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STF abre ação contra 19 e livra Dirceu da denúncia de desvio

Decisão alcançou núcleo do chamado valerioduto, em referência a Valério, que operava dinheiro do esquema

Por Eugênia Lopes e Leonecio Nossa
Atualização:

Terminou o terceiro dia de julgamento da denúncia do mensalão e o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu processo contra 19 dos 40 acusados no escândalo. A decisão alcançou todo o núcleo do chamado valerioduto, em referência ao publicitário Marcos Valério e que operava o dinheiro e os negócios do esquema de pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio político ao governo.   A presidente do STF, ministra Ellen Gracie, decidiu encerrar a sessão pouco antes das 19h30 e convocou mas dois dias de julgamento: segunda-feira, às 14 horas, e terça-feira, às 10 horas.   Veja também:   Dos 40 denunciados no mensalão, 19 já são réus Entenda o passo-a-passo do julgamento do mensalão Imagens do 3º dia de julgamento no Supremo Conjur explica diferenças de processo no caso dos mensaleiros  Tudo sobre o julgamento do caso mensalão   Na parte até agora mais importante do julgamento, o plenário aceitou por maioria os indícios de crimes apresentados pelo Ministério Público Federal contra Luiz Gushiken (ex-ministro da Secretaria de Comunicação), João Paulo Cunha (ex-presidente da Câmara e atual deputado do PT), o grupo do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e quatro dirigentes do Banco Rural.   Foi rejeitada por unanimidade, no entanto, a denúncia contra o núcleo político-partidário - formado por José Dirceu (ex-ministro e deputado cassado), Delúbio Soares (ex-tesoureiro do PT), Silvio Pereira (ex-secretário do PT) e o deputado José Genoino (ex-presidente nacional do PT). A rejeição diz respeito apenas aos contratos entre a Visanet e a DNA, empresa de Valério.   Por 6 votos a 4, o plenário acatou a denúncia de peculato contra Gushiken, um dos ministros mais influentes do primeiro governo Lula, por suposta ordem dada em 2003 ao então diretor de Marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, para antecipar um pagamento de R$ 73 milhões da Visanet (empresa da qual o BB é sócio) para a agência de publicidade DNA, do grupo de Valério.   Com base em dados da Polícia Federal e da CPI dos Correios, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, argumentou que o dinheiro do valerioduto teria como fonte a empresa Visanet, ligada ao Banco do Brasil. A prática de crime de peculato (apropriação de dinheiro público), prevê, para quem for condenado, penas de dois a 12 anos.   João Paulo Cunha, por sua vez, o primeiro petista a virar réu, vai ter de responder a crimes de peculato, lavagem de dinheiro e corrupção passiva. Por unanimidade, o plenário entendeu que há indício suficiente de peculato num contrato sem licitação firmado entre o então presidente da Câmara, no valor de R$ 252 mil, com a agência de publicidade DNA, de Marcos Valério. A agência não teria feito o serviço previsto no contrato.   A defesa de Cunha também não conseguiu livrá-lo de um processo por lavagem de dinheiro. A mulher do deputado, Márcia Regina, fez um saque de R$ 50 mil na boca do caixa numa agência do Rural, em Brasília, considerado suspeito pelo Ministério Público. Por lavagem de dinheiro, serão processados o deputado Paulo Rocha (PT-PA) e sua assessora Anita Leocádia, os ex-deputados João Magno (PT-MG) e Professor Luizinho (PT-SP).   Também viraram réus Marcos Valério e seus sócios Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, por crime de peculato, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Um terceiro sócio de Valério, Rogério Tolentino, vai responder apenas por lavagem de dinheiro. As funcionárias do grupo de Valério Simone Vasconcelos e Geiza Dias estão na lista dos réus por lavagem de dinheiro no esquema do mensalão.   O plenário ainda abriu processo contra a diretoria do Banco Rural. São acusados de prática de gestão fraudulenta - crime previsto na Lei do Colarinho Branco - os dirigentes Kátia Rabello, Vinícius Samarane, Ayanna Tenório de Jesus e José Roberto Salgado. Os dirigentes também foram enquadrados no crime de lavagem de dinheiro.   