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Por Dora Kramer
Atualização:

No ambiente dogmático que tomou conta de Brasília com a instalação do PT no poder, Márcio Thomaz Bastos era exceção no deserto de pensamentos independentes e raciocínios críticos entre ministros que se subordinavam a repetir as ordens do dia que vinham de cima.José Dirceu podia ser até o mais poderoso, o capitão do time na expressão do dono da bola, mas Thomaz Bastos era o mais influente por ser também o mais capacitado e politicamente nada sectário. Ele influiu na indicação de pelo menos seis ministros ao Supremo Tribunal Federal.Foi graças à amplitude de suas relações que o PT conseguiu abrir diálogo com a oposição no auge do escândalo do mensalão, possibilitando ao governo por em prática o plano da volta por cima num momento em que o cenário indicava a possibilidade de renúncia do então presidente Lula à candidatura à reeleição. Thomaz Bastos conseguiu avanços como ministro da Justiça, mas sua passagem pelo governo ficou marcada por sua atuação na defesa do presidente em momentos difíceis. Inclusive o impedindo de insistir em erros primários, como no caso da reação a uma reportagem sem maior importância do correspondente do New York Times no Brasil sobre o gosto de Lula por bebidas alcoólicas. O presidente queria impedir a renovação do visto do jornalista, teve o apoio de assessores, menos o de Márcio Thomaz Bastos que o demoveu da ideia e evitou o prosseguimento do vexame. Nem sempre, como no caso, foi bem sucedido. Havia a personalidade de Lula e aquela toda gente tóxica ao entorno. No mensalão, Márcio ganhou num primeiro momento ao conseguir arrefecer a crise política com o argumento do crime eleitoral.Na Justiça, porém, a tese adotada pela defesa de todos os réus não foi aceita pelos ministros do STF. Seria depois e agora o condutor dos defensores dos implicados na operação Lava Jato. Tentou até o último instante e morreu como viveu: ativo, no exercício irrestrito da defesa. Personalidade investida de peculiar bom humor, gosto por bons prazeres, hábitos saudáveis e divertida ironia com as formalidades do poder. Uma raridade que deixa imensa e, por paradoxal que pareça, uma agradabilíssima e, sobretudo, tranquila sensação de saudade. Um privilégio conhecer e por algumas vezes receber conselhos de Márcio Thomaz Bastos. Que maravilha esse modo de viver. Posto avançado. Quanto mais avançam as investigações do escândalo da Petrobrás, mais enrolado o governo e mais paralisado o PT, mais se adianta o deputado Eduardo Cunha nas articulações em prol de sua candidatura pela presidência da Câmara. Já fechou acordos que ainda não podem ser divulgados publicamente, mas estão acertados nos bastidores.A oposição assegurou a Cunha os votos, mas ficou combinado que por ora será dito que a tentativa será uma terceira via provavelmente por meio do nome do deputado Júlio Delgado (PSB-MG). Escaldado, o mineiro não aceita o papel de mera figuração. Só será candidato se tiver apoio real. Coisa que a oposição não quer explicitar agora para nenhum dos dois lados.Dois fatos: o DEM recuou a fim de não caracterizar a candidatura de Cunha como de oposição e assim deflagrar reação do Planalto e o PSDB resolveu disfarçar. Que tem candidato de oposição quando na verdade prefere fechar com Cunha mediante dois compromissos: a continuidade das investigações sobre a Petrobrás e a não obstrução de projetos contrários aos interesses do governo.Por enquanto, os supostos governistas se mantêm "em guarda". Logo, porém, dirão com menor ou maior clareza como será o seu modo preferencial de atuar. Não se iludam: assim a onça sempre beberá esteja ela na beira ou à distância do regato.

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