Suspensão de retirada revolta índios em Roraima

Para líder indígena, Supremo deu sinal verde para a violência

PUBLICIDADE

Por Roldão Arruda e BOA VISTA
Atualização:

A Polícia Federal começou ontem a desarticular a Operação Upatokon 3, que mobilizou desde 27 de março quase 500 homens com o objetivo de retirar os grandes arrozeiros instalados no interior da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Enquanto os arrozeiros e o governador comemoravam a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspendeu a retirada dos não-índios da reserva, entre os indígenas o clima era de revolta. "Senti raiva quando soube da liminar", disse Dionito de Souza, coordenador-geral do Conselho Indigenista de Roraima. "Os arrozeiros recorreram à violência, ao terrorismo e à guerrilha para atropelar a lei, para pisar naquilo que está escrito na Constituição do País, e acabaram sendo premiados com essa liminar que favorece os interesses deles." Para Dionito, da etnia macuxi, o STF deu sinal verde para a violência. Em Surumu, a 180 quilômetros de Boa Vista, líderes indígenas, reunidos ali desde a semana passada, protestaram. "Não merecíamos isso, depois de 30 anos de lutas pela conquista da nossa terra", disse o dirigente Ednaldo Pereira André. "É por causa disso que os povos estão cada vez mais decididos a fazer a desintrusão por conta própria." Os índios reivindicam a desocupação da reserva desde 15 de abril de 2005, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva homologou a criação do território, que foi demarcado em 1998 por Fernando Henrique Cardoso. INVESTIGAÇÃO Ontem os arrozeiros começaram a desmontar o cenário de guerra que haviam erguido para impedir a entrada da PF na terra indígena. Na entrada de Surumu, um grupo de homens trabalhou durante todo o dia. Sobre a principal ponte de acesso ao distrito, com um vão de 132 metros em concreto, podiam ser vistas caixas com bombas caseiras, tratores, máquinas e implementos agrícolas, galões com óleo queimado, lanças de madeira, sacos de terra usados como trincheira. Segundo Paulo César Quartiero - o arrozeiro que organizou a resistência - , o ocorrido na ponte sobre o Rio Surumu foi um marco histórico: "O que aconteceu aqui vai servir para estancar essa política de esvaziamento da Amazônia com a criação de terras indígenas. É um divisor de águas." Mesmo com a operação desativada, a PF vai deixar alguns agentes na cidade. A missão é apurar responsabilidades pela destruição de patrimônio público. EXÉRCITO O Exército esteve na iminência de intervir no conflito entre os arrozeiros e a PF. Ao amanhecer da quarta-feira, dois veículos militares estiveram nas proximidades de Surumu, para analisar a situação. O objetivo do Exército era intervir como força pacificadora - mesmo que para isso tivesse que recorrer a pára-quedistas. Na mesma quarta-feira, porém, o STF concedeu liminar a um pedido do governo de Roraima, suspendendo a operação da PF. O Exército não quis participar da operação de retirada dos arrozeiros. E tanto entre oficiais da reserva como da ativa têm sido feitas críticas à forma como são demarcadas as terras indígenas na Amazônia.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.