‘Vou me entender com a Justiça’, disse Queiroz ao ser preso, segundo delegado

Caseiro afirmou à Polícia Civil que ex-assessor estava no imóvel, do advogado da família Bolsonaro, havia um ano

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Por , Marcelo Godoy e Renato Vasconcelos
Atualização:

O delegado da Polícia Civil de São Paulo que efetuou a prisão de Fabrício Queiroz, Oswaldo Nico Gonçalves, disse ao Estadão que o ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro afirmou, ao ser detido, que iria se entender com a Justiça. Queroz foi preso às 6 horas desta quinta-feira, 18, em uma imóvel em Atibaia, no Interior de São Paulo, que pertence, segundo a Polícia Civil do Rio, ao advogado e amigo da família Bolsonaro, Frederick Wassef. A operação foi coordenada pelo Ministério Público do Rio e executada pela polícia e pelo MP de São Paulo. Wassef aparece como advogado de Flávio Bolsonaro no caso Queiroz – ele se apresenta como advogado de Bolsonaro, mas não atua formalmente em nenhuma causa em nome do presidente. 

Queiroz estava há mais de um ano no imóvel, segundo infomou à Polícia Civil um caseiro que vive em uma edícula do imóvel, ainda segundo Golçalves. “Ele (Queiroz) não fez nada, não reagiu. Levantou as mãos e falou: ‘Olha, tudo bem. Vocês cumprem a função de vocês, vou me entender com a Justiça’. Foi ótimo, trouxemos ele para cá”, disse o delegado, ao descrever o momento da prisão. Com Queiroz, as autoridades aprenderam cerca de R$ 900 em notas. O ex-assessor estava sozinho na casa. 

Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro,deixa o Instituto Médico Legal de São Paulo. Foto: EFE/Sebastião Moreira

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O promotor público Jandir Moura Gomes Neto, do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Campinas, afirma que recebeu o mandado de busca e apreensão do Rio de Janeiro na quarta-feira. Foram promotores do Rio que localizaram o ex-assessor e colocaram, no pedido, o endereço do alvo da ação. A prisão de Queiroz é preventiva, tipo de detenção aplicada quando o suspeito pode escapar, quando pode agir para ocultar ou destruir provas ou quando pode coagir outras pessoas envolvidas em uma investigação.

Pelo prazo curto entre o recebido do pedido e a data da operação, e pelo risco de o alvo escapar ou da informação vazar, procedimentos comuns a operações do tipo não foram adotadas, de acordo com o promotor. 

“Por conta de ser um alvo conhecido, uma pessoa que, em investigações anteriores, não ter sido localizado, ficamos com receio de fazer aquilo que chamamos ‘reconhecimento’, que é um procedimento padrão que adotamos quando a gente vai cumprir uma ordem judicial em um local em que não é nós que estamos investigando”, afirmou. Desse modo, nenhum policial nem promotor de Campinas esteve na casa antes do momento da prisão. Para saber quantos agentes levar e se havia rotas de fuga, a pesquisa foi feita no computador.

“Fizemos uma pesquisa em bancos de dados normais, vulgo Google, e pesquisas em bases de dados que nós temos”, afirmou o promotor. Como, nas pesquisas, havia indicação de que o endereço poderia ser o local de trabalho do advogado Wassef, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) seção Campinas também foi acionada para participar da operação.

“Naquele imóvel, em tese poderia ser um escritório de advocacia. Por conta disso, para evitar que o ato pudesse ter algum problema de validade, já que os escritórios de advocacia podem ter documentos vinculados aos sigilos dos clientes, em geral nesse tipo de diligência a gente cumpre com o apoio da comissão de prerrogativas da Ordem dos Advogados”, afirmou o promotor.

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Somente às 4h30 desta segunda, quando policiais civis vindos de São Paulo e promotores e membros da OAB  se encontraram para a operação, é que o nome do alvo foi revelado como sendo o do ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro.

O promotor informou que toda a ação foi filmada e o material, enviado para os colegas do Rio que conduzem a investigação. Os promotores paulistas questionaram se havia algum documento que os colegas cariocas queriam que fosse apreendido mas, por causa da possibilidade de se referirem a outros clientes de Wassef, apenas papéis pertencentes ao próprio Queiroz é que foram levados. O promotor acrescentou que o dinheiro encontrado com o ex-assessor estava em sua carteira. 

