Sonda que vai a Marte funciona em Vitória

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Por Agencia Estado
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Um brasileiro de 31 anos, filho de um ex-militar do Batalhão da Guarda Presidencial, de Brasília, é um dos 56 cientistas que atuarão na Nasa, quando a agência espacial americana lançar duas missões a Marte, no ano que vem. Esta é só uma das boas notícias sobre Paulo Antônio de Souza Júnior. A outra é surpreendente. Graças a ele, a capital do Espírito Santo, Vitória, é a primeira cidade do planeta Terra a ter uma sonda espacial a seu serviço. Não no espaço, mas dentro da própria cidade. A primeira missão a Marte, que partirá em maio, levará a sonda espacial Mimos. É um engenho que tinha o tamanho de uma máquina de xerox. Foi miniaturizado e agora não é maior do que um mouse de computador. Seu trabalho será identificar os minerais existentes em Marte e enviar rapidamente as informações à Terra. A Mimos foi desenvolvida na Alemanha, onde Paulo tem se preparado para defender tese de PhD. Ele trouxe uma cópia exata do engenho para Vitória, onde vive e trabalha. Agora, a Mimos está sendo empregada para identificar partículas que poluem o ar de Vitória. A região metropolitana da capital do Espírito Santo tem as fontes de poluição habituais das cidades grandes, mas não só isso. Estão lá, entre várias outras indústrias, três grandes siderúrgicas. Até agora, era preciso pegar o filtro coletor de poeira, da estação medidora de ar, e levá-lo para uma análise no laboratório. "Agora, o laboratório vai a campo", diz Paulo. A Mimos é colocada dentro do coletor de poeira e vai identificando os materiais que passam pelo coletor. Por exemplo, se a Mimos identificar partículas de pirita, um sulfeto de ferro contido no carvão, a fonte poluidora será o carvão. E assim com as partículas de outras fontes, como pedreiras, indústrias de cimento, metalúrgicas, o tráfego de veículos, construção civil e solos. Os dados seguem diretamente para um computador, onde são analisados. A sonda que sabe tudo Em suas missões espaciais, a Mimos também representará um avanço notável. Há cinco anos, em 1997, quando o robô Sojourner pousou em Marte, levava um analisador químico que realizava uma análise química do solo e das rochas marcianas. Este analisador identificava a composição química do que tocava em Marte. Mas não revelava detalhes de como esses elementos se ligavam, para formar os minerais. A sonda Mimos vai dar o serviço completo: identificará a composição química e, também, como os diversos elementos estão ligados. Em 1997, os cientistas, em terra, tinham de processar as informações para conhecer a constituição da rocha e do solo e que minerais continham. Isso demorava muito tempo. Às vezes, horas, às vezes dias. Agora, os dados da Mimos - como demonstraram testes em terra - podem ser analisados em poucos minutos. A rapidez é muito importante para a missão, como explica Paulo Antônio de Souza Júnior. O robô, com a Mimos acoplada a seu braço, pode ser comandado para fazer análises à noite e enviar suas informações pela manhã. Os cientistas precisam saber logo a composição mineralógica do material analisado, para decidir quais as análises que a Mimos deve fazer pelo resto do dia. Afinal, como um filho de militar, nascido em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, se envolveu com tudo isso? Em 1991, Paulo estava em Vitória. Seu pai havia dado baixa do Exército e comprado um hotel na cidade. O rapaz entrou para a Faculdade de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Espírito Santo. No quarto ano, achou que não era nada daquilo. Reiniciou os estudos, desta vez com ênfase em física. Em 1999 estava formado. Passou a trabalhar na Companhia Vale do Rio Doce, onde está até hoje. Casara com uma médica, Anelisa. Têm uma filha, Júlia, de três anos. Em março de 2000, Paulo partiu para Mainz, cidade próxima a Frankfurt, na Alemanha. Ia começar os estudos para defender sua tese de doutorado, na Universidade Johannes Gutenberg. A tese que propôs foi desenvolver um sistema de análise da sonda que em maio será mandada para Marte - a primeira das duas missões àquele planeta. A sonda é a Mimos. Na universidade, Paulo obteria uma cópia gêmea da sonda, exatamente a que acabou trazendo para Vitória. Mr. Squyres, da Nasa, gostou de Mr. Souza Também na universidade, conheceu um visitante freqüente, Steves Squyres, o chefe da missão especial da Nasa. Squyres interessou-se pelo trabalho do brasileiro. "Nós conversamos, falamos de muitas coisas, inclusive sobre o Brasil", recorda Paulo. Mais tarde, recebeu uma carta-convite para participar das missões a Marte. Dos 56 cientistas que estarão no laboratório de jatopropulsão da Nasa em Pasadena, Califórnia, só há quatro estrangeiros: além de Paulo, um dinamarquês, um francês e um alemão. Eles não recebem remuneração, mas ganharão o que, para um cientista, pode ser ainda mais valioso: o acesso aos dados da missão e a possibilidade de publicar artigos nos melhores jornais do mundo, com dados inéditos, aguardados com interesse por toda a comunidade científica. Entre engenheiros, técnicos e cientistas, a missão conta com mais de 700 profissionais. "É um privilégio participar de uma missão espacial", diz Paulo, o único cientista brasileiro até hoje convidado. Um outro brasileiro, o major Marcos César Pontes, é astronauta. Prepara-se para ir a uma estação espacial em 2004. Uma brasileira que trabalha na Nasa, Jacqueline Lyra, é engenheira. Paulo já esteve duas vezes na Nasa. Uma para treinamentos, outra para trabalhar com os outros cientistas em ações que envolvem a Mimos. Neste caso, a Nasa simulou uma missão. Um robô simulou um pouso em local desconhecido e começou a mandar informações, que Paulo e seus colegas processavam. Depois, souberam que o "pouso" ocorreu no deserto do Arizona. Outros períodos em Pasadena esperam por Paulo até os lançamentos, no ano que vem. A primeira missão, a Mars Exploration Rover, com o robô Athena e a sonda Mimos, será lançada de Cabo Canaveral, na Flórida, em maio. A segunda missão, com o mesmo equipamento, em junho. A primeira missão deverá pousar em Marte em janeiro de 2004. A segunda, entre fevereiro e março (veja o site da Nasa: mars.jpl.nasa.gov/mer). Em janeiro, uma terceira missão, esta da Agência Espacial Européia, também chegará lá. Se tudo correr bem, três Mimos pousarão no planeta vermelho.

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