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Saúde recebe só 55% dos recursos da CPMF, indica FGV

Por Anne Warth
Atualização:

Estudo divulgado hoje pela Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostra que, em média, apenas 55% do total de recursos arrecadados por meio da CPMF são gastos com saúde, previdência e combate à pobreza. Além dos 20% retirados pela Desvinculação das Receitas da União, outros 25% não têm gasto autorizado pelas leis orçamentárias e, portanto, não é possível saber sua destinação final. "E aquilo que não foi gasto em um ano também não aparece nos orçamentos dos exercícios seguintes", explicou a pesquisadora Tathiane dos Santos Piscitelli, autora do estudo. Segundo a pesquisa, que acompanhou a destinação dos recursos da CPMF entre 2001 e 2006, a parte do dinheiro utilizado para realização de investimentos em bens de capital na área da saúde é ínfima e praticamente toda a receita é utilizada em custeio. "Custeio deve ser pago com dinheiro de impostos, e não de contribuições. Isso indica que parte dos impostos que sustentavam os gastos com saúde foram desviados para outros fins, como o superávit primário. A CPMF passou a cumprir esse papel. Não foi para isso que ela foi criada, mas para elevar os investimentos e melhorar a situação da saúde no País", observou a pesquisadora. Em 2001, nenhuma parte dos recursos da CPMF foi utilizada para investimentos no Ministério da Saúde; em 2002, os investimentos da pasta receberam 0,02% do total de recursos da CPMF; em 2003, o porcentual foi de 0,01%; em 2004, 0,1%; em 2005, 0,8%; e em 2006, os investimentos do Ministério da Saúde não receberam nenhum centavo das receitas da CPMF. A pesquisadora fez o levantamento a partir dos dados do Siga Brasil, programa do Senado Federal que disponibiliza dados orçamentários para consulta da população. A pesquisa descobriu ainda que os recursos da CPMF não foram utilizados apenas pelos Ministérios da Saúde, Previdência e Desenvolvimento Social e Combate à Fome - em princípio, as pastas mais ligadas à destinação, definida por lei, dos recursos da CPMF. Em 2005, por exemplo, também apresentaram gastos com a função "saúde", pagos com receitas da CPMF, os Ministérios da Ciência e Tecnologia, Defesa, Educação, Fazenda, Justiça, Trabalho e Planejamento. Porém, não é possível saber exatamente de que forma esse dinheiro foi utilizado, uma vez que material de consumo, por exemplo, pode envolver desde a compra de medicamentos até a aquisição de produtos de limpeza. Falta transparência "Não dá para saber se o material de consumo é seringa ou papel de impressora. Se o dinheiro gastos para pagamento de pessoal foi com o médico ou com o ascensorista. O que é efetivamente gasto em saúde? O detalhamento do programa não é suficiente e falta transparência. Algumas informações divergem com dados do Siafi, que tem acesso limitado e é uma ferramenta difícil", questiona a pesquisadora. "Se não é possível controlar o destino de uma contribuição, não há como fundamentar a existência da CPMF. A falta de controle da destinação descaracteriza a contribuição", acrescentou o professor de Direito da FGV, Eurico Marcos Diniz de Santi, que participou do debate sobre a pesquisa. Também no debate, o presidente da Transparência Brasil, Eduardo Capobianco, questionou a qualidade dos gastos na área de saúde. "Não basta que o dinheiro vá para a saúde. Precisamos saber mais sobre a qualidade do gasto, se ele de fato se reverte em bem-estar para a população e se atende ao interesse público. A obrigação de gastar não significa gastar bem", opinou. Dados preliminares levantados por Tathiane indicam que os mesmos desvios ocorrem com a Cide, criada para arrecadar recursos para a melhoria das estradas federais. Segundo o Siga Brasil, 40% do total arrecadado é utilizado para reserva de contingência. Segundo o estudo, todo o valor destinado para a Previdência entre 2001 e 2006 foi utilizado em custeio - pagamento de aposentadorias e pensões -, mas não é possível saber de que forma os recursos destinados por lei para o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza foram gastos. Na reunião, da qual participou também Luiz Akutsu, da Secretaria de Controle Externo no Estado de São Paulo do Tribunal de Contas da União (TCU), houve consenso de que embora não haja ilegalidade na aplicação dos recursos da CPMF, existem dúvidas sobre a legitimidade do uso das receitas provenientes da contribuição. A utilização de recursos sem previsão legal constitui crime, previsto no artigo 359-D do Código Penal.

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