''Sindicatos têm aspecto mafioso também''

Especialista vê, porém, alguns avanços, como representação maior de trabalhadores no Congresso

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

O fortalecimento político dos sindicatos aproxima o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mais do presidente argentino Juan Domingo Perón (1895-1974) do que do presidente brasileiro Getúlio Vargas (1882-1974), avalia a pesquisadora Maria Celina D?Araújo, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Segundo ela, o peronismo teve mais sucesso que o varguismo no uso político do sindicalismo para se tornar uma corrente popular. E, para Maria Celina, o petismo fez como o peronismo: apoiou-se na estrutura sindical para crescer politicamente. A pesquisadora vê, no fortalecimento dos sindicatos, avanços democráticos, mas também aponta perigos, já que o setor lida com poder e dinheiro. A senhora diz ver mais semelhanças do PT de hoje com Perón do que com Vargas. O PT foi fundado com base em uma estrutura sindical oficial. Embora Lula criticasse o sindicato pelego e fosse a favor de sindicatos autênticos, o PT acabou sendo formado, e a CUT, a partir dessa estrutura legal oficial. E hoje esse compromisso está mais sério do que nunca. Por isso não se fala mais em acabar com o imposto sindical, não se fala mais em liberdade sindical, na Convenção 87 da OIT. Porque o arranjo político está feito em cima dessa tradição corporativa. No início do governo, falava-se em reforma sindical. Isso não volta mais? Essa estrutura sindical não vai mudar porque não interessa ao PT mudar. Mas também não interessa aos empresários porque eles aprenderam a conviver com essa estrutura. Se a gente tiver mudança na lei sindical que permita liberdade financeira, com o fim do imposto sindical, isso significará mudanças profundas no sindicalismo. O imposto sindical mantém a estrutura vigente. Ou seja, patrões e empregados, nesse ponto, têm medos semelhantes? E interesses semelhantes, têm medo da mudança. Porque o empresário brasileiro sabe exatamente como agir se tiver uma greve de metalúrgicos. Se houver uma greve de metalúrgicos, vai parar a Fiat e a Chevrolet. Se a gente tiver pluralidade sindical, pode parar a Fiat e não parar a Chevrolet. Os interlocutores mudam? Não só isso. A pluralidade sindical vai obrigar o empresariado a competir entre si. Se tiver pluralidade sindical, um sindicato faz greve, o outro não. O empresariado brasileiro só tem negociado como grupo, não como empresários individuais. Acabar com o imposto sindical, mudar a lei, significa mudar a cultura de negociação. A senhora acha que pós-Lula os sindicatos vão estar mais fortes? Depois do governo Lula, os sindicatos estão mais fortes porque eles inauguraram, e isso é positivo para a democracia, uma vida política irreversível. A gente teve uma grande participação de sindicalistas no governo. Além disso, há uma representação de trabalhadores muito grande no Congresso. Isso é positivo. Mas os sindicatos, no mundo todo, têm um aspecto mafioso também. São estruturas de interesses. Quem lidera sindicatos são grupos que têm interesses muito específicos e às vezes interesses muito pessoais. Aqui no Brasil não sei o que pode acontecer, mas é da natureza do sindicalismo poder gerar organizações de privilégios. É um setor que manuseia muito dinheiro, tem muita influência política. A senhora diz que o PT e Lula tiveram mais sucesso que Vargas na aproximação com os sindicatos. A proximidade não é Lula/Perón, mas a relação da estrutura sindical com a política. O PT surgiu num momento de abertura política e acionou essa estrutura sindical que era oficial, varguista, mas fez dela um recurso político. O que Perón fez também. A esquerda sempre falou na necessidade de os sindicatos terem representação partidária. Hoje, a gente pergunta: é a melhor alternativa?

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.