Deputado e senador divergem sobre autoria de dispositivo que oficializa doação oculta

Nem Rodrigo Maia nem Romero Jucá, relatores da reforma política na Câmara e Senado, assume responsabilidade pelo ítem que acaba com transparência no financiamento privado de campanhas

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Por Pedro Venceslau e Daniel Bramatti
Atualização:

Atualizado às 11h21

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São Paulo - A "paternidade" do dispositivo que oficializou as doações ocultas de campanhas gerou polêmica entre os relatores da reforma política na Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). Nenhum dos dois assume responsabilidade pela nova regra, que acaba com a transparência no financiamento privado de campanhas. Maia diz que o Senado tenta "terceirizar" um ônus que é de todos, enquanto Jucá vê "mais problemas" se a presidente Dilma Rousseff vetar o dispositivo aprovado pelo Congresso. 

O projeto aprovado pela Câmara na semana passada institui uma triangulação que impedirá o mapeamento das conexões entre empresas financiadoras e candidatos financiados.

Funcionará assim: uma empresa interessada em eleger o candidato X estará impedida de doar dinheiro diretamente a ele. Em vez disso, terá de fazer a contribuição ao partido do candidato. O partido, por sua vez, fará o repasse dos recursos ao candidato, sem indicar de onde veio o dinheiro. Ao prestar contas à Justiça Eleitoral, o candidato dirá apenas que recebeu recursos de seu partido, também sem indicar o doador originário.

Essa não é uma prática nova. Até as eleições de 2014, empresas se valiam de uma brecha na legislação para ocultar suas doações. No ano passado, o Tribunal Superior Eleitoral vetou o “jeitinho”, ao exigir a identificação dos doadores originários de recursos que transitaram por partidos antes de chegar aos candidatos.

A novidade é que agora a doação oculta não será mais opcional, mas obrigatória–segundo a legislação aprovada pelo Congresso, uma empresa não poderá mais doar diretamente aos candidatos, mesmo se quiser, e suas contribuições aos partidos chegarão ao destino final sem identificação da origem dos recursos.

Na edição de segunda-feira, 14, o Estado informou, de forma equivocada, que o dispositivo que instituiu as doações ocultas foi inserido na reforma política durante sua tramitação na Câmara. Na verdade, ele já constava do texto aprovado anteriormente pelo Senado–mas com uma diferença importante: valia apenas para as doações de pessoas físicas, já que os senadores também proibiram o financiamento privado de campanhas. Ao derrubar essa proibição, posteriormente, a Câmara acabou fazendo com que as doações ocultas passassem a valer para as empresas.

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“A regra que eu tinha feito era para pessoa física”, disse Romero Jucá, nesta segunda-feira. “Não faz sentido uma pessoa física doar para um partido e depois o nome dela acompanhar uma doação que vai para um candidato que ela não conhece. Vemos supor: você doa para o PMDB nacional, que doa para o estadual. Aí o partido local doa para o sargento Sebastião do Morro do Alemão. Você não conhece ele. Por que seu nome vai estar ligado ao do sargento? Amanhã o nome dele aparece metido em milícia e o de quem doou para o partido nacional aparece envolvido junto.”

Para Rodrigo Maia, “o Senado precisa assumir suas responsabilidades”. “O nosso texto, da Câmara, trata assim: só o partido político poderá receber doação de pessoa jurídica. O partido tem 72 horas para apresentar as empresas que doaram.  E o Senado introduziu: ‘e não há necessidade de dizer quem doou ao partido quando essa doação chegar ao candidato’.”

A confusão, segundo o deputado Bruno Araújo (PSDB-SP), se deve a um “desencontro”. “O processo legislativo foi muito tumultuado e isso contribuiu para um desencontro entre Câmara e Senado”, afirmou.

O projeto da reforma política foi encaminhado à presidente Dilma Rousseff para sanção ou veto. A institucionalização das doações ocultas só não valerá para as próximas eleições se houver veto presidencial desse dispositivo.

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