Renan Calheiros: ‘Se intervier na CPI, o próprio governo vai ajudar a politizar a comissão’

Senador é cotado para ser relator da CPI da Covid na Casa e diz que presidente Bolsonaro 'piora as coisas'

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Por Marcelo de Moraes
Atualização:

BRASÍLIA - Cotado para ser o relator da CPI da Covid, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) avalia que o próprio governo ajudará a politizar os trabalhos da comissão se continuar agindo para barrar suas investigações. O presidente Jair Bolsonaro criticou a abertura da comissão dizendo que ela seria feita apenas contra ele e visando desgastá-lo para as eleições de 2022. Em entrevista ao Estadão, Renan disse que, “se o governo intervier na CPI, o tiro vai sair pela culatra”.

O senador Renan Calheiros Foto: Dida Sampaio/Estadão

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“Ele próprio acaba ajudando a politizar a investigação. Piora as coisas”, afirmou o emedebista. “Acho que esse governo precisa encontrar uma maneira de conviver com essa investigação. Porque esse é um procedimento constitucional. Não há como não fazê-lo. A sociedade cobra isso de todos nós. E a CPI é um instrumento sagrado da minoria”, acrescentou.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Por onde o senhor acha que deve começar o caminho da investigação da CPI?

Essa será uma CPI muito importante. Terá uma composição qualificada. E o seu trabalho será facilitado porque muita coisa que ela investigará é pública. As pessoas abordam a gente na rua e perguntam assim: 'Você acha que, se o presidente tivesse acertado a mão, quantas mortes o País poderia ter evitado?' A gente não faz ideia. A CPI responderá essas coisas inevitavelmente.

Ao longo dos tempos, as CPIs, na maioria das vezes, investigam casos de desvios de recursos públicos. Essa vai lidar com problemas que podem ter provocado milhares de mortes. Isso pode dar um caráter mais emocional para os trabalhos da comissão?

Eu acho que, do ponto de vista da opinião pública, sim. Do ponto de vista da investigação, não. A investigação necessariamente terá de ser técnica e criteriosa para que nós não incorramos em erros.

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O governo trabalhou politicamente para evitar a instalação da CPI. O senhor acha que, agora, o governo vai agir para impedir o avanço das investigações dentro da comissão? Vai ser uma espécie de beque?

Não tenho nenhuma dúvida. Porque em todos os momentos esse assunto foi mal conduzido pelo governo. E isso, inclusive, cobrou um preço altíssimo do próprio presidente do Senado Federal. Acho que o governo continuará errando, mas ele tem características, a essa altura, bastante conhecidas.

O governo pode tentar barrar convocações de alguns de seus integrantes e ex-integrantes, como o ex-ministro Eduardo Pazuello, por exemplo?

Acho que não. Porque a CPI vai ter que, em primeiro lugar, estabelecerum plano de investigação coletivo. Não é de ninguém. E ela própria definirá os seus limites.

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O Planalto deseja que a investigação da CPI também chegue a Estados e municípios, e isso foi apensado ao fato determinado da comissão. Como isso vai ser feito?

Há unanimidade na CPI com relação à necessidade, quando houver crime conexo, de investigar Estados e municípios. Mas apenas nessa condição. Você não pode fazer uma Comissão Parlamentar de Inquisição contra governadores ou prefeitos ou contra o presidente da República. Tem de fazer a investigação.

Uma das críticas que os governistas fazem à possível indicação do seu nome para a relatoria da CPI é que o senhor é pai do governador de Alagoas, Renan Filho...

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A CPI só se torna necessária, como esta que vai se instalar, quando os fatos não estão sendo devidamente investigados nos órgãos competentes. E nós vamos ver essas circunstâncias também Estado por Estado.

O senhor disse ao 'Estadão', na semana passada, que, se o governo tentar interferir na CPI, dará com os burros n'água. Com todo o poder que o presidente tem na sua caneta, não há como o governo tentar ter algum tipo de controle da CPI?

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Se o governo intervir na CPI, o tiro vai sair pela culatra. Ele próprio acaba ajudando a politizar a investigação. Piora as coisas. Com isso, todos os governos perdem. E acho que esse governo precisa encontrar uma maneira de conviver com essa investigação. Porque esse é um procedimento constitucional. Não há como não fazê-lo. A sociedade cobra isso de todos nós. E a CPI é um instrumento sagrado da minoria. Eu adverti o presidente do Senado várias vezes que ela seria instalada. Porque só três pré-requisitos são analisados: se tem fato determinado, se tem número mínimo de assinaturas e se tem prazo para investigação. Cumpriu tudo.

O presidente Bolsonaro disse que a CPI era inadequada porque poderia ser feita apenas contra ele e se transformar num palco eleitoral para 2022. Ele tem razão nessa queixa?

Ele mesmo pode colaborar para que isso aconteça. Na medida em que queira ameaçar, dificultar os trabalhos, evitar que alguém seja convocado. Isso tudo pode agilizar essa politização que eles tanto temem. Acho que já erraram bastante na instalação. Porque deveríamos ter essa comissão instalada em fevereiro. Estamos na metade de abril. E até agora não a instalamos. Tudo isso significa dizer que a investigação vai sendo levada para a proximidade da eleição. Se isso ajuda a politizar, eu não sei. Só sei que na medida em que o governo quer interferir na investigação, ajudará, com certeza, a politizar sim.

Por onde a CPI deve começar?

Precisamos, agora, instalar a comissão, eleger o presidente, que vai, de acordo com a correlação de forças, designar o relator. Não há disputa entre nós. Estou muito satisfeito por integrar a comissão. Não preciso ter um cargo a mais. E acho que a CPI precisa ser necessariamente técnica. Por onde começar, precisará ter um rigor técnico muito grande para não derivar, por iniciativa da própria CPI, para essa politização.

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E o senhor está convencido de que a CPI tem fundamentos para ter sido criada?

Ela tem fatos determinados a investigar e muitos deles são públicos. Confessados. O que, disse e repito, facilitará a investigação.

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