"Após receber o referido Procedimento Administrativo em seguida à decisão da PGR, o MPF/RJ reinseriu as supostas autoridades suspeitas da prática de crimes como vítimas dos crimes de tráfico de influência explorados pela organização criminosa constituída de advogados", apontou Gilmar Mendes. "Após a rejeição do acordo pela PGR, as referidas autoridades deixaram de figurar como potenciais coautores dos fatos criminosos, tendo sido elencados pelo MPF/RJ como vítimas de crimes de tráfico de influência por parte dos advogados integrantes da organização criminosa denunciada", observou ainda.

Ao ministro, a Procuradoria do Rio informou que a rejeição do acordo perante a PGR decorreu da ausência de elementos autônomos de corroboração, isto é, da inviabilidade de se instaurar investigação criminal apenas com base no relato do delator, e da existência de outra investigação dotada de 'elementos probatórios sólidos que prescindiam da colaboração'.

"Essa questão suscita a dúvida sobre a ocorrência de duplicidade de apurações sobre os mesmos fatos em instâncias distintas (PGR e MPF/RJ) e, ainda, sem a prévia manifestação do STF sobre a cisão ou não das investigações", considerou Gilmar.

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O ministro alertou ainda que a investigação de autoridades com foro por prerrogativa de função sem autorização do Supremo e perante autoridade judiciária incompetente pode causar a nulidade das provas colhidas no curso das investigações e dos processos abertos contra os investigados.

Além de trancar as ações, Gilmar Mendes anulou todas as medidas cautelares, incluindo as buscas em endereços residenciais e comerciais dos investigados autorizadas pela 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, e determinou que o juízo se abstenha de decidir sobre fatos direta ou indiretamente relacionados ao caso até que o Supremo determine qual instância é responsável pelos processos.

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