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Para atacar governadores, postagem exagera valor de impostos estaduais do gás de cozinha

Consumidor paga cerca de 15% do valor em ICMS para os Estados; preço médio do botijão de 13kg era de R$ 87,19 na semana passada no Brasil

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Por Samuel Lima
Atualização:

Circula nas redes sociais a ilustração de um enorme botijão de gás de cozinha sendo carregado com dificuldade em um carrinho de compras. A legenda sugere que o produto estaria custando R$ 110,85 e que quase a metade do preço seria referente aos impostos estaduais: R$ 50,00. "Quem está roubando o povo? Os governadores de cada Estado", alega a postagem. Os dados estão incorretos.

 Foto: Estadão

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O impacto dos impostos sobre o valor final está superestimado. Pelos números da postagem, a cobrança de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) -- que é a forma de arrecadação dos Estados -- seria mais alta até que a participação da Petrobras, o que não é verdade.

Dados da companhia estatal, publicados em seu site, desmentem essa tese. No caso do gás de cozinha, 49,3% ficam com a Petrobras, 35,8% compõem os segmentos de distribuição e revenda e 14,9% são oriundos da cobrança de ICMS pelos Estados. A atualização mais recente do site foi feita com base no período de coleta de 30 de maio a 5 de junho deste ano.

 Foto: Reprodução / Petrobras

De acordo com outra tabela da ANP, cuja atualização mais recente é de abril de 2021, o impacto médio do ICMS é de R$ 12,07 no preço médio do gás no Brasil -- o equivalente a 14,2% do valor final ao consumidor, calculado em R$ 85,01 naquele mês. O restante equivale ao preço de realização da refinaria (R$ 42,06/ 49,47%) e às margens de distribuição e revenda (R$ 30,88 / 36,32%).

Preços do GLP em 2021 - ANP

O painel da ANP mostra ainda que as cobranças de ICMS são diferentes entre os Estados. A maior alíquota praticada é de 18%, em oito localidades (RN, PI, PE, PR, PB, MG, CE e AM). Esse percentual incide sobre uma base de cálculo chamada Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final, uma espécie de estimativa sobre o valor a ser praticado a domicílio, que também varia entre cada ente da federação. 

De qualquer forma, segundo a tabela da ANP, nenhum Estado cobra mais do que R$ 18 de imposto na prática. No caso mais extremo, o Acre cobrava R$ 17,86 em abril -- o que representa 17,38% sobre o preço final médio ao consumidor daquele Estado, no mês de apuração. Em outras praças, como Bahia e Rio de Janeiro, o valor fica abaixo de R$ 10.

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Fonte: Reprodução / ANP Foto: Estadão

Impostos federais estão zerados

Além de atacar os governadores com dados incorretos, a peça também desinforma sobre uma suposta arrecadação do governo federal sobre o gás de cozinha. A postagem atribui R$ 0,82 a impostos federais e, entre parênteses, ao presidente "(Jair) Bolsonaro". Atualmente, porém, nenhum tributo do tipo está sendo cobrado sobre o botijão de 13kg, que é o formato usado nas casas dos brasileiros.

O gás de cozinha está sujeito a três impostos federais: a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), o Programa Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Todos aparecem zerados na página de informações públicas de composição de preços da Petrobras.

O gás de cozinha está isento da Cide desde que o imposto foi criado, em 2001, segundo o Ministério da Economia. Já o PIS/Cofins foi extinto por um decreto de Bolsonaro em março deste ano, por prazo indeterminado, quando o governo estava pressionado por conta de uma sequência de reajustes dos combustíveis. A desoneração foi de exatos R$ 2,18 no preço final ao consumidor doméstico, porque o imposto era fixo.

Valor médio do gás de cozinha também foi superestimado

O gás de cozinha de fato teve forte aumento no último ano. Apesar disso, o preço médio de venda no País atualmente é de R$ 87,19, não R$ 110,85. Esse preço se refere à na semana mais recente, de 13 a 19 de junho deste ano, para o botijão de 13kg de uso doméstico, segundo levantamento da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

 Foto: Reprodução ANP

A oferta ao consumidor final variou de R$ 65 a R$ 120 nos mais de 3 mil pontos de venda pesquisados pelo órgão do governo federal. Portanto, existem localidades praticando valores até mais altos do que o mencionado pelo conteúdo viral, mas o preço médio hoje é 20% mais baixo do que o número que circula nas redes.

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Como mostra uma reportagem recente da CNN Brasil, o preço do gás de cozinha é afetado pelas variações do dólar e pelas flutuações do mercado internacional de petróleo. Essas influências são expressas nos reajustes da Petrobras. Além disso, o produto pode ficar mais caro por conta dos custos e das margens envolvidas em todos os segmentos da cadeia (produção, distribuição e revenda), assim como pelas alíquotas de ICMS e por mudanças na referida base de cálculo do imposto em cada Estado.

Em dezembro do ano passado, o preço médio do GLP-13 era de R$ 74,75 para os consumidores brasileiros. A cotação mais recente da ANP mostra, portanto, que o produto ficou cerca de 16% mais caro desde o começo do ano. Para fins de comparação, a inflação geral acumulou alta de 3,22% até o mês de maio, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em uma taxa já considerada elevada.


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