Anderson Adauto (ex-ministro dos Transportes e atual prefeito de Uberaba) e seu ex-assessor José Luís Alves serão processados por lavagem de dinheiro. Eles são acusados de receber R$ 1 milhão do esquema.   Gushiken   Por meio da Assessoria de Imprensa do Escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Advocacia, o ex-ministro Luiz Gushiken se manifestou a respeito da decisão do STF. Disse que o ministro-relator deixou claro que, se fosse hoje, o teria absolvido. "Quatro ministros revisaram o voto do relator, para dizer que não havia nem ao menos um indício confiável que apontasse a necessidade de abertura do processo para prolongamento das investigações contra minha conduta", alegou Gushiken.   Ele desqualificou as provas que foram colhidas com base em depoimento de Henrique Pizzolato. "(O) autor das declarações que convenceram parte da Corte Suprema a votar pela abertura do processo mentiu perante a CPMI (CPI dos Correios) quando se referiu à minha conduta, ainda que o tenha feito de maneira oblíqua e pouco clara".   Gushiken disse que move processo contra Pizzolato por essas declarações. "Pleiteio dele a devida recomposição moral, em face de todos os desdobramentos a mim prejudiciais que as absurdas declarações dele me causaram". Gushiken afirmou que nunca autorizou ou participou de qualquer desmando na gestão das verbas destinadas pelo Banco do Brasil ao Fundo Visanet.   "Respondendo à época pela função de ministro da Secom, não tinha poder legal ou mesmo condições materiais para fiscalizar a gestão dessas verbas, o que competia exclusivamente aos órgãos de controle interno do próprio Banco do Brasil e, em sede externa, ao Tribunal de Contas da União e ao Ministério Público".   Por fim, o ex-ministro disse que continua com sua consciência tranqüila. "Não participei de esquemas ou quadrilhas, não favoreci o desvio de recursos públicos e não descuidei de minhas obrigações legais. Continuo confiando firmemente na Justiça e em minha absolvição, pois vi, no julgamento de hoje, que há homens que não se atemorizam em fazer valer a verdadeira Justiça, sem paixões ideológicas e com a devida impessoalidade".   Valério e outros   O empresário Marcos Valério evitou comentar nesta sexta-feira, 24, a decisão do STF, que aceitou denúncia contra ele por corrupção ativa e peculato no processo do mensalão. "Tudo será respondido na Justiça", disse apenas, por meio de sua assessoria. Em seu escritório, localizado no bairro Savassi, região sul da capital mineira, ele recebia com freqüência notícias de assessores. Antes do início do julgamento, Valério chegou a dizer ao Estado que iria acompanhar as sessões da casa de um amigo, em Brasília. Sua assessoria, porém, negou a informação.   O sócio de Valério no escritório, o advogado Rogério Tolentino, escapou da ação penal por corrupção ativa, mas preferiu não falar, alegando "solidariedade" aos outros acusados. Dois sócios de Valério na agência SMPB Comunicação também foram nomeados réus no processo: Cristiano de Mello Paz, também por corrupção ativa e peculato; e Ramon Hollerbach Cardoso, por peculato.   Cristiano Paz assistiu pela manhã à sessão desta sexta-feira do STF de sua nova agência de publicidade: a Filadélfia. Procurado para comentar a decisão dos ministros do Supremo, o publicitário não atendeu aos pedidos de entrevista. Sua secretária disse que ele havia saído para o almoço e não retornara até o meio da tarde.   Hermes Guerreiro, advogado de Ramon Hollerbach Cardoso - que acompanha o julgamento do processo em Brasília -, disse que seu cliente, por enquanto, não pretende atender a imprensa. Ele manifestou surpresa com o acolhimento da denúncia contra Cardoso por peculato.   O Banco Rural divulgou nota comentando o acolhimento da denúncia por gestão fraudulenta contra a presidente Kátia Rabello e outros três dirigentes da instituição financeira. Conforme o comunicado, o banco "acredita na inocência de seus diretores e manterá a mesma transparência e o espírito de colaboração que pautaram suas decisões desde o início da chamada 'crise do mensalão'".   "Assim como fez até agora, a instituição sustentará sua defesa com argumentos reais e agirá com total serenidade até comprovar inculpabilidade", conclui a nota.   (Colaborou Eduardo Kattah, do Estadão)

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