PUBLICIDADE

Análise: Julgamento do mensalão invadiu o imaginário social

Ao longo do julgamento era possível presenciar uma montanha-russa de otimismo e pessimismo em relação aos rumos do País

PUBLICIDADE

Por Rubens Glezer
Atualização:

Por que o julgamento do mensalão chamou tanto a atenção da nação? Muitos dizem que esse fenômeno foi fruto de atenção exagerada da mídia, ou de um movimento político contra a subida e manutenção do PT na Presidência da República. Ainda que se considere corretos esses fatores, eles não são capazes de explicar, por si só, o grau de relevância que o julgamento assumiu no imaginário social e no dia a dia das pessoas. Como explicar máscaras de carnaval com rostos de ministros do STF ou conversas de boteco sobre o cabimento de embargos infringentes? O julgamento do mensalão foi importante para as pessoas porque comunicava - e comunica - aspectos cruciais do que vivenciamos e pensamos sobre política e democracia.

PUBLICIDADE

Ao longo do julgamento era possível presenciar uma montanha-russa de otimismo e pessimismo em relação aos rumos do País. Antes do julgamento, imperava a noção de que tudo acabaria na mais clássica pizza. Durante as sessões de votação, houve uma clara mudança na percepção pública: poderia ser o fim de uma era de impunidade aos poderosos da alta cúpula política e econômica. Porém, já com a fase de recursos, as mudanças na composição do Tribunal que geraram revisões importantes no julgamento e a decretação e cumprimento das penas, sobrou um sentimento de ambiguidade: será que superamos a cultura da impunidade dos poderosos? Será que políticos de outros partidos seriam punidos igualmente? A prisão em regime semiaberto é um resultado realmente importante?

Esse mesmo ciclo de expectativas exageradas e um final ambíguo aparecem em outras partes da cena política brasileira. As manifestações de junho e a apropriação do mecanismo de protestos pelos mais diversos conjuntos sociais, com os mais distintos interesses e realizadas nas mais diferentes formas, também deixam hoje um espírito de incerteza. Algo muito semelhante pode ser dito sobre a relação com o Legislativo e o seu inquietante período de extraordinária atividade e votação sobre a reforma política. O que dizer então da Operação Lava Jato, com prisões de diretores de grandes empreiteiras, ocorrendo em torno da ambígua figura do juiz Sérgio Moro?

Ministro do STF Ricardo Lewandowski atrás da ministra Ellen Gracie Foto: Celso Júnior/AE

Em meio a tudo isso, a população precisa se apropriar de informações sobre lavagem de dinheiro, financiamento de campanha, sistema proporcional e distrital de eleição e outras questões que afetam os rumos da democracia.

Precisamos ser capazes de discutir o que é mais adequado para uma vida boa e uma sociedade plural e diversa, levando em conta a ação social e de todos os Poderes. Parece que a política (no melhor sentido) foi ressuscitada no cotidiano e o julgamento do mensalão fez parte desse processo. Porém, para essa política se manter viva, é preciso apreender com uma grande lição do mensalão: não é possível manter o tecido social se tomamos posições e discutimos à moda do que fizeram os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski. Política não é Fla-Flu e precisamos ser melhores que isso em prol de uma sociedade democrática.

RUBEN GLEZER É PROFESSOR E COORDENADOR DO SUPREMO EM PAUTA DA FGV DIREITO SPP

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.