O caseiro disse aos policiaias que o ex-assessor estava no imóvel havia pelo menos um ano. O promotor ressalta que o caseiro foi ouvido informalmente, e que caso haja avaliação de que ele pode prestar informações à investigação, poderá ser ouvido como testemunha se os investigadores do caso, no Rio, assim solicitarem.

O planejamento da prisão, entretanto, começou na terça, quando os documentos do Rio foram enviados a São Paulo. O promotor Amauri Silveira Filho, do Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) da capital, procurou o secretário executivo da Polícia Civil de São Paulo, delegado Youssef Abou Chahin para comunicar da operação. Já Youssef informou apenas duas pessoas sobre o contato: o delegado-geral, Ruy Ferraz Fontes, e o diretor do Departamento de Operações Policiais Estratégicas (Dope), Oswaldo Nico Gonçalves. O alvo da operação foi mantido em sigilo. Nico Gonçalves designou uma equipe para verificar se o endereço  em Atibaia existia e em nome de quem o imóvel estaria registrado, chegando à mesma conclusão que o promotor de Campinas chegaria nas vésperas da operação.

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Um grupo de WhatsApp foi montado pelos promotores do Rio e de São Paulo, com a participação dos delegados paulistas para a coordenação da operação. E foi nele que Nico comunicou aos colegas que havia achado o Queiroz, após a prisão. Não havia armas na casa. O ex-assessor parecia com medo quando viu os policiais, segundo os agentes. Youssef deu a ordem aos subordinados que o material arrecadado na casa fosse colocado em um malote. Queiroz disse as policiais que estava doente.

Ao ser preso, ele passou no Instituto-Médico Legal e, depois, foi levado à sede do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Para evitar qualquer problema, teve seu cinto retirado da calça. A cúpula da Segurança Pública de São Paulo decidiu enviar o preso o mais rápido possível ao Rio, daí a transferência feita em helicóptero da própria Polícia Civil. No grupo de WhastApp, os policiais receberam os parabéns dos promotores do Rio. O governador João Doria (PSDB) também enviou parabéns ao grupo, em um recado transmitido pelo secretário da Segurança, general João Camilo Pires de Campos.

Em setembro passado - quando, segundo a polícia, o ex-assessor já estaria no imóvel do advogado - Wassef negou saber sobre o paradeiro de Queiroz, durante uma entrevista à jornalista Andreia Sadi, na GloboNews. Wassef representou Jair Bolsonaro em casos recentes, como no caso Adélio Bispo, após a facada sofrida pelo presidente durante a campanha de 2018, e no caso envolvendo o porteiro do condomínio do presidente.

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O mandado de prisão preventiva expedido para Queiroz é parte da operação Anjo, coordenada pelos Ministérios Públicos do Rio e de São Paulo. Outro mandado de prisão foi expedido para a mulher do ex-assessor, Márcia Aguiar.

O senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, manifestou-se pelas redes sociais após a prisão de Queiroz. “Encaro com tranquilidade os acontecimentos de hoje. A verdade prevalecerá! Mais uma peça foi movimentada no tabuleiro para atacar Bolsonaro”, escreveu Flávio. “Em 16 anos como deputado no Rio nunca houve uma vírgula contra mim. Bastou o Presidente Bolsonaro se eleger para mudar tudo! O jogo é bruto!”, escreveu.

Queiroz foi autorizado a levar uma mochila com roupas quando foi detido. Vestiu máscara e boné preto ao se entregar aos policiais. “Toda a investigação, a localização do paradeiro dele, foi feita pelos Ministério Públicos de São Paulo e do Rio. À polícia, só coube cumprir o mandado”, disse o delegado-geral da Polícia Civil paulista, Ruy Ferraz Fontes. Queiroz ficou cerca de uma hora na sede da Polícia Civil Paulista e seguiu, levado em um grupo de quadro viaturas, para o Campo de Marte, na zona norte, de onde deve seguir para o Rio.

Advogado Fred Wassef (à direita, com gravata amarela) participa de evento no dia 17 de junho no Palácio do Planalto, em Brasília Foto: Gabriela Biló/Estadão

Casa em Bento Ribeiro

Um dos mandados de busca e apreensão expedidos durante a operação Anjo tinha como alvo um endereço no bairro de Bento Ribeiro, na zona Norte do Rio. A casa, localizada na rua Divisória, era onde vivia uma funcionária de Flávio Bolsonaro, Alessandra Marins. O imóvel fica próximo a uma residência de propriedade do presidente da República, Jair Bolsonaro.

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