''''Somos 11 ilhas. Não somos amigos''''

Frase de ministro mostra como é o clima no Supremo

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Por Mariângela Gallucci e CAMBRIDGE (EUA)
Atualização:

"As pessoas acham que isso aqui é um grupo de amigos. Mas, na realidade, somos 11 ilhas. Não somos amigos. Não nos freqüentamos socialmente. Apenas nos encontramos no tribunal nos dias de sessão." Essa descrição de um dos atuais ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) mostra com perfeição como é o ambiente na mais alta corte de Justiça do País. Diferentemente do que a sociedade em geral imagina, não há o compadrio de amigos que, ocasionalmente, julgam processos e tomam chá nos intervalos. A rivalidade e pouca amizade entre os integrantes do Supremo apenas ficaram explícitas com o flagrante fotográfico do jornal O Globo. Desavença e vaidade, misturadas a uma pitada de perfídia, apareceram de maneira clara na divulgação das mensagens eletrônicas entre os ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski. "Torpedos" que revelaram ao público como há política por trás desse sistema de escolha presidencial de ministros do Supremo. Ficou explícita a sensação de como os indicados podem acabar inexoravelmente atrelados ao presidente da República que os escolhe. Lula é recordista em indicações para o STF na atual fase da democracia brasileira. Com a escolha do sucessor de Sepúlveda Pertence, o presidente terá indicado sete ministros para o Supremo, um tribunal composto por 11 integrantes. A revelação das mensagens criou um clima de mal-estar, mas isso não chega a ser novidade. Têm se tornado comuns as situações de stress interno por causa do vazamento de discussões entre ministros. Em geral, esse tipo de cenário prospera quando a corte está para decidir sobre assuntos de grande repercussão. Um dos embates explícitos nada polidos ocorreu em outubro de 2004. O plenário do STF decidia se seria confirmada ou não uma liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello garantindo o direito de interrupção da gestação de fetos com anencefalia em todo o território nacional. Houve bate-boca entre Marco Aurélio e o ministro Joaquim Barbosa. Marco Aurélio disse que "para discutir mediante agressões, o lugar não é o plenário do STF, mas a rua". Depois, negou que estivesse chamando Barbosa "para a briga". "Eu só disse que deveríamos nos tratar sem agressões. Não estamos mais nos séculos 16, 17 e 18, em que havia o duelo. Se estivéssemos, certamente haveria um duelo." A liminar favorável ao direito de interromper a gestação de fetos com anencefalia foi cassada - a relação entre os ministros ficou abertamente estremecida. Discussões acaloradas, e nem sempre envolvendo questões estritamente jurídicas, fazem parte da história do tribunal. O público em geral só passou a ter amplo acesso a esse outro lado da corte após a criação da TV Justiça, em 2002. Quando foi lançada, alguns ministros discordaram da idéia de transmitir as sessões ao vivo. Outra situação de stress ocorreu em novembro passado. Também envolvendo Barbosa. Ele acusou, em sessão plenária transmitida pela TV Justiça, o ex-presidente do STF e advogado Maurício Corrêa de tentar influenciar o julgamento de ação milionária sobre desapropriação de terras. "Ele tomou a liberdade de ligar para a minha casa pedindo urgência para esse caso", disse Barbosa. "O tribunal precisa tomar medidas sérias com relação a esse tipo de tráfico de influência", acrescentou. "Se ele está atuando indevidamente, está praticando tráfico de influência", concluiu. Corrêa não estava no tribunal, mas apareceu em minutos. Entregou documentos à presidente do STF, Ellen Gracie, para provar que era advogado da causa e estava autorizado a atuar no processo. Além da TV Justiça, outra grande revolução para os integrantes do STF ocorreu na década de 90, quando passaram a usar com mais freqüência computadores. No início, houve muita resistência e até inabilidade para dominar as máquinas. Mas depois os ministros se renderam às maravilhas da tecnologia. Hoje, usam os computadores até nas sessões de julgamentos, que permitem exibir também a maravilha tecnológica das poderosas máquinas fotográficas.

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