Abrir parcialmente válvula do gás de cozinha não gera economia

Prática, na verdade, pode exigir mais tempo para cozinhar alimentos e oferecer riscos à segurança

PUBLICIDADE

Por Clarissa Pacheco
Atualização:

Circula no Facebook um vídeo enganoso em que um homem afirma ser possível economizar até 50% do gás de cozinha (GLP) se a válvula do regulador de pressão do botijão estiver parcialmente fechada. A prática, na verdade, gera uma falsa sensação de economia e pode, inclusive, exigir mais tempo para cozinhar um alimento. Além disso, há riscos à segurança por conta de possíveis vazamentos de gás.

No vídeo, o homem afirma que o ato de abrir a válvula do regulador apenas parcialmente faz com que ela funcione como uma torneira - quanto menos se abre, menor a vazão. Assim, se a abertura for menor, a quantidade de gás dispensada seria, também, menor, sem prejuízo à qualidade da chama. Mas não é bem assim.

 Foto: Estadão

PUBLICIDADE

O Estadão Verifica procurou o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), o Corpo de Bombeiros Militar da Bahia, o Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás) e consultou dicas de segurança para o uso do gás de cozinha da distribuidora Copagaz.

De acordo com o Inmetro, o ajuste na válvula do regulador pode realmente reduzir a vazão do GLP na saída do botijão, mas isso não significa necessariamente que vai haver economia. "Entendemos que no caso da vazão de uso normal de GLP, mantendo-se o regulador de pressão com a válvula na posição aberta (posição recomendada pelo fabricante), o rendimento na cocção do alimento é maior, e em menor tempo", informou a nota. "Ao regular a saída do GLP para reduzir a vazão do gás, o rendimento da cocção pode reduzir, e levar mais tempo pra concluir o cozimento".

Ou seja, se a vazão do gás for reduzida, é possível que o consumidor precise de mais tempo de uso de gás para cozinhar um mesmo alimento que ficaria pronto mais rápido se a válvula estivesse totalmente aberta. Por isso, o Instituto recomenda que o usuário siga as recomendações do fabricante do regulador. O equipamento aprovado pelo Inmetro segue os requisitos da norma NBR 8473, da ABNT, para avaliar a segurança do produto.

Para o major Leandro Vialto, subcomandante do 8º Grupamento de Bombeiros Militar, de Jequié, na Bahia, reduzir a vazão do gás na válvula não gera economia. "Eu não vejo como isso possa ser economia de gás. É a mesma coisa que cozinhar em fogo baixo o tempo todo: a chama vai ser menor, mas eu vou levar mais tempo para cozinhar, então vou gastar a mesma quantidade de gás", explicou.

Segundo ele, há outras formas de economizar gás de cozinha, como baixar o fogo depois que a água já estiver fervendo, por exemplo, ou utilizar uma panela de pressão, que cozinha em muito menos tempo e a uma temperatura mais alta.

Publicidade

O Sindigás também desmentiu, em nota, a alegação do vídeo. "Ao reduzir a vazão do gás, reduz-se também a eficácia do equipamento utilizado", comunicou. "No caso da cocção de alimentos, por exemplo, a prática diminui o calor da chama que sai do fogão, levando assim mais tempo para cozinhar a refeição".

Risco de vazamento

Numa cartilha sobre reguladores e mangueiras para uso em botijões, o Sindigás explica que o regulador, popularmente conhecido como registro, serve para reduzir a alta pressão do gás que sai do botijão e vai para o fogão. A válvula serve para bloquear ou liberar a passagem do gás. Segundo a entidade, "a regulagem do gás não pode ser feita no próprio botijão, pois prejudica a manutenção dos equipamentos que utilizam o combustível".

Cartilha

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Na seção de segurança do blog da distribuidora Copagaz consta que o controle da passagem de gás pela válvula do regulador ocorre de forma automática. Ou seja: quando a válvula está na posição correta e uma boca do fogão é aberta, o regulador libera o gás com a pressão necessária e na medida certa para que o fogão ou outro equipamento funcione com segurança.

O major Leandro Vialto explica que a prática de abrir parcialmente a válvula acaba favorecendo o risco de vazamentos, porque o gás não sai do botijão com a pressão correta e a chama fica mais fraca, diferente do que afirma o autor do vídeo que viralizou no Facebook.

"Se você abrir uma boca só, talvez não perceba a diferença, mas se abrir todas as bocas, vai ver que as chamas estão mais fracas e podem apagar com mais facilidade pelo vento, por exemplo. Se o fogo apaga, agora eu vou ter um risco muito grande de ter gás vazando na minha casa e de ter uma explosão", alertou.

Publicidade

Em caso de vazamento de gás, explosões podem acontecer por conta de uma centelha, como a provocada pelo acendimento de uma lâmpada, por exemplo. Em situações assim, o Sindigás recomenda que a válvula seja imediatamente fechada e que "não se acione interruptores de eletricidade e não ligue nem desligue equipamentos eletrônicos ou que possam produzir faísca". Quando o gás não estiver sendo utilizado, a recomendação é que a válvula fique fechada.


Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.