Questão das algemas é apenas ponta do iceberg, diz Mendes

Para presidente do STF, tema é 'metáfora do debate sobre abusos' que foram cometidos em operações policiais

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Por Carolina Ruhman e da Agência Estado
Atualização:

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, afirmou nesta segunda-feira, 11, que a decisão tomada pela Corte, na semana passada, de proibir a colocação indiscriminada de algemas em presos durante as operações realizadas pela polícia deve ser entendida como uma medida contra a exposição pública de presos e ao abuso de autoridade. "A questão das algemas apenas revela a ponta do iceberg de outras questões ligadas à dignidade da pessoa humana", disse nesta segunda-feira, 11, após participar de evento na Universidade Paulista (Unip). Para Mendes, o tema é uma "metáfora do debate sobre os abusos" que foram cometidos em operações policiais recentes. Veja também: Presidente do STF rebate Tarso e quer fim do debate sobre Lei de Anistia O presidente do STF enfatizou o respeito aos direitos humanos e avaliou que a decisão do STF serve como ensinamento sobre a aplicação dos direitos fundamentais dos indivíduos. "Estamos dizendo não só que não se deve colocar algemas mas que não se deve fazer a exposição desnecessária de qualquer pessoa submetida à autoridade estatal", explicou. Mendes citou a frase dita por ele na semana passada, durante debate no auditório do Grupo Estado, de que "a prisão, em muitos casos, só se justifica para fazer a imagem, e a imagem com algema (para expor na televisão)". Mendes explicou hoje que as imagens gravadas de presos com algemas geram a sensação de que a pessoa - que ainda não foi julgada - já foi condenada. "Se depois se verificar que a pessoa foi presa indevidamente, como em muitos casos já se verificou, não há sequer pedidos de desculpas formais, muito menos a obrigação da rede de televisão de dizer que aquela pessoa foi presa indevidamente", argumentou. Ainda nas críticas ao que classifica de abuso de autoridade, o presidente do STF questionou? "Quem há de reparar esses danos, que são gravíssimos e que, na verdade, são irreparáveis?". Para ele, com a divulgação de imagens com algemas "satisfaz-se a sanha, a curiosidade, os desvios psicológicos que todos eventualmente possam ter num dado momento, sem que se resolvam os problemas". Ele avaliou que essa situação traz ao Judiciário um "ônus gravíssimo", porque depois da condenação obtida pela exposição na TV, vem às vezes a notícia da soltura. E argumentou que, muitas vezes, a sociedade recebe a notícia "como se os tribunais, especialmente as cortes superiores, fossem condescendentes com o crime". Mendes citou o "emblemático" caso do pedreiro Antonio Sérgio da Silva que teve o julgamento de homicídio anulado por ter ficado algemado durante o júri. "Não se tratava, como os senhores vêem, de um financista", ironizou. Para o presidente do STF esta polêmica é "reveladora" de "abusos que se perpetram continuadamente já na prisão preventiva, já na prisão provisória, já na execução criminal". E criticou o "sociologismo pedestre e rastaqüera" de quem vê a questão das algemas como uma polarização de classes. "Quem discute a colocação das algemas não quer a posição de algemas nem em ricos nem em pobres." Na semana passada, ao proibir o uso indiscriminado de algemas, os ministros do STF citaram operações policiais recentes nas quais, segundo eles, ocorreu abuso na colocação de algemas, como a Operação Satiagraha, deflagrada pela Polícia Federal no dia 8 de julho, e que prendeu, dentre outros, sócio-fundador do Banco Opportunity, Daniel Dantas, o ex-prefeito Celso Pita e o investidor Naji Nahas.

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