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STF fecha acordo para abafar crise da troca de mensagens

Nos diálogos, Cármen Lúcia e Lewandowski falam de influência política, combinação de votos e suspeitas

Foto do author Leonencio Nossa
Por Leonencio Nossa , Eugênia Lopes e BRASÍLIA
Atualização:

Diante da revelação do conteúdo de mensagens eletrônicas trocadas entre dois ministros no histórico julgamento da denúncia do mensalão, os dez integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) fecharam ontem às pressas um acordo para pôr "panos quentes" na crise. O diálogo entre os ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, registrado na quinta-feira pelo fotógrafo do jornal O Globo Roberto Stuckert Filho, mostrou acusações de bastidores, suspeitas de influência política, combinação de votos, intrigas e fofocas. A troca de mensagens, na quarta-feira, alterou o clima até então tranqüilo e enfadonho do plenário num dos mais aguardados e importantes julgamentos do Supremo. Embora o tribunal esteja hoje dividido em grupos, os ministros não esconderam a perplexidade com a troca de mensagens, que já está sendo considerada, de forma irônica, a grande crise do STF na era digital. Mesmo os ministros considerados "independentes" avaliaram que era melhor um acordo, pois não dava para saber aonde a crise poderia chegar. O acordo foi sendo costurado ao longo do dia, em uma série de conversas. A reunião informal mais longa para discutir a inesperada e inédita crise ocorreu ontem, depois do almoço, no hall de entrada do Supremo. Foi comandado pela presidente do STF, Ellen Gracie. O que causou mais perplexidade, segundo ministros, assessores e advogados, foi o trecho em que Cármen Lúcia diz a Lewandowski que o ministro Eros Grau iria rejeitar a denúncia contra os 40 acusados de participar do esquema do mensalão. Lewandowski responde com uma acusação: "Isso só corrobora que houve uma troca." Esse trecho do diálogo foi antecedido por impressões sobre a escolha do substituto do ministro Sepúlveda Pertence, que se aposentou na semana passada. Os integrantes do STF são escolhidos pelo governo e aprovados pelo Senado. Um ministro interpretou que Lewandowski estava acusando o grupo ligado ao ministro da Defesa e ex-membro do STF Nelson Jobim - formado pelos ministros Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Eros Grau - de negociar com o governo a indicação de um nome para ocupar a cadeira vaga, em troca da rejeição da denúncia contra os aliados influentes do Palácio do Planalto. Um dos cotados para ocupar a vaga de Pertence é o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Carlos Alberto Menezes Direito, jurista ligado ao grupo que, segundo a troca de mensagens, terá grande poder no tribunal nos próximos três anos. Cármen ainda disse a Lewandowski que eles estavam com um problema na primeira turma - os ministros do tribunal se dividem em duas turmas para examinar os processos -, que passou a ser presidida pelo ministro Marco Aurélio. A ministra afirmou ainda a Lewandowski que o relator do caso do mensalão, Joaquim Barbosa - primeiro negro a ocupar uma cadeira no Supremo - daria um "salto social" após apresentar o voto dele. REUNIÃO Ellen Gracie decidiu marcar um encontro informal após ser surpreendida pela sustentação oral do advogado José Francisco Corrêa Barbosa, que defende o deputado cassado e pivô do escândalo do mensalão Roberto Jefferson (PTB-RJ). Diante do plenário, Corrêa Barbosa foi ousado ao ironizar a troca de mensagens ocorrida no dia anterior, especialmente no momento em que advogados faziam a sustentação. "Isso é uma alegria, que não diminui a corte, o que houve foi o reconhecimento do trabalho das partes", ironizou. Cármen ouviu o advogado com bastante atenção. Na maior parte da sessão, ela ficou com as mãos na boca e gestos de reflexão. As conversas já tinham surtido efeito pela manhã. O ministro Carlos Ayres Britto minimizou em entrevista a revelação da troca de mensagens. "Aqui não existe arranjo, não existe alinhamento, ninguém se alinha com ninguém", disse. "Faz parte da rotina dos ministros trocar impressões, mas não adiantamos votos. Vamos tocar esse barco para frente." Ayres Britto ressaltou, também, que as decisões dos ministros são solitárias. "Quando um juiz decide, ele decide solitariamente, sentadinho, de acordo com sua própria consciência." E ainda explicou que, como às vezes as sessões são muito demoradas, eles "trocam impressões".

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