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Serra adota estilo ‘paz e amor’ e propõe mudança na economia sem radicalismo

Tucano alivia o tom de declarações, defende ‘harmonia’ entre Fazenda e BC e é visto como controlador de gastos

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Por Redação
Atualização:

SÃO PAULO - Em seu programa de governo, que foi vazado para a imprensa a dois dias da eleição, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, abandona seu tom mais combativo nas críticas à política econômica e adota um estilo "paz e amor". Serra faz apenas breves menções à taxa de juros e câmbio, e nem menciona a "necessária coordenação" entre Ministério da Fazenda e Banco Central, já pregada pelo tucano.

 

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"O governo atual, em vez de reforçar as bases do crescimento do País, preferiu hipotecar o futuro à comodidade do presente. Manteve juros desnecessariamente elevados e câmbio excepcionalmente apreciado, para alegria dos especuladores e sofrimento da indústria e da agricultura nacionais", diz o texto. Na hora de receitar medidas para lidar com o problema cambial e de juros, o documento afirma: "Será essencial regular a dosagem entre as políticas monetária, cambial e fiscal, de forma a assegurar a competitividade da produção nacional e as condições de crescimento sustentado da economia."

 

O tom mais cauteloso não foi adotado por acaso. Nos últimos tempos, aliados de Serra vêm indicando a interlocutores que o tucano não usaria medidas voluntaristas ou bruscas para reduzir juros ou desvalorizar o real, possibilidade que inquieta o mercado financeiro.

 

No início da campanha, Serra chegou a dizer que o Banco Central não era Santa Sé e aventava a hipótese de ter um modelo mais parecido com o chileno, no qual o Ministério da Fazenda é consultado sobre a atuação do BC. Em sabatina no Estado no início de setembro, o candidato disse que o Brasil estava em franco processo de desindustrialização por causa do câmbio sobrevalorizado, que estimula a expansão das importações de bens industrializados para sustentar a demanda interna. "O câmbio no Brasil é flutuante? É uma ova. Só flutua para baixo, não flutua para cima. Na hora que flutua para cima, aumenta o juro", disse. Em uma entrevista que faz parte do livro Retrato de Grupo, 40 anos do Cebrap, de Flávio Moura e Paula Montero, publicado este ano, ele dispara: "Em nenhum dos preceitos do Consenso de Washington figura a ideia de que para desenvolver o país você precisa megavalorizar a moeda. Isso é simplesmente um erro, não é ortodoxo nem heterodoxo", diz Serra. Esse tipo de declaração, música para os ouvidos da indústria, causava arrepios na banca.

 

‘Harmonia’

 

Serra passou a afirmar apenas que seria necessária uma maior "harmonia" entre as políticas do BC e da Fazenda, para que o Brasil não tivesse as taxas de juros mais altas do mundo e um câmbio que prejudica a indústria nacional e a exportação. "O ponto de partida é ter uma equipe harmônica. Banco Central, Planejamento e Fazenda atuarem planejada e integradamente. Conjuntamente. Com isso, você pode fazer mudanças graduais seguras de política econômica que favoreçam mais a produção e a geração de empregos no Brasil. Inclusive, as nossas exportações", disse no dia 20 de outubro, em entrevista a uma rádio carioca. Sua equipe também prega ajustes finos na atuação do Banco Central em relação ao mercado cambial. Diretor executivo da Fundap e próximo de Serra, Geraldo Biasoto acha que as ações do BC para conter a valorização do real são muito previsíveis e a instituição deveria valer-se mais do elemento surpresa.

 

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Na área de política fiscal, Serra inspira confiança - ele é percebido pelo mercado financeiro como o mais comprometido com o controle dos gastos do governo, que dispararam nos últimos anos do mandato de Lula. Em seu programa, a campanha diz que "o aumento dos gastos públicos concentrou-se nas despesas correntes, em detrimento dos investimentos" e promete "aumentar a taxa de investimentos públicos, dobrando as inversões produtivas até 2014", além de "combater o desperdício na aplicação do gasto público, valorizando a atuação do Tribunal de Contas da União".

 

Mas suas promessas de expansão de programas sociais, com reajuste de 10% nas aposentadorias acima do mínimo, salário mínimo de R$ 600 em 2011 e 13.º para o Bolsa-Família prejudicaram um pouco suas credenciais de austeridade fiscal. Mansueto Almeida, economista Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que a maioria do aumento dos gastos públicos provém da Previdência e dos programas sociais, diretamente ligados ao salário mínimo. Portanto, cortar desperdícios, reduzir ineficiências, mas continuar aumentando o salário mínimo e não reformar a Previdência, não vai resolver o problema fiscal.

 

Indústria

 

A valorização do real e seus efeitos sobre a indústria são grande preocupação do candidato. Geraldo Biasoto afirma que a valorização do câmbio e o alto custo da infraestrutura estão levando a um processo drástico de desindustrialização no Brasil. A solução, diz Biasoto, não é fazer uma maxidesvalorização. "Mas precisamos ter uma queda dos juros, que vai calibrar o câmbio", disse Biasoto. Sem usar a palavra, o programa de governo de Serra cita a desindustrialização do Brasil e propõe, no item sobre política industrial, eliminar impostos que ainda incidem sobre exportações.

 

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O candidato também manifesta preocupação com a chamada primarização da pauta - a tendência de o Brasil exportar cada vez mais commodities, em detrimento de industrializados.

 

A equipe de Serra é contundente nas críticas aos rumos do BNDES no governo Lula. "Os juros subsidiados pelo BNDES vão gerar uma conta de US$ 8 bilhões a US$ 14 bilhões de subsídio por ano - é uma Bolsa-Família para os ricos", disse Biasoto, em entrevista ao Estado em agosto. "A Petrobrás é uma das maiores empresas do mundo e a Vale também, elas teriam crédito onde quisessem, não precisariam do BNDES." Biasoto afirma que o BNDES deveria financiar máquinas e capacidade produtiva, e não mudança patrimonial.

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