Pedro Prata
18 de novembro de 2020 | 16h45
Um boato viral nas redes sociais inventa que o “chefe de campanha de Joe Biden“, chamado Dallas Jones, teria sido preso por fraudar votos no Texas. Na verdade, Jones — que não é “chefe de campanha” do democrata — foi mencionado em uma ação judicial movida por ativistas conservadores. Eles foram derrotados na Suprema Corte texana por falta de provas.
Além disso, a foto que acompanha a peça de desinformação é da prisão do ator Cuba Gooding Jr., não do funcionário da campanha democrata. Esse conteúdo foi compartilhado ao menos 1,2 mil vezes no Facebook e circula também no Twitter e no YouTube.
Homem na foto é o ator Cuba Gooding Jr., não funcionário da campanha democrata. Foto: Reprodução
Dallas Jones se apresenta como um ativista social em sua página na internet. Ele foi nomeado diretor político da campanha de Joe Biden e Kamala Harris no Texas.
Jones é citado em uma ação de setembro, anterior às eleições, protocolada por Steve Hotze, um ativista conservador, segundo o jornal Texas Tribune. Apesar de citar Jones, o processo não é sobre ele. A ação questiona uma decisão de Christopher Hollins, responsável pelas eleições no condado de Harris, o mais populoso do Texas, de ampliar em seis dias a data inicial para votação antecipada no estado. Hotze também queria que o condado de Harris fosse obrigado a concentrar o recebimento de cédulas de votação em um único posto, não nas onze unidades utilizadas durante o período eleitoral.
No documento, o conservador afirma que detetives particulares e um ex-agente do FBI teriam identificado um suposto esquema ilegal de coleta e entrega de votos. A prática é permitida em alguns estados norte-americanos, mas é proibida no Texas, onde cada eleitor é responsável por entregar seu voto às autoridades eleitorais.
Segundo Hotze, figuras democratas texanas — Dallas Jones entre eles — supostamente estariam agindo em conluio com Christopher Hollins para a tal tarefa ilegal. Uma vez de posse dos votos de milhares de texanos, eles alterariam as cédulas para que estas fossem para o candidato Joe Biden.
Resposta de Christopher Hollins
Hollins foi chamado pela corte a responder às demandas de Hotze. Disse que os conservadores “lançaram acusações sem evidência alguma e de procedência duvidosa, vindas de investigadores privados que não divulgam quem são seus clientes ou fontes”.
Convidado a opinar no processo judicial, o procurador-geral do Texas afirmou que o governador republicano Greg Abbott publicou diretrizes que permitiram aos condados ampliar o período para votação antecipada, visando conter os riscos de contágio do novo coronavírus. A Suprema Corte estadual julgou improcedente os pedidos de Hotze em 7 de outubro, e a ação foi arquivada em 10 de novembro.
A imagem que supostamente mostraria Jones sendo preso foi inicialmente postada no Twitter pelo perfil @DJcalligraphy. Menos de uma hora depois, ela disse que talvez o rapaz na imagem não fosse ele: “ATUALIZAÇÃO: Eu encontrei esta foto ao pesquisar por fotos do Dallas Jones, mas me disseram que esse talvez não seja ele. Se isso for verdade, peço desculpas.”
Biden Campaign Staffer, Dallas Jones was arrested for Voter Fra_d. Accused of harvesting thousands of ball_ts and voting under names of homeless, elderly, dead people.
MSM is suppressing the story. pic.twitter.com/rlUeUqHD7L— djcalligraphy ❤️🤍💙 (@DJcalligraphy) November 14, 2020
De fato, o homem na imagem não é Dallas Jones, mas sim o ator Cuba Gooding Jr. Ele foi preso em 13 de junho de 2019, acusado de assédio sexual em uma casa noturna de Nova York. A prisão foi filmada por um cinegrafista da agência Associated Press.
Detalhes semelhantes entre o boato (cima) e a imagem da Associated Press (baixo) permitem concluir se tratar da mesma situação. Foto: Reprodução
Em outro momento do vídeo, é possível ver um microfone do canal Fox News. É o mesmo que aparece desfocado em primeiro plano na imagem utilizada pela usuária do Twitter na postagem sobre a suposta prisão de Dallas Jones.
Comparação entre boato (cima) e imagens da prisão de Cuba Gooding Jr (baixo), feitas pela Associated Press. Foto: Reprodução
Este conteúdo também foi checado por Snopes e FactCheck.org.
Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.
Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.
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