Sob protestos, STF decide futuro de demarcações indígenas e quilombolas

Uma das três ações em pauta no tribunal trata de disputa de área no Parque Nacional do Xingu

PUBLICIDADE

Foto do author André Borges
Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA – Em meio a protestos de organizações socioambientais e da academia, o Supremo Tribunal Federal (STF) julga, nesta quarta-feira, 16, quais os mecanismos legais devem embasar os processos de demarcação de terras indígenas e quilombolas no País, além das regras utilizadas nos processo de criação de novas unidades de conservação ambiental.

Índio guarani do lado de fora do Supremo Tribunal Federal (STF) que tem em pauta julgamento de ações sobre demarcação de terras indígenas e de delimitações de áreas na Amazônia Legal Foto: André Dusek/Estadão

PUBLICIDADE

Na terça-feira, 15, representantes da Coordenação de Articulação das Comunidades Negras Quilombolas (Conaq) entregaram, no STF, uma petição com mais de 70 mil assinaturas coletadas pela campanha “O Brasil é Quilombola! Nenhum Quilombo a menos!”, campanha organizada pela Conaq e organizações como o Instituto Socioambiental (ISA). A petição defende a manutenção do decreto 4.887/2003, que regulamenta a demarcação dos territórios quilombolas. O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.239, ajuizada pelo DEM em 2004, contra a norma, será retomado agora pelo Supremo.

A pauta inclui outras três Ações Civis Originárias (ACO) que podem mexer com o processo de demarcação dos territórios tradicionais indígenas. Duas ações ajuizadas pelo Estado do Mato Grosso tratam da demarcação da uma área no Parque Nacional do Xingu e de pretensa indenização por desapropriação de terras incluídas nas reservas indígenas Nambikwára e Parecis e das áreas acrescidas a essas. Uma terceira ação apresentada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) contra o Estado do Rio Grande do Sul (RS) pede a nulidade de títulos de propriedade de imóveis rurais concedidos pelo governo gaúcho incidentes sobre a área indígena ocupada por índios Kaingang.

Sobre as demarcações indígenas, a principal preocupação recai sobre a polêmica tese do “marco temporal”, segundo a qual os povos indígenas só teriam direito às terras que estavam sob sua posse em 5 de outubro de 1988, dia em que foi promulgada a atual Constituição Federal. Índios que foram expulsos de suas terras em datas anteriores, portanto, não teriam mais direito sobre esses territórios.

Nesta semana, grupos indígenas têm realizado protestos em Brasília contra as propostas. Diversas organizações, como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) tentam sensibilizar o Supremo e a oponião pública sobre o assunto, com a divulgação da campanha “Nossa história não começa em 1988! #MarcoTemporalNão”.

Um grupo de pesquisadores e docentes da Universidade de Brasília (Unb) divulgou um documento no qual expõe ponderações, reflexões e preocupações da comunidade científica sobre os temas que vão a julgamento. “Não se pode reduzir a questão da pluralidade étnica a uma questão meramente federativa de disputa territorial entre unidades da federação ou com particulares que tenham recebido, indevidamente, títulos que se sobrepõe às terras tradicionais”, afirma o documento. “Negar a autodeclaração como critério para a titulação das terras remanescentes de quilombos é negar a normatividade da Constituição relativamente ao que consagra dos direitos culturais e territoriais. Da mesma maneira, restringir o direito às terras que tradicionalmente ocupam, ao pretender fixar o marco de ―ocupação é, por consequência negar a identidade étnica, da qual a autodeclaração é o ato que a exterioriza/materializa. As implicações são, aqui sim, concêntricas. O componente jurídico aqui é o vinculo (modo de se relacionar) com seus territórios e que o Estado deve respeitar e garantir.”

Florestas. O futuro das florestas protegidas também está em jogo, alerta uma nota técnica assinada pelas organizações Amigos da Terra, Coalizão Pró-UCs, Greenpeace Brasil, ISA, Imazon, Ipam, SOS Mata Atlântica, TNC Brasil e WWF Brasil.

Publicidade

No documento, as ONGs afirmam que, dependendo da decisão final, “os julgamentos podem resultar na anulação de praticamente todas as unidades de conservação do País, bem como abrir caminho para que essas áreas protegidas sejam reduzidas ou desafetadas por Medida Provisória”.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.