PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Um olhar crítico no poder e nos poderosos

Opinião|Trem desgovernado

Com tantas decisões polêmicas, quem põe em mesa a prisão em 2.ª instância?

Foto do author Eliane Cantanhêde
Atualização:

O Supremo Tribunal Federal parece um trem desgovernado, com decisões exóticas, incompreensíveis, mesmo por quem acompanha, de dentro, essa área tão sensível. A última delas é o envio do processo contra o “quadrilhão do PT” para a primeira instância do Distrito Federal. 

PUBLICIDADE

Nesse inquérito, os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, os ex-ministros Antonio Palocci e Guido Mantega e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto são investigados pelo desvio de R$ 1, 48 bilhão da Petrobrás. Logo, o inquérito é sobre a Lava Jato, mas quem o enviou à primeira instância foi justamente o relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin.

Ele alega que os envolvidos não têm mandato nem foro privilegiado e estavam lá porque a senadora Gleisi Hoffmann também é alvo. Agora, foram para a primeira instância e ela ficou no STF.

É possível fatiar um processo por organização criminosa, uns numa instância, outros na outra? Se o inquérito é parte da Lava Jato, por que foi para o DF, não para o juiz Sérgio Moro, que concentra esses processos em Curitiba? E é pura coincidência que esse inquérito tenha ido para o DF após a criação de uma nova turma? 

O trio de juízes da Lava Jato inclui Moro, Marcelo Bretas, do Rio, e Vallisney de Souza Oliveira, da 10.ª Vara, em Brasília. Quando essa Vara foi dividida em duas e casos de poderosos tirados de Vallisney e transferidos para a nova Vara – inclusive os três contra o próprio Lula –, todo mundo ficou com a pulga atrás da orelha. É como se a Lava Jato tivesse sido retirada de Moro e tudo recomeçasse do zero.

Publicidade

A reação foi tanta que houve um recuo e os processos já em andamento, como os de Lula, voltaram para Vallisney. E agora, o “quadrilhão do PT” vai para Vallisney ou para a nova Vara?

Há, também, uma incompreensível queda de braço entre o ministro Luís Roberto Barroso e o presidente Michel Temer. Assim como Fachin havia recebido a denúncia da PGR contra Temer e tocado adiante autocraticamente, Barroso quebrou o sigilo bancário do presidente da República sem consultar o plenário. A procuradora-geral, Raquel Dodge, não havia pedido a quebra de sigilo, mas Barroso preferiu a sugestão de um delegado da Polícia Federal.

Temer ficou irritadíssimo, e o ministro Torquato Jardim argumentou que a quebra de sigilo é a partir de 2013, mas Temer assumiu em 2016 e presidentes não podem ser investigados por atos anteriores ao mandato. Há controvérsias...

O Planalto entrou no Supremo pedindo a Barroso a íntegra da sua decisão, para que Temer tenha ao menos o direito de saber por que e para quê uma medida tão drástica. Reação de Barroso: acusou a defesa de Temer de ter violado o sigilo de uma decisão do STF e mandou abrir inquérito para apurar essa eventual violação. Quebrar o sigilo bancário do presidente pode. Quebrar o sigilo de uma decisão de ministro do STF é ilegal. Mas a avaliação geral é de que ele se precipitou.

Segundo o Planalto, foi tudo razoavelmente simples: o site da revista Veja publicou a decisão de Barroso e a equipe de Temer foi buscar a informação original, primária, no site do próprio STF. A partir da data e da autoria de Barroso, chega-se ao número do processo e ao próprio processo. Os repórteres que cobrem Judiciário sabem bem como é.

Publicidade

De quebra, o TSE censurara perguntas nas pesquisas eleitorais, mas a gritaria foi ensurdecedora e ontem foi obrigado a voltar atrás. Fazer pesquisa de votos sem a metodologia que reproduz o equilíbrio do eleitorado seria liquidar a eficácia e a credibilidade das pesquisas.

Nesse trem desgovernado, que ministro vai entrar na contramão, contrariar uma decisão da presidente Cármen Lúcia e pôr em mesa a revisão da prisão após segunda instância? Algum voluntário?

Opinião por Eliane Cantanhêde

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.