Serra busca o ataque certo para virar o jogo

No segundo turno, estratégia eleitoral da candidatura de tucano sofreu mudanças de percurso

Por Julia Duailibi e Bruno Boghossian
Atualização:

SÃO PAULO - No dia 19 de outubro, ao lado do governador Geraldo Alckmin (PSDB), José Serra visitava o Jardim Pantanal, bairro na zona leste de São Paulo que ganhou notoriedade ao ficar inundado por um mês, no fim de 2009. Durante a caminhada, o candidato tucano à Prefeitura de São Paulo conversou com o coordenador de campanha, Edson Aparecido, e o marqueteiro Luiz Gonzalez, que estava ao telefone.

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O comando da campanha precisava tomar uma decisão. Serra havia terminado o 1.º turno na liderança da disputa, mas naquele momento não só amargava um segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto como havia perdido cinco pontos porcentuais em apenas uma semana.

A questão era qual estratégia deveriam adotar para reverter a situação. Partir para o ataque, intensificando o tom agressivo da campanha, num tudo ou nada eleitoral? Ou abandonar a rota beligerante e sair em busca do eleitor indeciso, que poderia decidir a eleição?

Para a equipe de Serra, um terço do eleitorado não estava satisfeito com o bate-boca entre o tucano e o candidato do PT, Fernando Haddad. Conquistar esse eleitor seria a maneira de voltar a crescer.

Pelo telefone, Gonzalez disse que o caminho era apostar na comparação entre os programas de governo, os modos petista e tucano de governar e as biografias dos candidatos nesta eleição.

Dias antes, Serra havia reunido colaboradores em sua casa, no Alto de Pinheiros, zona oeste, para dissecar o programa petista. No encontro, foi feita uma análise comparativa entre seu programa e o de Haddad. No capítulo sobre saúde, os tucanos encontraram o que poderia ser um "calcanhar de Aquiles" do petista.

 

‘Estatização’. A proposta tergiversava sobre os convênios com organizações sociais na área da saúde. Havia ali um material para explorar: o flerte petista com a "estatização". Se, na campanha presidencial de 2006, o PSDB fora chamando de "privatista", agora era a vez de dizer que um governo do PT na maior cidade do País acabaria com as parcerias com a iniciativa privada, iniciadas na gestão de Serra e ampliadas pelo seu sucessor na Prefeitura, Gilberto Kassab (PSD).

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A dez dias da eleição, a campanha mudava a estratégia.Serra resistiu inicialmente a diminuir o tom das críticas ao PT, alegando que também era alvo de ataques. Mas foi convencido pelos aliados. A partir daquele momento, a campanha mergulharia no embate sobre as propostas para a cidade. As críticas ao PT continuariam, mas de maneira mais discreta, nos programas de rádio e em folhetos distribuídos na periferia. Seriam centradas na discussão ética e ilustradas com a condenação de petistas no julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal.

Os questionamentos sobre a posição de Haddad em relação às organizações sociais dominaram a pauta da última semana da campanha. Foram parar na internet, na TV, no rádio e em panfletos espalhados pela cidade. Após uma semana, as pesquisas começaram a mostrar certa reação. A diferença entre Serra e Haddad, que chegou a 17 pontos porcentuais, caiu para 13 pontos.

Patinar. A decisão de alterar a rota da campanha foi tomada depois de a campanha perceber que suas armas não faziam efeito: a rejeição de Serra aumentou no 2.º turno e a propaganda na TV não melhorava a má avaliação da gestão Kassab apontada por pesquisas de opinião.

Movimentos políticos considerados polêmicos pela própria equipe também não contribuíram. Serra firmou uma aliança com o líder evangélico Silas Malafaia, da Assembleia de Deus, que havia anunciado que "arrebentaria" com Haddad por causa do "kit-gay". O material de combate à homofobia nas escolas encomendado pelo Ministério da Educação na gestão do petista, cuja distribuição foi suspensa por ordem do Palácio do Planalto.

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Durante uma semana, atacou a cartilha. Foi confrontado com a revelação de um material similar, encomendado por seu governo no Estado. Foi chamado de conservador e recebeu críticas dos próprios tucanos.

O eleitor também não recebeu bem a discussão. A coordenação da campanha mandou tirar o tema da pauta. Serra parou de responder a questionamentos sobre o assunto. Mas o estrago já estava feito.

A gestão de Kassab também se mostrava um "fardo" diante do discurso de mudança do adversário. A má avaliação era agravada pela renúncia de Serra ao cargo de prefeito em 2006 para disputar o governo do Estado. O candidato passou a sentir o peso da gestão Kassab nas ruas. Ouvia manifestações de comerciantes dizendo que a Prefeitura fazia "perseguição" aos estabelecimentos da cidade. A amigos, comparou o impacto negativo em sua campanha de ações impopulares de Kassab ao aumento do preço do gás feito por FHC na corrida presidencial de 2002.

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Nos últimos dias, tucanos passaram a bombardear Kassab nos bastidores. Muitos integrantes da campanha avaliavam que o prefeito, cujo partido deve ganhar um ministério do governo federal, já se aproximava do PT paulistano. O líder do PSD na Câmara Municipal, vereador Marco Aurélio Cunha, sugeriu que seu partido deveria apoiar o governo de Haddad, em caso de vitória do petista.

Fôlego. Mas a mudança na estratégia na reta final, com as críticas ao programa de Haddad, deu novo fôlego a Serra, que apostava numa reviravolta nas urnas hoje. Aliados diziam que o quadro era difícil, mas não impossível.

Serra, que foi ministro, prefeito, governador e candidato a presidência da República por duas vezes, resistiu a entrar na disputa municipal deste ano porque ainda sonhava com a Presidência. Isolado politicamente desde a derrota de 2010, decidiu entrar na corrida para fortalecer seu grupo político. Mas sabia que seria uma campanha difícil. A depender do resultado deste domingo, será possível avaliar se a aposta tucana foi arriscada demais.

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