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'Vitória dos ficha-sujas cria frustração geral', avalia cientista político

Para Marco Antonio Teixeira, decisão do STF sobre Jader Barbalho deixa a impressão de que não vale a pena lutar

Por Gabriel Manzano
Atualização:

Ao confirmar na quarta-feira, 14, o cargo de senador para Jader Barbalho (PMDB-PA), o Supremo Tribunal Federal "gerou um sentimento de frustração na sociedade, deixando a impressão de que lutar não vale a pena", adverte o cientista político Marco Antonio Teixeira. Pouco antes de Jader, dois outros fichas-sujas já haviam obtido o direito de tomar posse no Senado - João Capibaribe (PSB-AP) e Cunha Lima (PSDB-PB).

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A campanha pela Ficha Limpa entusiasmou milhares de pessoas, que acreditaram poder ajudar a melhorar a vida política, lembra Teixeira. "A lição que essas pessoas vão tirar é que o mundo político pertence a uma outra realidade. Muitos deles não aceitarão mais entrar em ações desse tipo no futuro".

Professor de Ciência Política na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, Teixeira vê, no episódio, vários aspectos negativos. O desânimo do eleitorado, o mau exemplo dos poderes Legislativo e Judiciário, a incerteza quanto às regras também nas eleições municipais de 2012. E se há um vilão nessa história, acrescenta, são os partidos. "Se eles fossem responsáveis e estivessem interessados na qualidade dos candidatos, o País nem precisaria de uma Lei da Ficha Limpa".

Qual o impacto das decisões do STF validando os cargos dos três senadores fichas-sujas?

Há um óbvio sentimento de frustração geral na sociedade. A Lei de Ficha Limpa nasceu dela, foi debatida e divulgada com entusiasmo. A meta era cobrar mais dos partidos, que só se interessam pelos tais puxadores de votos. Muitos políticos no Congresso aderiram à cruzada, tentando aprovar o projeto a tempo de vigorar já em 2010. A decisão do STF deixa tudo em suspenso.

Para muita gente o Supremo acabou ficando como o vilão da história. É justo?

Aí há vários aspectos. O Congresso deveria ser mais responsável, não deixar criar tantas expectativas. Cerca de 40% dos parlamentares são advogados. O relator, José Eduardo Cardozo, é hoje ministro da Justiça. Eles todos sabiam muito bem dos desafios que a lei teria pela frente. Mas o Supremo, que se limitou a aplicar a lei, complicou as coisas com sua habitual lentidão. Assistiu a outros dois candidatos tomarem posse no Senado, Marinor Brito (PSOL-PA)e Gilvan Borges (PMDB-AP). Viu-os participando de discussões, votando projetos, e no final acabou decidindo que eles não tinham legitimidade para isso. 

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O episódio está encerrado e agora a lei vai valer?

Não se pode garantir isso. Essa história ainda não acabou. O Supremo vai primeiro dar posse à ministra Rosa Weber, para completar seu quadro, e depois virão as férias. Há outra questão, que alguns interessados vão forçar, de levar em conta o trânsito em julgado das decisões para contar os prazos. A sentença definitiva sobre validade da regra em 2012 pode sair lá pelo meio do primeiro semestre, numa hora em que os partidos estarão já definindo suas convenções e listas de candidatos. E há algum risco, também, de a Ficha Limpa acabar não valendo nem no ano que vem.

A que o sr. atribui tanta dificuldade numa questão que devia ser clara e simples?

Se há de fato um vilão nessa história, são os partidos. Se nossas lideranças partidárias se preocupassem com a qualidade no recrutamento de candidatos, o País nem precisaria de uma lei de Ficha Limpa. Mas a saída seria mexer na lei dos partidos, coisa que os políticos não querem fazer de jeito nenhum..

O sr. acredita que estejam existindo negociações entre a cúpula do Judiciário?

O que se pode dizer é que fica no ar uma suspeita de conversas de interesse comum dos dois poderes. O que se divulgou é que o STF decidiu correndo o caso Jader, antes que outro interessado, Paulo Rocha (PT-PR), conseguisse também voltar. E está nos jornais, também, que a volta de Jader, que agrada ao PMDB, ocorre num momento em que tramita o projeto de aumento dos magistrados.

Tem havido interferência do Judiciário no mundo político?

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Há de fato um vácuo na medida em que o Legislativo foge ao dever de tomar as decisões que lhe cabem. Ou então, ele as toma de uma forma juridicamente imperfeita. Por um ou outro motivo, sobra ao Supremo a tarefa de preencher os vazios, de consertar as falhas jurídicas. Mas boa parte disso é também decisão do Legislativo de transferir os problemas, para não agravar seus conflitos internos.

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