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Viagem de deputado após ameaças 'é algo passageiro', diz secretária

Em entrevista à BBC Brasil, Regina Miki afirma que não vê decisão de Marcelo Freixo de forma negativa.

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Por Bianca Rothier
Atualização:

O Ministério da Justiça ofereceu proteção a Marcelo Freixo, do PSOL, antes de o deputado estadual do Rio de Janeiro anunciar que vai deixar o Brasil por causa de uma série de ameaças de morte, afirmou a secretária nacional de Segurança Pública, Regina Miki, durante um evento sobre violência na Suíça. Apesar de toda a repercussão, para a secretária, a mudança do político para a Europa "é algo passageiro" e não deve ser vista como negativa. Regina Miki lidera a comitiva brasileira que participa da 2ª Conferência Ministerial para a Revisão da Declaração de Genebra sobre Violência Armada e Desenvolvimento, um documento assinado em 2008 por mais de cem países. O encontro é organizado pelo governo suíço em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Os objetivos são avaliar os progressos registados nos últimos três anos e definir prioridades para o cumprimento das metas até 2015. A secretária nacional de Segurança Pública conversou com a BBC Brasil, com exclusividade. BBC Brasil - Em relação ao anúncio de que o deputado estadual Marcelo Freixo, do PSOL, vai deixar o país depois de ser ameaçado de morte, quais são as consequências de um exemplo como este tanto internamente, do ponto de vista do combate ao crime organizado, como também para a imagem do Brasil no exterior? Regina Miki - Pelo que me pareceu, eu não acredito que o deputado venha morar na Europa. Acho que é algo passageiro. Ele deve fazer algumas apresentações e depois retornar em dezembro. É claro que a gente sabe que é preocupante porque ele foi realmente ameaçado, mas, quando houve o desagravo ao deputado, o próprio ministro da Justiça ofereceu a ele toda a proteção necessária. BBC Brasil - A notícia de que o deputado Marcelo Freixo virá para a Europa chegou à imprensa internacional. Este assunto repercutiu também durante o evento do qual a senhora participa, em Genebra? Miki - Não falei com ninguém. Eu simplesmente li a notícia, mas acho que todo deputado tem o direito de tirar uma licença. Ele já falou que vai voltar. Ele vive sob ameaça de morte desde que começou a denunciar as milícias, não é de hoje. Eu não vejo (essa viagem) de uma forma negativa. Se ele fosse deixar de ser deputado, para ir embora do país, aí era outra história. Ele está saindo por apenas 2 meses. Não estou minimizando nada, mas eu posso afirmar uma coisa: o governo do Rio de Janeiro está no caminho certo. Aquilo que o mundo inteiro diz que é o ideal. BBC Brasil - Por falar em caminho contra a violência, como o Brasil está sendo visto pelos outros países durante essa conferência sobre a Declaração de Genebra? Miki - O Brasil já foi citado inúmeras vezes durante essa conferência. Foi citado como exemplo pela delegação da Nova Zelândia, da OEA e até pela mediadora do debate, em temas como a diminuição da desigualdade e a ocupação das favelas. É muito bom ouvirmos isso sentados. Não somos nós que estamos divulgando. BBC Brasil - Mas ainda há dados muito preocupantes. Há registros de que as milícias não estão mais restritas apenas ao Rio de Janeiro, já chegaram a pelo menos 11 Estados brasileiros. A milícia já é encarada como um problema nacional? Miki - Veja bem. O que se chama de milícia, com as características de ocupação de território com distribuição de serviços, como nós observamos no Rio de Janeiro, a gente não encontra em outro Estado. Eu posso até concordar que a gente tenha em outros Estados diferentes tipos de organizações criminosas, por exemplo, grupos de extermínio, mas não com as características das milícias no Rio de Janeiro. BBC Brasil - A senhora ressaltou a ocupação de favelas... Mas, na semana passada, o Exército, em parceria com policiais militares e civis, precisou fazer uma nova operação na favela da Grota, no Complexo do Alemão, depois que um vídeo mostrou a atuação de supostos traficantes no local. O que deu errado nesse processo de pacificação no Complexo do Alemão? Miki - Não deu errado. A gente tinha absoluta certeza de que num primeiro momento não se desmantelaria tudo que estava lá. O que houve foi a retomada do território. Quem conhece o Complexo do Alemão sabe o tamanho do lugar e tem noção de que ainda é pouco tempo para dizer que está tudo dominado e que não tem mais traficante. Essas ações pontuais vão ocorrer. Não tem jeito. Foram anos a fio de comando do tráfico dentro dos morros, então essa retomada vai ter altos e baixos, sem dúvida alguma. BBC Brasil - Para o combate ao narcotráfico, uma grande dificuldade continua sendo o controle das fronteiras. Como o Brasil pode superar esse desafio? Miki - A pedido da presidenta Dilma Rousseff, nós temos buscado uma ação integrada entre o Ministério da Justiça e o Ministério da Defesa. Além disso, temos buscado com o Itamaraty acordos bilaterais com países vizinhos para que possamos trabalhar não só na fronteira, combatendo a entrada de armas e drogas, mas também dentro de países vizinhos com o apoio logístico do Brasil, como no caso da destruição de maconha dentro do território paraguaio e de cocaína na Bolívia. É um trabalho que é complicado, mas que tem surtido efeito. BBC Brasil - Já que o assunto é América Latina, a região é o destaque negativo de um estudo divulgado pela secretaria da Declaração de Genebra. Seis dos 14 países mais violentos do mundo estão na América Latina. Quais são as conclusões do grupo até agora? Miki - Realmente, esta pesquisa mostra que os países com a maior taxa de homicídios (90%) não estão em conflitos armados ou enfrentam problemas com terrorismo. Então isso é preocupante e nós da América Latina representamos um percentual muito grande. Por outro lado, o Brasil tem feito o dever de casa, especialmente na campanha do desarmamento, com mais de meio milhão de armas recuperadas, de forma voluntária. Fora as armas apreendidas pelo policiais em serviço. Nós estamos também com o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania em andamento e um plano de combate ao crack está prestes a ser lançado pela presidenta Dilma, englobando as questões da saúde e da segurança. BBC Brasil - Ao reduzir a violência em Diadema, São Paulo, o trabalho da senhora foi muito reconhecido, inclusive pela ONU. A senhora acredita que agora, no atual cargo, é mais difícil tirar as ideias do papel? Miki- Em Diadema, eu executava a política. Hoje, eu sou indutora e articuladora de uma política. No Brasil, pela sua formação de Federação, os Estados têm autonomia sobre as políticas de segurança. Então, o que nós podemos fazer é articular os Estados e potencializar por meio de recursos financeiros a execução de algumas ações. É bem diferente o meu papel hoje. São estágios na vida. Se eu não tivesse já executado, eu não saberia das dificuldades para se executar. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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