RS admite que parcelamento de salários pode se repetir em 2016 e apela para União

Proposta do secretário da Fazenda do Estado, Giovani Feltes, é que governo federal libere os Estados de pagar a parcela da dívida por um período de dois ou três anos sob condição de que cumpram algumas metas de ajuste

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Por Gabriela Lara
Atualização:

PORTO ALEGRE - O secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul, Giovani Feltes, admitiu, nesta terça-feira, 17, que poderá voltar a atrasar pagamentos da dívida da União e a parcelar salários de servidores em 2016 e que será inevitável contar com a ajuda do governo federal para sair da crise. Segundo ele, não há como afirmar que o governo conseguirá fazer os pagamentos em dia. 

"Não posso afirmar que vamos ter condições de fazer os pagamentos todos em dia", disse Feltes em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, quando perguntado sobre a possibilidade de a folha do funcionalismo público sofrer novos parcelamentos no ano que vem. Em 2015, os salários de julho e de agosto foram parcelados, e o governo gaúcho não descarta a hipótese de fazer o mesmo em novembro e dezembro. Para o 13º já se sabe que não há recursos. Os funcionários públicos do Executivo receberão por meio de uma linha de crédito que será oferecida pelo Banrisul.

PORTO ALEGRE|RS 11-08-2015 NACIONAL SARTORI PORTO ALEGRE, RS, BRASIL 11.08.2015: O governador José Ivo Sartori anunciou nesta manhã de terça-feira (11) a quitação integral da folha salarial de julho do funcionalismo público estadual. A decisão foi tomada no final da tarde dessa segunda-feira (10) após o governador se reunir com o secretário da Fazenda, Giovani Feltes (em destaque), e determinar o estudo de quitação. NA FOTO Secretário da Fazenda, Giovani Feltes Foto: Luiz Chaves|Palácio Piratini Foto:  

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Desde que assumiu o mandato, em janeiro deste ano, o governador José Ivo Sartori (PMDB) sempre afirmou que a crise nas finanças do Rio Grande do Sul não seria resolvida no curto prazo. Na falta de soluções imediatas, adotou medidas consideradas amargas, mas necessárias para buscar o equilíbrio fiscal, deixando claro que os resultados poderiam demorar a aparecer. O discurso, que se assemelha ao adotado pelo governo federal, foi ganhando um tom mais dramático com o passar dos meses, quando Sartori começou a atrasar o pagamento da dívida com a União e a parcelar o salário dos servidores vinculados ao Executivo, devido à falta de dinheiro em caixa.

A percepção é de que as medidas adotadas pela administração estadual ainda são insuficientes para reequilibrar as finanças. De acordo com o Relatório Resumido da Execução Orçamentária, de janeiro a agosto as despesas do Executivo somaram R$ 35,12 bilhões. O número ficou R$ 1 bilhão abaixo do estimado no orçamento - e a economia se deu principalmente pela redução nos gastos com custeio da máquina pública e pela forte diminuição nos investimentos. Só que a receita total no período, de R$ 32,09 bilhões, foi quase 11% menor do que a prevista inicialmente. Com isso, o Rio Grande do Sul acumulou um déficit de R$ 3,03 bilhões nos oito primeiros meses do ano. A previsão de Feltes é de um rombo de pelo menos R$ 3,60 bilhões no encerramento de dezembro.

Em setembro, o governo gaúcho aprovou na Assembleia Legislativa o aumento das alíquotas de ICMS válido entre 2016 e 2018, com o argumento de que esta era a única alternativa para dar fôlego ao Estado, já que poderia garantir uma arrecadação anual extra de cerca de R$ 2 bilhões. Somada a outras ações de ajuste fiscal, a elevação do imposto seria capaz de amenizar a crise vivida pelo Estado até medidas estruturais serem implementadas e surtirem efeito. Uma delas é a Lei de Responsabilidade de Fiscal (LRF) estadual, que o Executivo pretende aprovar ainda em 2015.

Atualmente, já se reconhece que a elevação do imposto não vai salvar as contas de 2016. "Foi uma alternativa corajosa do governador, mas é insuficiente para poder assegurar uma transição de 2016 mais tranquila do que tem sido 2015. Até porque a situação vem sendo agudizada por conta das projeções e do impacto que sofremos em relação às questões políticas e econômicas", disse Feltes. A Secretaria da Fazenda do RS espera um déficit de R$ 4,6 bilhões no ano que vem.

