The Economist compara Bolsonaro ao mexicano de esquerda López Obrador na crise da coronavírus

Publicação faz uma análise sobre a 'sabedoria e a falta de juízo dos líderes da América Latina'

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Por Célia Froufe (Broadcast)
Atualização:

LONDRES - A revista britânica The Economist comparou na coluna Bello a postura do presidente brasileiro Jair Bolsonaro em relação à pandemia de coronavírus a do presidente de esquerda do México, Andrés Manuel López Obrador, frequentemente chamado de AMLO.

A publicação faz uma análise sobre a “sabedoria e a falta de juízo dos líderes da América Latina” e, do segundo grupo, apresenta os dois políticos chamados de populistas, ainda que um seja identificado como de direita e o outro, de esquerda. “Ambos deram prioridade à proteção de economias fracas. Ambos passaram semanas negando a seriedade do vírus e se recusando a respeitar as medidas de distanciamento social recomendadas por seus ministérios da saúde”, apontou o semanário.

Andrés Manuel López Obrador, presidente do México, durante coletiva de imprensa no Palácio Nacional, Cidade do México. Foto: Mario Guzmán/EFE

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No México, segundo opinião colhida da revista com Alberto Díaz-Cayeros, cientista político da Universidade de Stanford, a cautela do governo estava enraizada na confiança na capacidade do serviço de saúde de lidar com a ameaça. Essa abordagem, conforme o texto, funcionou contra a gripe suína em 2009, mas subestimou a Covid-19, que se espalha de forma agressiva, com muitos casos sem sintomas. Em 24 de março, o governo recuou, fechando as escolas e proibindo atividades não essenciais. Seis dias depois, com o vírus fora de controle, declarou estado de emergência.

AMLO, de acordo com a The Economist, confundiu a mensagem sobre o distanciamento social. “Bolsonaro foi além, sabotando ativamente os esforços para controlar o vírus”, comparou. No Brasil, lembrou a coluna, os governadores estaduais impuseram bloqueios, inclusive em São Paulo e no Rio de Janeiro. “Essas medidas são populares. A negligência de Bolsonaro é menos”, citou, informando que os protestos contra o presidente nas cidades.

Houve, então, um contra-ataque: Bolsonaro criticou os governadores, publicou um vídeo proclamando "O Brasil não pode parar" e instou os apoiadores a organizarem manifestações contra as quarentenas, mencionou a revista. Somente em 31 de março, com 201 mortes no Brasil, ele reconheceu por um breve período a seriedade do vírus, pedindo um "pacto" contra a doença "para salvar vidas sem deixar empregos para trás". Depois, voltou à retórica anterior.

Consequências

Bello questiona quais serão as consequências políticas dessas ações. “Embora ainda seja popular, o índice de aprovação de AMLO estava diminuindo antes do vírus, devido ao seu fracasso em impedir o crime ou em reavivar a economia. Essa tendência parece continuar”, previu.

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“Quanto a Bolsonaro, alguns acham que suas ações merecem impeachment por ameaçar o direito constitucional à vida”, explicou a revista, acrescentando, porém, que sua estratégia parece ter como objetivo sustentar sua base. “Pesquisas mostram que ele mantém o apoio de um terço dos entrevistados. Isso deve ser suficiente para manter seu cargo, dependendo de quantos brasileiros morrem”, considerou.

Entre os apontados como os que fizeram um bom trabalho na América Latina até agora está Martín Vizcarra, que assumiu o cargo de presidente do Peru, há dois anos. Desde então, segundo a The Economist, não hesitou em tomar decisões ousadas e foi o primeiro líder da região a reagir à Covid-19, impondo um bloqueio e um toque de recolher, em 15 de março, quando seu país tinha apenas 71 casos relatados. Seu índice de aprovação aumentou de 52% para 87%.

Padrão

Esse é o padrão na América Latina, afirma o semanário. Na Argentina, Alberto Fernández, que assumiu um país politicamente dividido em dezembro, viu sua popularidade subir para mais de 80% depois de impor uma quarentena e fechar fronteiras. Na Colômbia, a nova prefeita de Bogotá, Claudia López, impôs um bloqueio para avaliação por quatro dias, enquanto o governo nacional estava hesitante. Sebastián Piñera, do Chile, cuja presidência parecia moribunda após protestos, enviou testes e isolou pontos de acesso. Sua popularidade aumentou, passando de 10% em dezembro para 21%.

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“Aqueles que agiram decisivamente estão se beneficiando do instinto do público de seguir seus líderes em um momento de perigo. Mas sustentar as quarentenas em uma região onde muitos vivem precariamente será difícil”, considerou a publicação. Na Argentina, onde Fernández já enfrentava uma economia abalada, precisou ofertar dinheiro e comida em áreas pobres na periferia de Buenos Aires. Mesmo assim, os peronistas "estão muito preocupados, temem uma explosão social e também perderem o controle", disse ao veículo britânico o consultor político Sergio Berensztein. Para ele, o governo pode precisar tornar a quarentena mais seletiva e flexível, correndo o risco de prolongar a epidemia. O mesmo vale para o Peru.

A The Economist avaliou que a Covid-19 atingiu a América Latina quando seus líderes e instituições caíram em descrédito, por causa da estagnação econômica, corrupção e maus serviços públicos. O gerenciamento da pandemia, continuou, requer um grande esforço para ajudar os necessitados. Também pode oferecer uma oportunidade de redenção. Líderes que impõem quarentenas poderiam salvar a vida de 2,5 milhões de latino-americanos, de acordo com epidemiologistas do Imperial College, em Londres. “Eles precisam encontrar maneiras de fazer com que os cidadãos se lembrem disso, mesmo quando as dificuldades econômicas o afetam.”

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