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Uma coisa é outra coisa

Por Dora Kramer
Atualização:

As pesquisas Datafolha e CNI/Ibope constatam o esperado: com o agravamento da crise econômica, materializada aqui nas más notícias sobre o PIB do último trimestre de 2008, aumenta a apreensão das pessoas e diminui o grau de tolerância geral. Quem pouco ligava para desvios éticos fica mais sensível a notícias sobre corrupção, quem estava seguro no emprego consumindo ao ritmo de 36 prestações mensais "sem juros" começa a se inquietar e a querer cobrar do governo uma providência antes que o pior aconteça. Quem admirava a habilidade do presidente da República em se desviar das crises políticas tende a exigir mais sobriedade na administração da adversidade econômica, a cotejar palavras com rigor a fim de conferir se há relação entre a realidade vivida e os discursos ufanistas. Seria, pois, de espantar se a popularidade do presidente Luiz Inácio da Silva não registrasse um abalo. A palavra "queda" soa um tanto superlativa ante a oscilação de cinco pontos porcentuais, em média, nas duas pesquisas. Se no ambiente geral adverso Lula ainda conseguisse mais pontos positivos na avaliação pessoal, aí não seria presidente, mas um santo a operar o milagre da felicidade na crise econômica. Para quem é popular entre mais de 60% da população, cinco pontos a mais ou a menos não faz diferença. A questão que ao governo federal aflige - ou pelo menos deveria - é o comportamento futuro desses índices e como eles vão repercutir no papel que Lula pretende cumprir na História. Desse ponto de vista, muito mais importante que a queda do índice de popularidade é o abalo no grau de confiança da população na figura do presidente e, por consequência, no governo. Segundo o Ibope, houve redução de seis pontos porcentuais no quesito de novembro a março. Popularidade e confiabilidade são conceitos diferentes. Lula é popular por uma série de razões que não necessariamente guardam relação com seus reais atributos de governante. É o personagem preponderante na política, está todos os dias nos jornais, na televisão, no rádio, seu nome é dito e repetido em toda parte, a todo instante. Popularidade se ganha, se perde e se recupera com relativa facilidade, bastando saber manejar com competência circunstâncias, emoções, características culturais do ambiente, simbologias e atributos pessoais. Confiabilidade é outra coisa. É prima-irmã da credibilidade e, uma vez perdida, dificilmente é retomada. Principalmente se a perda é acelerada como a registrada na pesquisa Ibope. O instituto Datafolha apontou o detalhe objetivo: 50% da população não acredita na afirmação do presidente Lula de que a crise econômica passaria pelo Brasil como uma "marolinha". Há três meses, 39% diziam confiar naquelas palavras. Essa é a perda consistente e que poderá influir no desempenho eleitoral do candidato governista à Presidência em 2010, seja a ministra Dilma Rousseff ou qualquer outro nome. Se o presidente fiador da candidatura é popular, a eleição municipal de 2008 mostrou que aos olhos do eleitorado isso não tem necessariamente influência sobre a opção de voto. A qualidade é pessoal e intransferível. Agora, se o chefe do governo não é confiável, a desconfiança tende a contaminar a candidatura, pois ela é uma representação institucional. Uma característica fala sobre a simpatia despertada pela pessoa física, a outra diz respeito à avaliação de desempenho da figura jurídica. Lula chegando com altos índices de popularidade em 2010, tanto melhor para a candidatura oficial. Mas, chegar lá com um grau razoável de confiabilidade será essencial. Mais não seja, para entrar pela porta da frente na História. Agenda do eleitor Os índices de intenção de votos nos prováveis candidatos a presidente em 2010 se mantiveram praticamente os mesmos em relação à última pesquisa do Datafolha. A economia mexeu com a avaliação do presidente, mas passou longe da eleição. Indica que o governador José Serra talvez esteja certo em resistir aos apelos para entrar na campanha eleitoral desde já. No momento, a crise está em primeiro lugar na escala de prioridades do eleitorado. A dianteira de Serra, com 41% das preferências, contra 17% de Aécio Neves, 16% de Ciro Gomes, 11% de Dilma Rousseff e 11% para Heloísa Helena, também explica por que o governador não quer antecipar o embate. Os oponentes, em desvantagem, precisam se movimentar. Mas a ele a paralisia favorece. No mínimo não corre o risco de provocar alterações de humor eleitoral numa hora em que o mar não está para peixe. Resistência A ex-senadora Heloisa Helena está fora de cena há mais de dois anos. No entanto, resiste emparelhada com Dilma Rousseff, em cena diariamente há um ano.

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