Pedido de ajuda. Nos últimos meses, o governo estadual passou a associar cada vez mais o prolongamento e o agravamento da crise no Rio Grande do Sul aos efeitos da retração econômica do País, traduzida pela queda na arrecadação. Nas últimas semanas, o discurso incorporou um apelo mais direto à União. "Há um processo de ampliação da angústia, com a certeza de que, mesmo com todas as medidas que já se propôs e ainda venha a se propor, você não sai da crise sozinho. Isso vai produzindo uma angústia crescente, porque não está mais nas tuas mãos, depende de outrem", afirmou Feltes.

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No fim de outubro - no mesmo dia em que o governador Sartori confirmou que pagaria em dia a folha do funcionalismo daquele mês, mas voltaria a atrasar a parcela da dívida com a União -, Feltes recebeu um grupo de servidores no Palácio Piratini para apresentar um panorama das finanças do Estado. Um dos slides mostrados no encontro dizia no título "Por que a União não nos ajuda?" e listava pontos em que o governo federal poderia colaborar com o Estado na questão financeira.

Entre os itens mencionados estavam a mudança no indexador da dívida pública (prevista para entrar em vigor em fevereiro), o ressarcimento da lei Kandir, o ressarcimento de investimentos em estradas federais e a compensação previdenciária. O material também citava duas demandas encaminhadas pelo Rio Grande do Sul ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma para tentar evitar o bloqueio de contas do Estado pelo atraso no pagamento da dívida e outra para pedir a revisão do contrato com a União.

Feltes reconhece que o Estado pleiteia um apoio maior de Brasília. "Vai chegar um ponto em que a União vai ter que fazer alguma coisa que seja conjunta, porque os problemas dos outros também são o seu problema", afirmou, referindo-se ao fato de que o governo federal depende do resultado primário dos Estados para atingir o superávit previsto para 2016.

Sugestões. Mesmo sabendo que a União não está em condições de fazer nenhum tipo de concessão, Feltes sugere que se busque um mecanismo para liberar os Estados de pagar a parcela da dívida - a do RS fica entre R$ 250 e 280 milhões mensais - por um período de dois ou três anos, desde que eles cumpram algumas metas de ajuste. "A economia do Rio Grande do Sul é pujante, nesse período ela poderia se oxigenar, dar uma alavancadinha", falou. Depois, já com as contas em ordem, os Estados voltariam a fazer os pagamentos, e o valor que ficou em aberto seria rolado para o final do contrato.

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Feltes disse que chegou a comentar o assunto com a equipe econômica da presidente Dilma Rousseff, mas de maneira "muito incipiente". Segundo ele, as conversas que de fato já estão em curso com o Ministério da Fazenda tratam da possibilidade de renegociar a dívida extralimite, contraída após a renegociação da dívida dos Estados com a União, em 1998. São contratos com instituições como o BNDES, Banco do Brasil, Banco Mundial e com a própria União. "Temos uma dívida extralimite de R$ 5 bilhões, um porcentual significativo dela com diversos agentes financeiros, com taxas de juros variadas, e que poderiam ser harmonizadas numa boa renegociação, o que nos possibilitaria menor desencaixe durante um tempo", revelou Feltes.

Em paralelo, a equipe de Sartori dá seguimento ao chamado "ajuste fiscal gaúcho". A prioridade é votar até o fim do ano o projeto da LRF, que causa polêmica porque estabelece regras para a limitação do crescimento do custeio para todos os Poderes e do gasto com pessoal - o que terá reflexo nos reajustes salariais concedidos às categorias. Na prática, a lei pretende fazer com que a receita cresça mais que a despesa, além de estabelecer um horizonte para a retomada dos investimentos.

O governo estadual também prometeu lançar em novembro a sexta fase do ajuste fiscal, mesmo sem ainda ter conseguido votar no Legislativo boa parte das medidas encaminhadas até agora. Feltes não dá detalhes das novas propostas, nem esclarece se elas podem incluir mais cortes de gastos, mas sinaliza que todas deverão produzir efeitos somente no médio e longo prazo.

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