Secretária da época de Marta é acusada de improbidade administrativa

Ex-titular da pasta de Assistência Social, Aldaíza Sposati, contratou sem licitação, em julho de 2003, a Fundação Getúlio Vargas, segundo a Promotoria

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Por Redação
Atualização:

A Justiça de São Paulo abriu ação contra a ex-secretária municipal de Assistência Social Aldaíza Sposati - governo Marta Suplicy (PT), 2001/2004 - acusada de improbidade administrativa. A decisão é da juíza Márcia Helena Bosch, da 1.ª Vara da Fazenda Pública, que acolheu acusação do Ministério Público Estadual e mandou citar a petista para que apresente sua contestação. Ao rejeitar defesa preliminar de Aldaíza, que alegou "ausência de má fé e ausência de prejuízo ao erário", a juíza assinalou a legitimidade do Ministério Público para propor a ação.

 

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Márcia Helena Bosch rechaçou argumentação da defesa, que questionou o inquérito civil da promotoria - procedimento que antecedeu à proposta de ação civil. "Não há que se falar em nulidade do inquérito civil." A juíza também afastou tese de Aldaíza sobre prescrição.

 

Segundo a Promotoria do Patrimônio Público e Social do Ministério Público, Aldaíza contratou sem licitação, em julho de 2003, a Fundação Getúlio Vargas (FGV ) para "prestação de serviços de consultoria" pelo prazo de 120 dias, ao preço de R$ 354,6 mil, em valores da época. A Promotoria verificou que a FGV repassou parte dos trabalhos para o Instituto Florestan Fernandes (IFF) e a 14 consultores, 12 deles ligados a PT.

 

"Essa triangulação de serviços contatados pela municipalidade por seus então dirigentes pautou-se mais pela militância político partidária, critério que funcionava como uma espécie de 'credencial' para a prestação do serviço alegadamente necessitado pela administração pública, do que por critérios técnicos, impessoais e de interesse público", denuncia o promotor Saad Mazloum.

 

O promotor aponta "prévio concerto entre os réus Aldaíza e FGV para que a equipe de trabalho fosse constituída por determinadas pessoas, justamente aquelas que integravam a mesma organização, o Instituto Florestan Fernandes, do qual fazia parte o próprio agente público contratante, ou seja, Aldaíza Sposati, e outras mais relacionadas com o PT". "Os réus, membros do IFF e do PT, foram descaradamente apaniguados", sustenta o promotor.

 

Aldaiza dispensou o processo licitatório sob argumento de que a situação adequava-se ao disposto no artigo 24 da Lei de Licitações. "A contratação não foi antecedida de qualquer pesquisa de preços", assinala a ação. "Também não houve justificativa do preço. O parecer prévio assinado pela assessoria jurídica sequer aborda a necessidade de tal providência." Para o promotor Mazloum, a contratação autorizada por Aldaíza caracterizou "nítida e evidente ofensa a princípios e dispositivos" das leis federais 8666/93 (Licitações) e 8429/92 (Improbidade). A juíza também mandou citar a FGV e o Florestan Fernandes para contestação.

 

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O Florestan Fernandes foi fundado por iniciativa do diretório municipal do PT em São Paulo, em 22 de julho de 1999. Seu objetivo social: elaboração de estudos e pesquisas sobre a realidade sócio econômica, cultural e política do município e região metropolitana. No mesmo dia da criação do instituto, Marta Suplicy foi eleita sua presidente.

 

A ação é taxativa: "As provas colhidas revelaram um impressionante esquema para desvio de recursos públicos, mediante indevida contratação direta e sem licitação de fundações de direito privado, sobretudo da FGV, para realização de serviços e seguidos repasses ou subcontratações dos mesmos serviços, ou parte deles, a pessoas e entidades como o Instituto Florestan Fernandes, ou aos seus associados, e empresas pertencentes a membros dessa entidades ligados todos ao PT, agremiação política dos então dirigentes da Prefeitura de São Paulo, a começar pela então prefeita Marta Suplicy e secretários municipais que assinaram os contratos".

 

Segundo a promotoria, Aldaíza firmou o contrato "após autorização de sua própria lavra e tendo em mãos a proposta técnica 168/03 apresentada pela FGV". A ação destaca que a FGV alocou 14 consultores, 12 deles ligados ao PT, inclusive uma enfermeira "que em sua tese de doutorado contou com a participação em banca, em 1999, de Aldaíza" e uma advogada da então secretária de Assistência Social. "No primeiro dia útil seguinte à assinatura do contrato, a FGV subcontratou os serviços correspondentes ao Florestan Fernandes". A fundação também subcontratou parte dos serviços a uma empresa de informática pertencente ao então tesoureiro do instituto.

 

"Trata-se de uma visão totalmente equivocada", reagiu Aldaíza Sposati, inconformada com a acusação da promotoria. "Eu queria entender a questão. Estamos em um Estado democrático de Direito, o promotor pode investigar, pode questionar, a Justiça pode acatar e mandar citar. Mas as acusações não têm fundamento algum." Aldaiza Sposati considera que a ação do Ministério Público "contém um tom desrespeitoso, denota um desrespeito profundo".

 

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"Não estamos tratando de qualquer fundação", protesta a ex-secretária. "O promotor insinua que o processo de administração pública é executado como se estivéssemos comprando algo em uma barraca de feira. Parece que fui ali na esquina e escolhi (a FGV)." Aldaiza se indigna com os termos da ação. "São um desrespeito à minha trajetória política." Ela foi vereadora por três mandatos e duas vezes secretária municipal em São Paulo.

 

"Se o promotor tem dúvidas, vamos esclarecer. Mas não posso aceitar que rotule de favorecimento e de irregular uma contratação só porque é citada uma pessoa de quem eu fui banca na USP." A FGV ainda não foi comunicada da ação. "A FGV informa que não foi oficialmente notificada a respeito da petição e que, assim que receber tal notificação, seus advogados irão analisá-la cuidadosamente para encaminhar as melhores providências", assinalou a fundação, por meio da assessoria de imprensa.

 

O advogado Rubens Naves, que defende o Instituto Florestan Fernandes, considera "um preconceito a afirmação de que foram usados membros do PT para prestação de serviços". Naves informa que o IFF reformou seu estatuto "e se desvinculou completamente do PT". "O Florestan Fernandes se tornou uma grande vítima desse tipo de processo e acabou encerrando suas atividades", declara o advogado. "Essa interpretação do Ministério Público fez com que o instituto não tivesse mais condição de ser contratado por órgãos públicos e desenvolver sua especialidade."

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"Se o principal objetivo do Ministério Público era matar o instituto ele conseguiu. O Florestan Fernandes está em processo de extinção." "O que o Ministério Público tem?", questiona Rubens Naves. "Ele tem que provar que houve lesividade, pressuposto da ação de improbidade. E não há lesividade nesse contrato porque o produto foi entregue, trabalho realizado."

 

O advogado prevê: "É uma luta jurídica para os próximos 10 anos. A partir daí vai se assentar uma jurisprudência. Para ter improbidade precisa haver dolo. Que tipo de controle nós queremos? Um controle que cerceia a atividade? É a luta que se trava entre o Estado burocrático e um Estado estratégico, gerencial, mais flexível e que busca a eficiência do serviço público." A ex-prefeita Marta Suplicy, hoje senadora (PT-SP), não se manifestou sobre a ação.

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