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Vídeos não relacionados são editados para simular repressão chinesa a quem recusar vacina

Gravações que circulam no WhatsApp foram manipuladas para incluir o som de tiros; imagens foram feitas em cidades diferentes e não têm conexão com vacinação contra covid-19

Por Nivedita Niranjankumar , Swasti Chatterjee e BOOM
Atualização:

Esta checagem foi publicada originalmente pelo site indiano BOOM e traduzida por meio da Aliança CoronavirusFacts, coordenada pela IFCN. Leia mais sobre a parceria aqui e veja a verificação original aqui.

Três vídeos não relacionados -- incluindo uma gravação que mostra policiais armados e outra que retrata médicos atendendo várias pessoas -- foram agrupados para espalhar a informação falsa de que o governo chinês estaria matando pacientes infectados com o novo coronavírus em Wuhan, para espalhar a disseminação da covid-19.

 

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O site BOOM confirmou que os três vídeos não têm relação entre si; dois deles não têm conexão com a epidemia de coronavírus na China. O clipe viral tem sido compartilhado com diferentes legendas em Hindi e em inglês; a maioria delas afirma falsamente que o governo chinês está matando os infectados (nota: no Brasil, o vídeo tem sido repassado com comentários em português de teor semelhante).

Primeira sequência de imagens

O primeiro trecho, de 55 segundos, é uma gravação vista de cima de três policiais com roupas protetoras. Eles estão perto de uma viatura enquanto um deles carrega uma arma. A câmera então segue este último agente de segurança enquanto ele anda para uma área residencial. Um homem narra o vídeo na língua local.

Segunda sequência de imagens

A segunda cena do vídeo mostra uma confusão de pacientes no chão de um pátio aberto, enquanto profissionais de saúde as atendem. As pessoas ao redor estão em pânico visível. Não há narração, como na primeira cena. Mas é possível ouvir sons que parecem de tiros à distância. Ainda que as mensagens que acompanham o vídeo afirmem que as pessoas foram mortas, não há sangue nas imagens. Os pacientes parecem estar vivos e respondem aos enfermeiros.

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Terceira sequência de imagens

A terceira cena é de um homem de jaqueta amarela deitado em uma calçada. Uma pessoa se ajoelha perto dele. É possível ver uma ambulância e outros veículos estacionados no fundo. Sons que lembram tiros de armas de fogo também podem ser ouvidos neste terceiro clipe. 

Checagem

Pudemos confirmar que o clipe viral mostra três incidentes separados -- dois deles sem conexão com a covid-19 -- editados juntos. Sons de fogos de artifícios foram adicionados a algumas cenas para espalhar a informação falsa de que o governo chinês estaria atirando em pacientes.

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O primeiro vídeo, de policiais armados, é de Yiwu (na região leste da China, a quase 700 km de distância de Wuhan). A gravação mostra o esquadrão especial da cidade atendendo um chamado sobre um cão raivoso na área, em fevereiro de 2020. O terceiro vídeo, de um jovem deitado na calçada, mostra uma vítima de acidente de trânsito (em Wuzu, a cerca de 200km de Wuhan). Também verificamos que o som que parece de tiros neste último trecho é, na verdade, de fogos de artifício, e foi sobreposto às imagens.

Primeiro vídeo

No primeiro vídeo, em que três policiais aparecem perto de uma viatura, um homem narra as imagens no dialeto local. A tradução livre é a seguinte: "Armas estão a postos, não sabemos para quê. Submetralhadora, pistolas".

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Por meio de fontes, BOOM conseguiu ter acesso à captura de tela de uma postagem no WeChat, aplicativo chinês de rede social e mensagens. Em mandarim, um policial de Yiwu comenta que o vídeo tem sido compartilhado fora de contexto.

"Se alguém no seu grupo (de mensagens) está espalhando esse vídeo, ajude a esclarecer", escreveu o policial. "Ao meio-dia, a polícia especial de Yiwu recebeu um chamado do Centro de Comando municipal para dispor de um cão grande (...). Uma ação policial normal, sem qualquer relação com a pandemia".

Também encontramos um tuíte da China Global Television Network, uma rede de televisão chinesa, que disse que a polícia de Yiwu negou que o vídeo estivesse conectado ao coronavirus.  A emissora afirmou que a gravação foi editada "maliciosamente" com cenas separadas. Os oficiais armados estavam lidando apenas com um cão raivoso, confirmou a TV.

Segundo vídeo

 

Encontramos uma publicação antiga do segundo vídeo, de 25 de janeiro de 2020, no YouTube, com legenda que afirmava que os sons no fundo eram de armas. Uma análise detalhada do vídeo mostra que não eram tiros, e sim fogos de artifício disparados à distância.

No dia 25 de janeiro de 2020 foi comemorado o Ano Novo Lunar, amplamente celebrado na China. Embora reportagens da época indiquem que as comemorações foram pequenas naquele ano, encontramos vários vídeos no YouTube do mesmo dia em que pessoas estouram fogos em comemoração.

Não conseguimos identificar a localização exata do vídeo. (Nota: o site FactCrescendo, do Sri Lanka, encontrou uma versão mais longa da gravação, que indica que a filmagem foi feita na zona rural de Wuhan durante o Ano Novo Chinês -- abaixo).

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Terceiro vídeo

Analisamos o áudio do terceiro vídeo separadamente, e descobrimos que o sons de tiros foram adicionados às imagens. Um tuíte de 30 de janeiro de 2020 mostra a mesma gravação, sem barulho de armas de fogo.

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O usuário que tuitou o vídeo errou ao informar que o incidente ocorreu em Wuhan, quando um homem morreu ao tentar passar por um bloqueio policial. Outra conta respondeu que a cena foi filmada em Wuzu, quando dois adolescentes andavam de moto sem permissão e tiveram um acidente. Um deles morreu.

Posteriormente, o mesmo usuário disse que a localização era em frente à Escola Siyuan, na cidade de Wuzu, no condado de Huangmei. Diante disso, analisamos o vídeo mais de perto e identificamos que a calçada perto do jovem caído está visivelmente quebrada, como se tivesse sido atingida com força.

O site francês France 24 Observers também checou este vídeo, e confirmou com um morador de Wuzu que a gravação é de um acidente de trânsito de 29 de janeiro de 2020. A fonte confirmou que a filmagem foi feita em frente à escolha Siyuan.

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"Moro ao lado e vários dos meus amigos passaram em frente ao local na hora da tragédia", disse. "Ao contrário do que tem sido dito no Twitter, a pessoa no chão não é uma mulher, e sim um homem jovem. Ele não foi morto pela polícia, e sim em um acidente de moto".

O diretor da polícia de Wuzu confirmou as informações, de acordo com o France 24 Observers. O comunicado policial acrescenta que "a pessoa envolvida no acidente dirigia uma lambreta e, devido a uma manobra mal feita, se deslocou para o outro lado da estrada e colidiu com os paralelepípedos da calçada".

A polícia comunicou ainda que o motorista foi o único responsável pelo acidente, e que a agentes de segurança e profissionais de saúde chegaram rapidamente ao local.

Leitores enviaram este vídeo ao WhatsApp do Estadão VerificaEntre em contato pelo número 11 97683-7490.

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