Postagem exagera tamanho da dívida de Venezuela e Cuba com o Brasil

Dados do BNDES mostram que valor que não foi pago ou que ainda está a pagar é de US$ 1,3 bilhão, e não R$ 31 bilhões

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Por Pedro Prata
Atualização:

É falso que Venezuela e Cuba tenham com o Brasil dívidas de "R$ 31 bilhões que nunca vão pagar", como afirma uma postagem viral no Facebook. O texto -- que voltou a circular recentemente e atingiu 20,4 mil compartilhamentos em 24 horas -- diz que o ex-presidente Lula seria o culpado do calote, o que sugere tratar-se de financiamentos de exportação de serviços de engenharia realizados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES). Dados oficiais do banco mostram que a alegação está exagerada.

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De 15 países que tiveram operações com o BNDES, três deixaram de pagar valores até o momento. Cuba já deixou vencer parcelas no valor de US$ 165 milhões e Venezuela, de US$ 572 milhões. Para quitar a dívida total, esses dois países ainda devem pagar mais US$ 441 milhões e US$ 221 milhões, respectivamente. Portanto, o débito que as duas nações têm com o Brasil é de US$ 1,399 bilhão (R$ 7,786 bilhões na cotação de outubro de 2021).

O outro país que não honrou seus compromissos foi Moçambique. O governo de lá deixou vencer parcelas que totalizam US$ 122 milhões e ainda precisa quitar mais US$ 56 milhões.

 Foto: Reprodução

O financiamento à exportação de bens e serviços de engenharia foi uma modalidade de financiamento do BNDES na qual o banco liberava o dinheiro diretamente a empresas brasileiras que fossem contratadas por governos estrangeiros para grandes obras. O dinheiro do BNDES só poderia ser utilizado para pagar mão de obra e matéria-prima brasileiras.

Circulam nas redes sociais postagens dizendo que o Brasil teria financiado obras em outros países, o que é enganoso. O dinheiro saía do banco brasileiro, mas quem pagava a conta eram os países estrangeiros -- incluindo os juros. Até a publicação desta checagem, o BNDES já havia desembolsado US$ 10,499 bilhões para obras em outros países. Em contrapartida, havia recebido US$ 12,445 bilhões.

Deste total, US$ 830 milhões vieram do Fundo Garantidor de Exportação (FGE). É uma espécie de seguro com recursos privados que ressarce o BNDES quando o país contratante não paga uma parcela.

Como mostrou o Dossiê do BNDES publicado pelo Estadão em 2019, os empréstimos feitos a Cuba e Venezuela foram criticados pela oposição, na época,  devido à proximidade do PT com os dois regimes. O investimento também foi criticado pela falta de transparência, devido ao sigilo imposto às "excepcionalidades" dos contratos. O sigilo foi retirado pelo BNDES posteriormente, e todos os documentos estão disponíveis para consulta em uma página oficial do banco.

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Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

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