Um ano após CPI, Serraglio lamenta falta de punições

Relator de CPI diz que ´nossa Justiça é lenta´ e lembra a denúncia do procurador

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Por Agencia Estado
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Há um ano, a CPI dos Correios terminava com a aprovação de um relatório contundente que propôs o indiciamento de 124 pessoas, entre elas os ex-ministros José Dirceu e Luiz Gushiken, e a cassação por falta de decoro parlamentares de 17 deputados. Nenhum dos envolvidos foi punido. Houve a denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, uma semana depois do fim da CPI. Souza concluiu que o mensalão era operado por uma "sofisticada organização criminosa", envolvendo 40 pessoas; que o "chefe do organograma delituoso" era o ex-ministro José Dirceu; e que do núcleo principal da "quadrilha" faziam parte três ex-dirigentes petistas: José Genoino, Delúbio Soares e Silvio Pereira. Mas até agora, o Supremo Tribunal Federal ainda não apreciou a denúncia. Ou seja: não há processo, nem réus. O relator da CPI, Osmar Serraglio (PMDB-PR), hoje primeiro secretário da Câmara, apontou a Visanet uma das fontes de recursos do chamado "valerioduto", que abasteceria o pagamento de propina a parlamentares - conhecido como "mensalão". Em entrevista ao Estado, Serraglio reconhece que a Justiça brasileira é lenta e que nenhum dos envolvidos foi punido até agora. Mas, otimista, diz que hoje a população "respira política" e está mais crítica e exigente em relação aos parlamentares. Estado - Hoje faz um ano que o relatório final da CPI dos Correios foi aprovado. Qual o seu balanço sobre o episódio? Serraglio: Há resultados palpáveis. A Polícia Federal, por exemplo, confirmou tudo que nós levantamos em relação à Visanet. É importante o caso da Visanet porque é a identificação de fontes de recursos públicos que foram conduzidos para o "valerioduto". O último laudo da Polícia confirma os desvios, a liberação antecipada sem programa de aplicação dos recursos, sem exigência de prestação de contas. Identificaram que, pelo menos, R$ 39 milhões estão em aberto. Além disso, a população também está hoje mais crítica e exigente em relação aos políticos. Estado - Mas vários políticos envolvidos com o mensalão foram eleitos no ano passado e estão de volta à Câmara. Serraglio: Essas pessoas não tiveram votações expressivas. Todos eles eram figuras de primeira linha antes da CPI. E hoje não se pode dizer que eles são comandantes do destino da Câmara. Antes, todos eles tinham posições estratégicas. Agora, nem voltaram fortalecidos. Vão demorar muito tempo para se firmarem novamente. Se é que a população vai dar essa oportunidade mais vezes. Estado - Apesar de não ter disputado as últimas eleições, o ex-deputado José Janene, um dos envolvidos com o mensalão, acabou de ser eleito tesoureiro do PP. Serraglio: Há uma contradição que pode comprometer a aposentadoria por invalidez do Janene. Acho que ele tem de perder essa aposentadoria porque se ele pode conduzir os recursos de um partido, com R$ 8 milhões, ele não é incapaz nem inválido. Ele foi aposentado por invalidez. Significa que ele não pode atuar. Ele vai administrar R$ 8 milhões, que é a participação do fundo partidário do PP. Já fui provocado a refletir sobre isso. Um cara aposentado por invalidez pelo INSS, perde a aposentadoria se voltar a trabalhar. Estado - O inchaço do PR (ex-PL), com a transferência de 16 deputados para o partido entre as eleições de outubro do ano passado e março último, sinaliza um novo mensalão? Serraglio: Seria um preconceito meu se eu já qualificasse isso como sendo mensalão. De qualquer forma é uma coisa equivocada. A Câmara está fazendo um esforço enorme para que nós possamos recuperar o nosso conceito e a credibilidade da instituição. Essas migrações, ainda que bem intencionadas, não têm uma tradição que possa ser assimilada como normal. Estado - Na parte final do relatório da CPI, havia um série de recomendações e sugestões de projetos para evitar o uso de verbas públicas irregularmente. Essas propostas acabaram engavetadas. Serraglio: Esses projetos, de certo modo, hibernaram porque passamos um período atípico: eleições, mudanças de presidentes de comissões e agora esse embate em torno da CPI do Apagão Aéreo. São projetos importantes que propõem limites de gastos com publicidade, com cargos em comissão, além de mudanças de regras em relação à improbidade administrativa, deixando mais clara quando se trata de desvios com publicidade. Imagino que até junho a gente avance bastante. Estado - A Justiça não está sendo muito lenta para punir os envolvidos no escândalo do mensalão? Protagonistas do mensalão continuam soltos, como o Duda Mendonça e o Marcos Valério. Serraglio: A nossa Justiça é lenta. Tem casos aí que estão pendentes há 10, 20 anos. A gente confia que a Justiça pelo menos atue. Se há uma coisa que incentiva a criminalidade é a convicção de impunidade. O que conduz à impunidade é a não eficiência da Justiça. Agora, você realmente não tem agilidade. Basta ver que até agora, as 40 pessoas denunciadas pelo procurador da República, há um ano, não foram sequer denunciadas. Eles estão ainda em uma defesa preliminar.

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