Sarney repete script de reforma que não fez

Como agora, em 95 Senado contratou consultoria da FGV, e nada foi feito

Por Rosa Costa e Rui Nogueira
Atualização:

O grupo de parlamentares que hoje comanda o Senado e faz promessas de reforma administrativa para enterrar a assombração política provocada pelo escândalo dos 181 diretores, pagamento de hora extra no recesso parlamentar e outros desmandos é o mesmo que, 14 anos atrás, propôs uma profunda "reengenharia" para que a Casa não se transformasse em uma "instituição desorientada", vagando como "uma alma penada" pelo Congresso. Hoje, como em abril de 1995, a direção do Senado também decidiu "contratar uma consultoria externa da Fundação Getúlio Vargas". No discurso da posse do terceiro mandato na presidência do Senado (de 1993 a 1995, de 2003 a 2005 e de 2009 a 2011), em fevereiro passado, Sarney afirmou que foi com o trabalho da FGV que ele promoveu "uma grande reforma aqui dentro". O contrato número 55/1995, segundo informação oficial do Senado, "foi pago em quatro parcelas de R$ 220.500,00, totalizando 882.000,00". Um novo contrato com a FGV deve ser assinado ainda nesta semana. A fundação já faturou em contratos com o Senado, nos últimos cinco anos, pelo menos R$ 3,3 milhões. RECICLAGEM O diagnóstico da crise de 2009 e a solução oferecida é uma cópia da avaliação e do receituário de 1995. Ontem, como hoje, os senadores José Sarney (PMDB-AP) e Renan Calheiros (PMDB-AL) estavam na liderança política do Senado - Sarney era mesmo, tal como hoje, o presidente da Casa. Na época, foi formado um "Grupo de Trabalho de Reforma e Modernização do Senado Federal" (GT), que era composto pelo próprio Renan e mais os senadores Ney Suassuna e Luiz Alberto Vieira. No dia 25 de abril de 1995, em um discurso feito no plenário, Renan apresentou um relatório de cem páginas com as conclusões sobre o que o grupo de trabalho viu e que soluções recomendava. Segundo Renan, depois de um mês de trabalho, "cerca de doze horas diariamente, inclusive nos finais de semana", o grupo de três senadores viu uma instituição que "privilegia mais a máquina administrativa do que a produção legislativa". O GT concluiu que o Senado gastava "muito, e mal", que tinha "excesso de órgãos e pessoal" e idolatrava "uma cultura burocrática quase folclórica, onde carimbos e despachos são ícones venerados". O grupo admitiu até que o Congresso brasileiro, então com 10 mil servidores e gastos de US$ 1,5 bilhão, tinha uma "despesa relativamente superior" à do Congresso dos Estados Unidos, que tinha, na época, 31 mil servidores e custeio de US$ 1,96 bilhão. RECEITA O grupo de Sarney, Suassuna e Vieira dizia que era preciso "extinguir secretarias, seções e serviços", aprovar os diretores no plenário e "examinar a viabilidade de os diretores de nível mais elevado" terem um "mandato coincidente com o da Comissão Diretora (admitida a recondução), para reduzir a vulnerabilidade dos dirigentes diante das pressões políticos para atendimento de demandas sem amparo legal ou regulamentar". Nada disso saiu do papel. A única mudança desde então é que o grupo de peemedebistas voltou a ser hegemônico no comando do Senado. Ontem, questionado por que nada mudou de 1995 para cá, tendo sido até presidente da Casa por um ano (2007), o senador Renan Calheiros limitou-se a reclamar das reportagens do Estado sobre a crise do Legislativo e disse que "o problema começou em 2001". Uma referência direta à gestão do falecido senador Ramez Tebet (PMDB-MS), que dirigiu a Casa entre 2001 e 2003, em substituição a Jader Barbalho (PMDB-PA), que teve de renunciar ao cargo para não ser cassado e não ficar inelegível - candidatou-se à Câmara e virou deputado federal. Renan renunciou à presidência do Senado no rastro do escândalo do "caso Mônica Velloso", quando o peemedebista foi acusado de ter usado recursos de uma empreiteira para pagar pensão à filha que teve com a jornalista. Ele nega.

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