Um condomínio em Interlagos e casas na Guarapiranga; família Tatto acumula 31 imóveis

Patrimônio imobiliário se espalha por bairros da capital e cidades do litoral paulista; clã não se enriqueceu com a política, diz Jilmar

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Por Luiz Vassallo
4 min de leitura

Um dos pioneiros a chegar em São Paulo, o irmão mais velho do clã, Antoninho Tatto, nunca se aventurou na política. Empenhou-se no trabalho no escritório de contabilidade e na atuação na Pastoral do Dízimo da Igreja Católica, que se dedica a convencer fiéis ao pagamento da contribuição. Foi Antoninho que, nos anos 1980, passou a adquirir terrenos às margens da represa Guarapiranga, e ao lado do Clube de Campo São Paulo. 

No começo, era tudo mato. Aos poucos, os Tattos construíram pelo menos seis casas no quarteirão, que chegam a mil metros quadrados de área construída, com piscina e até cinco quartos. Por lá, têm ou já tiveram imóveis Enio, Arselino e Jilmar, além de Antoninho. Imóveis do quarteirão dos Tattos chegam a ser anunciados por até R$ 3,5 milhões em uma imobiliária que pertence à família. 

Jilmar se mudou de lá. Os constantes ataques de mosquitos e a distância do centro de São Paulo pesaram. “Minha filha tem marquinhas na perna até hoje”, disse o secretário nacional de Comunicação do PT, que passou a morar na região da Vila Mariana. Um de seus imóveis – um apartamento de 222 metros quadrados e quatro vagas de garagem –, próximo ao Parque do Ibirapuera, tem valor de mercado de R$ 4 milhões. Foi comprado por R$ 926 mil em 2009.

Quarteirão onde a família Tatto construiu casas, com piscinas e até cinco quartos, às margens da represa Guarapiranga, na zona sul. Foto: Werther Santana/Estadão - 16/2/2022

O apartamento, e outros dois imóveis – uma casa de quase 400 metros quadrados, com piscina de 28 metros, em um condomínio de Bertioga; e um terreno de 2 mil metros quadrados em Jacareí – foram transferidos por Jilmar à Asteca Holding, uma sociedade anônima que tem seus filhos como donos. Quando se candidatou a prefeito, em 2020, ele declarou R$ 126 mil em patrimônio – nenhum imóvel foi incluído. “Eu estou na política. E tem muito essa coisa de arrastar bens. Então, eu podia perder tudo. E eu fiz isso, mas não tenho apego, nem sofro nenhum processo de improbidade”, disse Jilmar ao Estadão. Questionado se a família enriqueceu com a política, ele afirmou: “Quem não entrou está melhor”.

Propriedade

Os Tattos ainda são donos do condomínio Ville Reseda, em Interlagos, que tem sete casas com 150 metros quadrados cada, três quartos e três vagas de garagem. Uma dessas casas está anunciada por R$ 850 mil e tem uma torneira de chope. Ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Arselino, que é um dos donos do condomínio, declarou uma participação de R$ 5 mil na empresa, sem detalhar os imóveis. No total, declarou ter R$ 664 mil em bens nas eleições de 2020. 

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Outro imóvel da lista é uma casa no Guarujá comprada em 2009, por R$ 400 mil, por Antoninho – os irmãos também frequentam o local. Todo o terreno tem 500 metros quadrados. Antoninho, aliás, é o campeão de imóveis. É dono de sete na capital, além da casa no Guarujá. Seu escritório de contabilidade fica em um casarão de esquina em Santo Amaro, de 294 metros quadrados. 

A reportagem procurou Antoninho Tatto em seu escritório. Ele não quis se manifestar. Jilmar afirmou que a criação de holding é legal e fruto do aconselhamento de seus advogados.

Imigrantes

Nos anos 1950, o distrito gaúcho Frederico Westphalen era habitado por imigrantes italianos, e dividido em pequenas propriedades rurais. O agricultor Jácomo Tatto tinha um moinho para moer trigo. Na estiagem, os rios secavam. Jácomo, sua esposa, Ignês, e oito filhos, caçavam água em nascentes para sobreviver. Com a subsistência ameaçada, a família se mudou nos anos 60 para Corbélia, no norte do Paraná. Por lá, tiveram de aprender português nas escolas - até então, falavam o “talian”, dialeto dos colonos italianos.

O segundo mais velho, Leonide, foi o primeiro a se mudar para São Paulo. Fez as malas e partiu para Araraquara, onde arriscou o início de uma carreira de futebol. Habilidoso, jogava na meia-direita, e chegou a treinar na Ferroviária. Mas, acabou convencido pela mãe a deixar os gramados e entrar para o seminário.

No início dos anos 70, Leonide, os irmãos e os pais migraram novamente. Desta vez para uma região periférica da zona sul da capital paulista. Os irmãos Tatto se envolveram com as Comunidades Eclesiais de Base - grupos da igreja católica que auxiliavam os mais carentes que acabaram politizando jovens à esquerda em meio à ditadura militar. Apoiaram greves nas fábricas, apanharam da polícia, e descobriram, anos depois, que foram fichados pelo DOPS. “Fui chamado de 'homem perigoso' na minha ficha", conta ao Estadão Leonide. “Levamos tanta porrada”, lembra.

Dono de um escritório de contabilidade, Leonide ajudou com a papelada para registrar centrais sindicais, movimentos sociais, e os primeiros diretórios do Partido dos Trabalhadores. Chegou a deixar seu irmão, Jilmar, tomando conta do PT na Zona Sul, a pedido de Zé Dirceu. Pelo partido, o ex-seminarista tentou se eleger duas vezes nos anos 80, mas foi derrotado. Incentivou os irmãos a fazerem o mesmo e elegeu cinco.

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Hoje, o clã é um dos mais influentes da política paulista. Seu reduto eleitoral, a Capela do Socorro, que engloba bairros que se formaram às margens de represas na Zona Sul, é chamado informalmente de “Tattolândia”. Seu crescimento se deu a partir de movimentos de migração de outras regiões do País para trabalhar em fábricas do polo industrial de Jurubatuba.

A influência política dos Tatto se dá nestas comunidades, muitas em situação irregular, em regiões de mananciais. "São Paulo criou uma região de fábricas, vieram moradores do nordeste, e aí depois reclamam que tem moradores nas zonas de mananciais, que é do lado. Onde é que o povo vai comprar terreno barato?", indaga Leonide.

Indicado pela ex-prefeita Luíza Erundina, Leonide Tatto chegou a comandar a subprefeitura da Capela do Socorro no fim dos anos 80. No cargo, foi acusado pelo Ministério Público de incentivar invasões irregulares em áreas de manancial. Nunca houve julgamento. “Abri uma rua para coleta de lixo. Esse é meu crime”, diz. “Pago advogado há 28 anos”.

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