Receita vai cobrar R$ 10 bi por sonegação na Lava Jato

Órgão estima montante não recolhido em tributos da União e fraudes fiscais, a maior parte entre 2010 e 2014, por 28 empreiteiras; auditores trabalham em 480 ações

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Por CURITIBAFábio Serapião e BRASÍLIA
Atualização:

A Receita Federal vai cobrar mais de R$ 10 bilhões dos investigados na Operação Lava Jato – força-tarefa do Ministério Público Federal, Polícia Federal e da própria Receita que apura esquema de cartel e corrupção na Petrobrás. A investida dos agentes federais de Curitiba levou o órgão do Ministério da Fazenda a estimar o montante sonegado em tributos da União e fraudes fiscais. A maior parte desse valor refere-se a impostos não recolhidos, entre 2010 e 2014, por 28 empreiteiras acusadas de corrupção, acrescidos de juros e multas.

  Foto: ESTADAO CONTEUDO

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“Tínhamos a previsão de que os lançamentos tributários atingiriam R$ 1 bilhão, mas, em apenas um ano de apuração, esse valor já foi superado. Possivelmente superaremos um crédito tributário (impostos, juros e multas) total constituído de mais de R$ 10 bilhões”, afirmou ao Estado o coordenador-geral do Setor de Investigação da Receita, Gerson D’Agord Schaan.

O foco são os tributos sonegados em movimentações de propinas, lançadas oficialmente como despesas de assessorias ou consultorias – muitas delas empresas de fachada, como as do doleiro Alberto Youssef (MO Consultoria, GFD Investimentos e Rigidez Empreiteira).

Desde que foi deflagrada, em março de 2014, a Lava Jato relacionou pelo menos 34 empresas suspeitas de serem de fachada ou “noteiras” – criadas somente para emitir notas – que movimentaram, no mínimo, R$ 2,5 bilhões, em sua maioria provenientes de empreiteiras com contratos com a Petrobrás.

Executivos, políticos, agentes públicos e operadores financeiros são alvo dessas ações fiscais da Receita desde 2015.

O rombo foi rastreado pela Receita em investigação conjunta com policiais federais e procuradores por meio da identificação de serviços fictícios, uso de notas frias, contas secretas no exterior e bens em nome de terceiros ou empresas offshores.

O trabalho é resultado das descobertas de fraudes financeiras na Petrobrás – um prejuízo para a estatal estimado, entre 2004 e 2014, em R$ 42 bilhões, de acordo com a PF.

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“O tipo mais recorrente que gerou os maiores valores de autuação até aqui foi o pagamento de contratos de serviços fictícios, despesa indedutível e pagamento sem causa”, afirmou o chefe do Escritório de Investigação da Receita, em Curitiba, Roberto Leonel de Oliveira Lima.

“As empresas contabilizavam pagamentos por serviços jamais executados, sob diversas denominações, como assessoria, consultoria, engenharia, para dissimular efetivos pagamentos de vantagens indevidas ou propinas”, disse Lima. Nesses casos, as empreiteiras são cobradas em 35% de Imposto de Renda retido na fonte sobre o valor pago sem causa e mais 150% de multa por fraude e também juros.

A cooperação entre Receita, MPF e PF sustenta os trabalhos de investigação da força-tarefa. “A Operação Lava Jato é um marco histórico pela forma integrada na qual desenvolvemos a investigação, cada qual na sua área”, afirmou Schaan. Só da Receita são 75 auditores fiscais destacados para a Equipe Especial de Fiscalização da Lava Jato.

Ações fiscais. Os auditores trabalham atualmente em 480 ações fiscais. Foram eles que identificaram, por exemplo, os pagamentos milionários de empreiteiras à JD Assessoria e Consultoria, empresa do ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu. De acordo com os investigadores da Lava Jato, os negócios ocultaram repasses de propinas. Dirceu teria recebido parte da cota do PT no esquema, comandado também por PMDB e PP.

Até o início deste ano, cerca de R$ 1,5 bilhão em créditos tributários, referentes apenas ao ano de 2010, já haviam sido lançados pela Receita. Desse montante, 90% é cobrado de empreiteiras como a Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, OAS e Odebrecht.

“Temos pela frente, praticamente, mais quatro anos de grande trabalho”, afirmou Schaan, enquanto a força-tarefa caminha para a conclusão das ações na esfera criminal.

PARA LEMBRAR

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Início. A Lava Jato, que acabou de completar dois anos e meio – a PF deflagrou a operação em 17 de março de 2014 –, acumula números superlativos na 1ª instância da Justiça e tem mantido ritmo considerado célere.

Ritmo. Em média, uma sentença leva de 6 meses a dois anos para sair, após a denúncia; nas mãos do juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Operação Lava Jato na 1ª instância, há caso de denúncia oferecida, recebida e julgada em quatro meses.

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Núcleos. Ao longo da investigação, a força-tarefa identificou quatro “núcleos” que atuaram no esquema de corrupção na Petrobrás: o administrativo (ex-dirigentes da estatal); o político; o financeiro (operadores); e o empresarial (empreiteiras).

Propina e prejuízo. Segundo dados apresentados pelo Ministério Público Federal, R$ 6,2 bilhões foram pagos em propinas no esquema investigado pela Lava Jato. Já o prejuízo estimado provocado pelos desvios alcança R$ 42 bilhões, de acordo com a Procuradoria.

No Supremo. Segundo levantamento do Estado, a Corte tem ao menos 38 investigações sobre a Lava Jato em curso que miram em 91 pessoas. Em sete destes inquéritos a Procuradoria-Geral da República já ofereceu denúncia e aguarda decisão. Ao menos oito investigações que surgiram na Lava Jato, mas sem relação com a Petrobrás, tramitam no tribunal.

Fases. Em dois anos e meio, a Lava Jato soma 33 fases. A mais recente, no mês passado, foi chamada de “Resta Um” e teve como alvo a Queiroz Galvão. O nome da operação é uma referência ao avanço das investigações contra a última grande empreiteira do “clube” do cartel que fatiava obras na Petrobrás mediante pagamento de propina a agentes públicos e políticos.

Diretorias e partidos. Com base em depoimentos de delatores, a força-tarefa afirma que as diretorias da Petrobrás eram controladas politicamente por partidos e cada uma tinha um operador de propina.

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Operadores. A Diretoria de Abastecimento da Petrobrás era cota do PP e tinha como operador o doleiro Alberto Youssef; a de Serviços era controlada pelo PT e tinha como “arrecadador” de propina o ex-tesoureiro da legenda João Vaccari Neto; e a área Internacional ficava com o PMDB, com Fernando Baiano como um dos principais operadores.