Reversor não foi causa de acidente em SP, dizem especialistas

Pilotos da TAM poderiam ter pousado depois do ponto ideal para aterrissagem.

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Por Daniela Fernandes
Atualização:

Especialistas europeus em aviação acreditam que o problema no reverso direito do Airbus A320 da TAM não causou o acidente em São Paulo na última terça-feira. Segundo eles, um avião pode pousar sem problemas mesmo sem nenhum dos reversos funcionando, já que eles não integram o sistema principal de frenagem e representam apenas uma ferramenta suplementar, que não precisa obrigatoriamente ser acionada. Mas sem os reversores, dizem os especialistas, os pilotos têm menos margem de manobra e precisam ser bem mais vigilantes e precisos no momento da aterrissagem. "Quando os reversores não funcionam, os pilotos têm de ficar muito mais atentos em relação ao ponto onde o avião deve tocar a pista. Há uma distância mínima que deve ser respeitada no pouso para permitir a frenagem", disse à BBC Brasil Pierre Condom, consultor e ex-diretor da revista Air & Cosmos. "É totalmente possível pousar um avião sem utilizar nenhum dos reversores, afirma o ex-piloto Lionel Drozd, consultor em aeronáutica, diretor da Air Consult Europe. Segundo ele, o piloto precisa respeitar o ponto de impacto na aterrissagem e não pousar muito depois desse ponto, além de utilizar a velocidade adequada no momento do pouso. "Às vezes os pilotos querem pousar o avião a qualquer preço e insistem em vez de tentar uma nova manobra", diz Drozd, que garante já ter voado inúmeras vezes com aviões que estavam com o reversor em pane. "Um reversor em pane é uma situação banal. Certamente as investigações não vão se concentrar nesse ponto. Elas devem analisar mais a questão da falta de ranhuras na pista", afirma Pierre Sparaco, editor da revista Aviation Week. Ele confirma os comentários da TAM de que os reversores podem ser consertados no prazo máximo de dez dias, o que é chamado no jargão dos profissionais do setor de "tolerância técnica". Segundo um especialista da Associação Européia de Cockpit, o reverso é um dos equipamentos da aeronave incluído na chamada Lista de Equipamento Mínimo (MEL, em inglês) internacional, uma relação dos equipamentos que podem ficar inoperantes em um determinado tipo de avião sem comprometer a segurança. "Como o reverso faz parte dessa lista, só uma falha nele não seria suficiente para causar um acidente. Resta saber se no caso do Airbus essa autorização para o reverso está submetida a alguma condição", explica a fonte. Para John Sampson, diretor de engenharia e operações técnicas da Associação Internacional de Segurança Aérea, o vídeo que mostra a aterrisagem do Airbus da TAM deixa "evidente" que o acidente "teve pouco a ver com o problema no reverso". "Os pilotos provavelmente estavam informados sobre o incidente (na aterrisagem de outro avião) no dia anterior e de que a pista não tinha ranhuras (para o escoamento da água). Se eles tocaram solo em um ponto muito avançado da pista sabendo que não tinham dois reversos operantes, o mais provável é que aplicasse potência e tentassem arremeter", explica Sampson. "Infelizmente, em uma aeronave automatizada o freio automático e os spoilers aplicam peso sobre as rodas automaticamente depois que ela toca o chão. Por isso os pilotos devem ter perdido muita velocidade para poder arremeter com a distância que ainda tinham disponível. Para uma pista tão curta e escorregadia, eles tardaram muito em decidir arremeter", opina. Todos os especialistas consultados pela BBC concordam em dizer que um acidente aéreo nunca é motivado por apenas um fator. Existe sempre, afirmam, uma confluência de elementos que acabam causando o desastre. Apesar de afirmarem que ainda é cedo para tirar conclusões do acidente em Congonhas, eles levantam algumas hipóteses em relação ao caso do A320 da TAM. Para o ex-piloto Drodz, que diz já ter pousado na pista de Congonhas há alguns anos, além de condições meteorológicas desfavoráveis e de problemas de água na pista, os pilotos da TAM podem ter pousado alguns metros depois do ponto ideal para a aterrissagem. "Além de ter pousado depois do ponto que permitiria a frenagem, os pilotos podem ter utilizado uma velocidade elevada no momento da aterrissagem", diz ele, ressaltando que os pilotos da TAM "são competentes e utilizam aviões modernos". "Os pilotos são extremamente prudentes. Se eles decidiram pousar o avião é porque eles não tinham dúvidas de que seria possível aterrissar. Mas talvez tivesse sido melhor que eles tivessem tido dúvidas", diz o consultor Pierre Condom. Para ele existem duas hipóteses: "ou havia problemas com a pista ou os pilotos superestimaram sua capacidade de pousar o avião nas condições do momento". O ex-piloto Drozd diz que o A320 da Airbus, apesar de existir há quase 20 anos, "é dos aviões mais modernos e seguros do mundo", tendo sido construído em função de requisitos elevados de segurança. A última vez que Drozd pousou em Congonhas foi há cerca de 15 anos e diz que já na época a pista era conhecida no jargão dos pilotos como "mal pavimentada". Colaborou Márcia Bizzotto, de Bruxelas BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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